Sonho botânico
Há quem se sonhe árvore
à sombra da qual
o animal repouse.
A avó que conheci
plantava bogaris
e cultivava mamonas.
Uma vez a surpreendi
brincando de voar com os passarinhos.
Assim a vejo e a tenho.
Meu avô plantava tabaco.
Era a sua planta de poder.
Raras vezes cantava,
e, ao fazê-lo,
tal uirapuru,
calava as outras aves,
a escutá-lo.
Meu pai sabe a angico,
ao bom angico,
com sua densa e saborosa resina.
Minha mãe, perfumada caroba,
me rimava com cravo e alecrim.
Só Jesus é tão cravo.
Só José alecrim.
Pela carne da macaúba,
pela polpa do pequi,
pela massa do jatobá
desasnei
e sobrevivi.
Há quem viva à sombra
das carnaúbas,
da samaúma,
do juazeiro,
da figueira
ou do salgueiro.
Mas, como diz um mestre
das plantas medicinais,
toda planta é sagrada,
mesmo os matinhos mais simples.
Folheando um manual de botânica,
encantei-me com o ramo
rico e polimorfo das solanáceas:
ervas,
arbustos,
árvores,
trepadeiras,
tão brasileiras.
O tomateiro,
o pimentão,
várias pimentas,
a beladona
e as ornamentais.
A vida ornou-me
e o sonho valeu-me.
(Assis Lima )
3 comentários:
Sou botânica, e disso esqueci-me completamente, até ler esse poema.
Os aromas dos quintais, sítios e afetos , venceram-me.
Tô contagiada de doces lembranças, e querendo aspirar o mundo overdosamente.
meu avô tinha cheiro de umburana
Minha vó de capim-santo
Miunha mãe de juá
e margaridas...
Como posso esquecer meu pai
com aquele cheiro de tintas?
Ele desenhava a flora e a fauna
E eu brincava com seus cavalos
enquanto os cawboys dormiam.
Obrigada Assis, por acordar minha alma natureza , carente de desvendar mistérios, no verde poético.
Abraço carinhoso
Pachelly, esse poema de Assis é a tua melodia !
Assis,
Adorei seu poema.
Lembrou minha infância e minhas idas ao Pai Mané.
Meus pais, como os seus, também eram botânicos naturais; sem faculdade.
Possuiam uma verdadeira farmacia natureba em casa.Que no popular eles chamavam "mesinhas", lembra?
Abraço grande: Liduina.
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