Ele estava bem alí, estacionado.
Chave na ignição como que me esperando. O jeep 51 do papai. Limpo, reluzente depois da pintura de Moreirinha, que fazia qualquer carro velho ficar novo.
Era verde oliva com capota preta de vinil. Os bancos novinhos, a direção grande e a alavanca das machas com a cabeça em acrílico colorido, comprada no Juazeiro. No retrovisor central o terço com Jesus dependurado para livrar-nos do perigo. Os pneus eram zero, com os biscoitos bem definidos no polimento a óleo. Os três pedais, embreagem, freio e acelerador, eu já tinha teinado bastante o movimento. Agora era só colocar uma almofada nas costas para compensar a distância entre o banco e eles, e sair para a prática.
Vesti um jeans, cabelo preso num rabo de cavalo, pés descalços e me lancei na aventura. Seria só uma volta até o Pimenta. Olhei para os lados da rua e a vi vazia ao meio dia. Seria rápido e ninguem iria perceber a saída do Jeep da porta da casa. Dei partida na chave e pegou de primeira, acelerei três vezes e fui soltando o pé da embreagem aos solavancos com três pulos inesperados. Tinha logo que passar a segunda marcha para manter minhas duas mãos na direção. Consegui ! Agora era só acelerar e seguir o prumo da rua vazia. Alcancei a Duque de Caxias e dobrei na Praça da Sé. Passei pelo Alagoano e senti alguns olhares na minha direção, mas não desviei à atenção do calçamento. No caminho fui desviando bicicletas, pedestres e deixando para trás alguns carros estacionados. Não existia sinal na cidade para alguma parada brusca. E tome pé no acelerador ! Sentada ao volante, dominava o Jeep fazendo-o ir para onde eu quisesse. Era o máximo ! Eu estava dirigindo pela primeira vez. Ouvia o chiado dos pneus correndo rápido na virada da curva da praça do Pimenta e logo logo depois senti um frio na barriga quando avistei o Aero Willis de Cândido Figueirêdo. Enfiei a mão na buzina mas graças a Deus o carrão dobrou no Parque Municipal a tempo. Uffa ! Foi por pouco ! Precisava chegar logo em casa , antes que notassem a falta do Jeep. Contornei a Praça da Sé, entrei na Duque de Caxias e depois entrei na Rua da Vala. Estava indo rápido demais e não conseguia diminuir a marcha. A minha frente estava o perigo da vala aberta, já tinham caído muitas pessoas por lá e do outro lado os muros das casas. Numa virada só quis colocar o carro dentro da garagem, mas esqueci que o portão de ferro estava fechado. Senti os cabelos balançar prá lá e prá cá no sacudir do meu corpo franzino e levei o portão nos peito, ou melhor, no parachoque. E o Jeep só parou porque soltei o pé da embreagem e estancou...
Com o estrondo, todos sairam para ver o que havia acontecido. Eu me encontraram ao volante, o muro quebrado, o portão por baixo dos pneus, e um sorriso amarelo estampado no rosto.
_ Cheguei !
9 comentários:
Eita, que história !
E se eu te disser que estou reaprendendo a dirigir?
Mas não quero correr riscos...
Edilma, quando vc chega? Estamos ( eu e o Crato) com muitas saudades !
Aquele projeto "Casa Recreio" vai precisar de você, viu?
Um grande abraço, minha amiga querida !
Edilma,
belíssimo texto.
Palavras vivas.
Imagens soltas.
Envolto em tua escrita transparece um espírito atento:
pleno de memória e encanto.
Carinhoso abraço.
Edilma,
Tão bom te ler... Sabe, eu acho que te vi dobrando a esquina. (risos).
Abração,
Claude
Esta história no meio é domínio e controle. No início e fim trangressão das regras. Ou seja, do ponto de vista do narrador é tudo domínio e controle. Até para derrubar um muro com aquele objeto de desejo dos tempos de então. Embora um relato aparente de acidente, é um incidente no sentido de acréscimo à narrativa princiapl: aprendendo a dirigir.
Querida Socorro,
Cuidado, sua garagem está sempre fechada... kkkkk
Acho que só irei no lançamento do livro, mas quem sabe...
Tenho que conhecer mais detalhes desse projeto - Casa Recreio.
Estou interessada.
Beijo !
Domingos Barroso,
Agradeço aos elogios.
Passei um tempo fora do ar mas quero ler seus versos outra vez.
Publica logo esse livro para superar a ausência da internet.
Grande abraço !
Claude,
Pensei em passar na sua porta mas não sabia dar a marcha ré ...kkk
Se viu uma louca na direção do Jeep de Satisfeito, era eu com certeza.
Bons tempos ! Que saudades !
Beijo !
Do Vale,
Quanta honra em ter a interpretação do meu pequeno texto por você.
Na história, o lugar, os personagens e batida no portão, são reais.
Eu era mesmo audaciosa.
Um abraço !
Parabés, Edilma, contar história de forma escrita não é para qualquer um. Eu quase ouvi o barulho do choque no portão.
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