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"Penetra surdamente no reino das palavras.
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Estão paralisados, mas não há desespero,
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"

(Carlos Drummond de Andrade)

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Colaboração:Claude Bloc


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domingo, 10 de outubro de 2010

Zéca Preto e Chico de Zébra - Por: Dihelson Mendonça




Zeca Preto era um desses clássicos caboclos nordestinos. 1:90m de puro sangue e músculos. A natureza havia lhe conferido uma força privilegiada, o que era reforçado ainda mais, pelo seu trabalho de servente de pedreiro, quando passava o dia carregando latas cheias de concreto para as construções, rendendo-lhe o carinhoso apelido de "Jabobêu" por parte dos colegas. Além daquele famoso "rabo de galo" lá no bar do Queléu, onde atualizava as prosas com os companheiros de sinuca, Zeca também adorava paquerar as pequenas do vilarejo.

Chico de Zébra, ao contrário, era um Cearense baixinho, bigode aparado, fala fina, metido a valentão, peixeira sempre na cintura, pois era um exímio cortador de cana. Em três coisas Chico acreditava: em Jesus, Maria Santíssima, e na honra da família. Trajando sua costumeira e surrada bermuda jeans, hoje sem cor, e um chapéu remanescente dos tempos em que largou o trabalho de pescador lá em Camocim, Chico morava numa choupana, com seus 2 filhos pequenos e claro, a sua formosa Antonieta, que embora para os dias de hoje já andasse meio decaída, já fora considerada a moça mais bela de Cotergipe. Religioso, aos domingos Chico levava a prole a assistir às chorosas homilias do vigário local, quando retiravam do armário as suas chitas mais imponentes.

Mas há tempos, andava acabrunhado o velho Chico. As más línguas do lugar haviam chegado até seus ouvidos, que Jabobêu andava dando em cima da sua Antonieta, e embora ele não tivesse a menor prova da veracidade dos boatos, que a cada dia se agigantavam em Cotergipe, isso estava roubando as suas noites de sono. Como medida preventiva, Chico começou a espalhar na redondeza, a fama de ser bom atirador de facas e que iria partir a cara do primeiro condenado que paquerasse a sua "fiel" esposa.

Zeca, folgado como sempre, não se deixava intimidar por esses ataques de ciúmes, e lá do Bar do Queléu, continuava com aquele olho de urubu esperando a vítima, pra cima da mulher do Chico, até o dia em que, tomando umas pingas a mais, começou a falar bobagens, e disse pra todo mundo:

"Antonieta é que é mulher! Ainda vai ser minha, num é pra tá com um bestalhão como aquele Chico de Zébra. Chico além de Fela da Puta, é Corno!" - Foi aquele alvoroço na cidade. A notícia se espalhou como fogo em mato de novembro, até chegar aos ouvidos de Chico, que logicamente, ficou indignado, e passava a noite resmungando, apesar dos muitos chás de camomila e erva cidreira que Antonieta lhe preparava. "-- Eu vou matar aquele desgraçado!", dizia. A mulher ainda tentava acalmá-lo: "- Chico, você num vá fazer uma besteira, homem de Deus, olha os teus 2 filhos pequenos pra criar..."

Mas Chico estava se sentindo humilhado e firmemente determinado a passar essa estória a limpo. Correu o boato na cidade, de que iria matar Zeca Preto, que quando soube, caiu na gargalhada, não ficando nem um pouco intimidado. Zeca, na verdade, se deliciava com as notícias vindas das bandas do Chico, que garantiu tomar satisfações.

Não suportando mais aquela terrível situação, pois ao passar pelas ruas de Cotergipe, até as crianças já zombavam: -- Ali vai Chico de Zébra, o corno da cidade!", Chico decidiu que o Sábado à tarde seria o momento ideal para a execução de seu plano macabro. Iria se encontrar finalmente com Zeca Preto no bar do Queléu. "-- Quero ver se aquele vagabundo tem a coragem de dizer na minha cara o que ele anda dizendo por aí, nas costas..." resmungava.

No dia programado, Chico pegou a sua famosa peixeria, botou na cintura, tomou umas bicadas e saiu em direção ao Bar do Queléu. Nem é necessário dizer que metade da cidade o seguiu em povorosa. Crianças gritavam, mulheres choravam, e os homens naquele alvoroço, diziam: "hoje vai ter pau! hoje um dos dois se acaba ! Eita, Danou-se!"

Zéca Preto tava ainda conversando dentro do bar, quando olhou pela janela e viu a multidão vindo naquela direção, e alguém disse "Que diabo é aquilo, Zéca ? O povo endoidou ? " "Não! deixa estar! É o Chico que vem lavar a sua honra de corno!"

