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"Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
"

(Carlos Drummond de Andrade)

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Colaboração:Claude Bloc


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quinta-feira, 2 de junho de 2011

Um tempo de plantar e um tempo de colher - José do Vale Pinheiro Feitosa

Não encontro realidade nas marcações do tempo. Pelo menos como metáfora de um tempo de plantar e um tempo de colher. Como regra de agricultura pode ser, não para a vida moderna que é atabalhoada. Misturam-se as metáforas, os sentidos, os desejos, as vontades e tantos outros sentimentos, pois vivemos a era dos sentimentos.

A realidade é que já nem existe a sequência do primeiro plantar e o depois colher. Na verdade tudo se resumiu a colher. Seja como expropriação ou como privilégio, seja como suores do trabalho que nunca chega para a suficiência de vida de uma colheita. A verdade é que não se sabe bem onde fica a plantação, no tempo e no espaço.

Em Crato com uma fatia de presunto de Santa Catarina, tirando de uma bolsa fabricada na China notas do Banco Central, impressas na Casa da Moeda, para pagar um lanche cujo trigo do pão veio da Argentina. Sem contar que o caixa enquanto fazia o troco com um fone de ouvido, balbuciava algo num inglês sofrível, tão distante dos falares de sua nascente cidade de Aiuaba.

Foi esta visão do fim das marcações do tempo que tanto horror causou aos americanos tão logo descobriram o risco em que se encontravam. Aliás, um parêntese, mas no tom: os EUA nos anos 60 enviavam para a América Latina, por um programa chamando Aliança para o Progresso, toneladas de comidas e roupas que já não usavam mais. O nordeste se encheu de tudo e muita gente da emergente classe média e das fazendas mais aquinhoadas comeu muito chedar com estranhamento de outro sabor e uma espécie de trigo que usavam para sopas.

Mas retornando ao horror americano. Eles perceberam que o mundo imediato já não dependia da autonomia de ninguém. Não se plantava e nem se colhia nada. Todos estavam como ligados a um fluxo de distribuição que funcionava com a fragilidade de uma irrigação sanguínea. Bastava cortar a artéria principal que tudo iria à falência dos organismos.

Na minha opinião, não bem explorada cientificamente, mas por suposição, isso explica a abundância de filmes de catástrofe dos anos 70 e 80. Qual era o mote central: era a interrupção da cadeia de distribuição de recursos essenciais à vida. Daí eles estimavam um retorno da civilização ao reino predador dos animais, um padrão repetitivo da herança puritana das colônias: com o crescimento do mal no espírito humano.

Enfim, a ausência do tempo de plantar e um tempo de colher se recolheu ao imaginário poético e a uma literatura de auto-ajuda que prima pelo vazio de sentido e por uma abundância de endorfinas.

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