Folhas secas
- Claude Bloc -
Já era fim de tarde. Um sol
laranja vigiava, no meu jardim, a areia e as pedras por onde eu andava descalça.
Minha cabeça procurava em vão, entre as lembranças, os caminhos para onde os
sonhos corriam, mas nunca os encontrava. Eles sempre estavam adiante. E eu
pensava: Um dia os alcanço!
De minha concha, observava o mundo pela janela
e, aos poucos ia crescendo a vontade e a coragem de enfrentar o tempo. Saí
devagar me esgueirando por entre a folhagem, escondida de outros olhares,
rodopiando pela tarde ainda quente, sumindo pelos telhados. Pulando por sobre
os muros.
A tarde me vê. Sinto que nem
suspira pra me observar nessa rotina terrestre. Só ela me vê, mas fica muda. A
rua se espicha entre casas e passa olhando o meu jardim onde a cidreira enrama.
É nesse verde que cumpro minha pena diária, minha rotina.
Uma mulher varre
as folhas secas... Bato as asas bem de leve. Ela nem me vê. Apenas espia a
vida, como se o mundo fosse vazio. Nesse exato momento sinto o vento. Ele traz
forte o cheiro maciço do manjericão e da malva. Embriago-me e deleito-me com os
odores das plantas molhadas, para esquecer as criaturas duras desse mundo.
Solto-me no ar, sigo o hálito da terra, o perfume das rosas.
De repente volto a
reparar naquela mulher no meu jardim. Creio que sente cansaço e tenta
guardar-me consigo, por entre seus pensamentos. Arrisco-me nos ares com a
intenção de aproveitar as alturas enquanto meus rastros são tranquilamente
apagados das flores cheiradas por mim. Aqui e ali, meus dedos tocam as poças d’água.
O tempo dá um nó. A tarde vai findando. No jardim volto a pousar e a varrer
as folhas secas. O sonho está despertando.
Boa noite!
Claude Bloc