terça-feira, 17 de agosto de 2010

Vida itinerante de uma bancária (XII) - Socorro Moreira


Agosto de 1986

E foi como Jair imaginou...

Fortaleza para Campo Grande  com escala em Sampa.
Do aeroporto deixamos a imensa bagagem na rodoviária , tomamos um taxi, e procuramos a AABB da cidade para fazer uma refeição. O ónibus para Bela Vista  partiria  as 14 h. O primeiro trecho da viagem foi tranquilo. Bom asfalto. Depois de Jardim pegamos por mais de 2 horas estrada de barro.Os meninos, sempre ativos, emudeceram. E eu fui pensando no que a vida me reservaria,  desta feita.Agarrada com os céus, pedindo um tempo feliz !

Eu tinha mesmo coragem de mamar em onça...! Pagaria sempre um preço elevado  pela minha ousadia de brincar com o novo. Na verdade eu estava realizando atos sucessivos de desprendimentos.  A face dolorosa do processo é inevitável !
Chegamos  de noitinha,  naquele lugar distante.Procuramos um hotel para pernoitar. Diária para 4 pessoas. Todos ,no mesmo espaço. Quando o dia amanheceu fui conferir  a cidade. Tudo me parecia muito distante. Era diferente das cidadezinhas do Nordeste, que tudo gira, em torno da praça e da Igreja.Descobri logo, que teria dificuldade em arranjar casa para alugar. Informaram-me que , no Quartel General ( comum nas cidades fronteiriças) eu poderia conseguir  uma casa , por um tempo transitório. O Coronel nos cedeu uma casa para militar que estaria desocupada por um breve espaço de tempo.O caminhão da mudança chegou,  e os  meninos  me surpreenderam arrumando tudo, enquanto  vivia o  meu primeiro dia de trabalho.
Enquanto não conseguíamos ajuda doméstica, as tarefas  foram divididos. Eu cozinhava, Victor fazia as compras, Caio arrumava a casa e André lavava a roupa . Havia uma  tácita cumplicidade. Só podíamos contar conosco !

Fui alocada   como Supervisora, na Tesouraria. Um trabalho isolado  do contexto.Depois que  arrumava o dinheiro , expurgava os dilacerados, ficava rabiscando  versos.
A maioria dos funcionários  tinham vindo de outras localidades. Era uma Agência que funcionava com adidos. 
Da terra, Elsa  e Getúlio eram os mais próximos. Getúlio tinha um bar, na beira do Apa, que reunia a moçada para um peixe frito, cerveja gelada , e som de Pink Floyd. Nunca gostei de cerveja. Acho que sempre  temi a barriguinha  dos amantes dessa bebida. Foi ótimo porque  nunca aprendi a beber. Quando tinha de tomar algum drink  já tomava uma dose de wisque,...duas, três, no máximo ! Depois, sem nenhuma compulsão , voltava para o refrigerante gelado.
Impressionante como  o povo de Bela Vista  curte o churrasco. Nunca comi tanta carne vermelha, na vida . Isso custou-me depois, uma crise de diverticulite. Suavizávamos o hábito, tomando tererê,o chimarrão gelado dos  gaúchos),

Os meninos se adaptaram fácil. Victor  praticava volei e futebol; André se especializou em dançar polca, vaneirão, e em cantar guarânias ; Caio entrou na turma dos embalos. 
Compramos um Fusquinha a álcool, nos primeiros dias. O frio era tanto, que ele  nunca pegava, na hora de ir para o Banco. Da minha casa até lá era um bom pedaço, tipo, um ou dois quilómetros. Devolvi a compra. Procuramos um outro transporte, e ficamos com uma Belinda Comodoro.Meu pai bem falou:
"carro pra você é fusca ! Pode estacionar  fácil. Esse carro é muito grande. E era ! Caio logo assumiu o comando . Estava com 16 anos.
Recebi visitas , no decorrer da minha estadia em Bela Vista : Maria de Jesus, minha mãe,, tia,  minhas irmãs(Verónica e Teresa), e amigos do sul. Meu pai viajou naqueles tempos. E foi a grande perda da minha vida..Não assisti seus últimos dias.
Atravessando a ponte da amizade estávamos no Paraguai. Gostava de vasculhar bobagens, nas lojas dos importados. À   visitávamos o Cassino. Arriscávamos  uns trocados, no pano verde ,pra pagar o jantar... E era só !
Em frente ao Banco tinha uma padaria que me nutria de chipa e sopa paraguaia. Deliciosas iguarias !
Às vezes atrevia-me a tomar banho no Apa, a dançar, nas noites de sábado. Senti falta do meu ex marido ( o mineiro), que de fato era um pé de valsa ! Ele até me visitou, montamos uma Confeitaria, mas  com menos de um ano e a relação finda, fechamos o comércio. Era  linda ! bem decorada, e por ela, aprendi a fazer doces e salgados.
Quando transcorreram dois longos anos, senti que tinha que pegar estrada. Concorri  a cargo de alta administração, e fui chamada para cursos especializados em Brasília. 45 dias, sendo testada !
Numa turma de 23 rapazes, éramos duas mulheres. A resposta final foi a minha nomeação para Gerente Adjunta de Barra do Mendes, na Bahia.
Nova mudança, por conta do Banco.Despedi-me  de Bela Vista, querendo ficar...Despedi-me de Bela Vista, querendo chegar.
Mas a vida me reservava novas aventuras. O novo,  sempre me aguardando com  suas aprendizagens : céu e inferno; mel e fel!
Bahia, fica para o próximo capítulo.

5 comentários:

  1. Que delícia, Socorro, essas memórias! perdi alguns capítulos, pois estive viajando, mas vou me atualizar em breve.
    abraço grande, espero o capítulo da Bahia!

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  2. Socorro,

    Continuo acompanhando sua odisséia.
    menina eu não sabia dessa sua coragem de mamar em LEOA.
    Estou esperando a Bahia de todos os santos.E haja santo!!!!!

    Abraços:Liduina.

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  3. Ana e Liduína , Duas leitoras psicólogas ! (risos).
    Vivi muitas vidas, nesta vida. E ainda sobrou retalhos para fazer uma colcha nova.
    Não deixa de ser uma carse , falar das nossas experiências.
    Quando eu tinha 11 anos, meu professor de português, Dr. Zé Newton, estimulou a classe para escrever um livro. O título seria : "Minha vida escolar".
    Pulei essa etapa. Mas , quem sabe antes da caduquice, encontre um tempinho para usar estes últimos textos, como roteiro de uma biografia?
    Antes disso, ainda quero vida !
    Vida sem lembrar, centrado num presente criativo.

    Obrigada pela paciência das duas. E, podem cobrar consulta !

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  4. Você como sempre uma "Mulher Guerreira!" Sempre pronta e disposta a enfrentar o novo, e de novo, sempre que possível for...
    Bjus!

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  5. Mara querida,
    que bom encontrá-la por aqui...
    Receba meu abraço apertado !

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