segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Cotidiano poético - Domingos Barroso

Lar

Esse prato sobre a pia
esquecido após ser lavado

compartilha com seu olhar distante
o frescor da ausência.

Esse simples objeto
quem diria lhe comove as lágrimas.

Apesar de tanto tempo
em diária convivência
só agora percebe
a textura,
os contornos.

Esse prato sobre a pia
há muito lavado e enxuto
é a sua alma contemplativa.

Assim todos os objetos domésticos
resguardados em inanimado mistério:
à espera.



um espinho atravessado

Tudo que for
vício em você
queimarei -

seu cigarro fraco,
sua cocaína bruxa

seu álcool inferno,
sua lata fuligem.

Serei seu inimigo
número um

sempre que abrir um olho
e, descuidado, fechar o outro.

Não me peça clemência
trégua, só um tempinho -

não terei dó da sua carcaça,
dos seus caprichos

das suas manhas,
dos seus erros.

Tudo que for
vício em você
lançarei ao fogo -

seu egoísmo automático,
sua vaidade inveterada

sua arte em matar o próximo
e a si mesmo.

Não me jure abstinência,
pureza de alma -

eu não acredito
e lhe digo:

ao buraco levarei
todos os seus vícios.

A sobra sobre a mesa
cabe-lhe:

banquete
ou migalhas.

É o seu fim.

Domingos Barroso

2 comentários:

  1. Existe um móvel no quarto
    que guarda a ausência das tuas roupas
    Existe um móvel no quarto
    que guarda a ausência do teu corpo.

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  2. Por favor,
    toque fogo ,
    no vício do amor.
    Inflame !

    Nas cinzas da exaustão,
    a gente se encontra !

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