Chico, já com cara de valentão, "pegando ar" sob a gritaria do imenso público que o seguia, e aparentando uma coragem até então inexistente em sua vida, mesmo tendo apenas quase metade da altura de Zéca Preto, chegou defronte ao Bar do Queléu e gritou:

"Zéca Preto? Eu quero ver se tu é homem é agora!"

Fêz-se aquele silêncio no vilarejo.

"Eu quero é ver se tem homem nessa cidade!"

Zéca, dentro do bar, tomou a última lapada de cana, acendeu um cigarro e foi calmamente em direção à porta. Coçou a cabeça e disse:

"O que é que você quer, Chico ?"
"Eu vim lavar minha honra!" "Eu soube que você andou dizendo por aí que eu sou Corno. Isso é verdade ? Quero ver se você tem coragem de dizer que eu sou corno na minha frente, aqui, pra todo mundo escutar. Quero ver se tu é macho mesmo é agora, Zéca Preto!"

Zéca então, largou o cigarro, e ficando na frente do Chico, inclinou o enorme corpo negro, e olhando bem nos olhos, disse com uma voz grave e forte:

"Eu falei pra todo mundo e digo agora na sua cara, Chico: Você não só é o corno da cidade, mas é também um Fela da Puta, um viado e um baitola! E aquela sua mulhezinha Marieta, ainda vai ser minha. Agora abra a boca aí, e diga ao menos um "piu" pra gente se acertar os ponteiro agora! o que é que você veio fazer aqui mesmo ?" ( E começou a dar murros na parede ).

Chico de Zébra, então, tremendo como uma vara verde, e quase se mijando diante daquele vexame, com todo mundo olhando e esperando qualquer reação, pensou...pensou e com uma voz cada vez mais fina, soltou finalmente essa:

"ÊÊÊ...Ê.......Eu num disse ? ... Eu num disse, pessoal ? Taí. Dei valor a você, Zéca Preto! Pra mim homem tem que ser macho assim, que diz as coisa na lata, na cara. Num é como essa ruma de falso, de baitola daqui de Cotergipe, que alevanta falso de nóis pelas costa ! Homem pra mim tem que dizê as coisa assim, na cara. Agora eu tô por dentro que tu é macho mesmo! " E fechando a boca, saiu cabisbaixo e de fininho no meio da multidão.

Zeca Preto, voltando para o bar, pegou um taco da sinuca, e enquanto passava o giz azul, deu uma "goipada". Queléu, o dono, então falou: "E aí, Zeca, como é que tu sabia que ele ia se desmanchar daquele jeito ?"

Zeca Preto fez uma cara de "amassa prego" com o cigarro no canto da boca, e olhando por cima do taco com um olho fechado, apenas resmungou de lado:

"É porque nesse mundo, Queléu, até pra ser um bom corno como Chico, é preciso já nascer com talento!"

Por: Dihelson Mendonça

4 comentários:

Liduina Belchior disse...

Dihelson,

Gostei da estória de Chico da Zébra.O apelido "Jabobêu" é bom demais. É a cara da nossa região mesmo. Valeuuuuuuuuuuuuuu

Abraços: Liduina.

Claude Bloc disse...

Dihelson,

Cada dia que passa, descubro mais e mais seus talentos literários. Sim, porque aqui você não é o Dihelson-repórter, aquele que noticia e vibra com seu trabalho.

Aqui também você não nos delicia com seu piano... mas com outro teclado regido por palavras. Enfim, quero apenas dizer que gostei muito do sua produção literária e peço para usar suas próprias palavras para dizer:

"É porque nesse mundo, Dihelson, [...] pra ser um bom,[...] é preciso já nascer com talento!"
... e isso você tem de sobra.

Abraço,

Claude

Dihelson Mendonça disse...

Liduína e Claude, muito obrigado, minhas amigas!

Liduína, Chico de Zébra era um doido que achava que somente as bravatas poderiam derrotar a verdadeira coragem, rs rs rs. Muitíssimo Obrigado, Lidu, vindo de você eu me sinto muito honrado MESMO.

E menina Claude,

Que as outras pessoas não se sintam de forma alguma desmerecidas nem enciumadas com o que eu vou dizer aqui:

Esse foi sem dúvida alguma, o maior elogio e aprovação de algum trabalho literário que eu poderia receber, porque eu a considero uma espécie de "Pachelly da Literatura". Assim como o nosso mestre Pachelly consegue captar tão bem as cores, a POESIA da imagem, a facilidade, você nos brinda com coisas belíssimas que como eu já disse diversas vezes em outras oportunidades e não me canso, eu só vejo igual naqueles grandes poetas já consagrados que todos nós admiramos, que nem vou citar nomes.

Olha, muito obrigado mesmo. Na verdade, eu nunca escrevo quase nada porque acho o meu "talento literário" tão aquém das coisas boas que a gente lê, tão distante do nível em que você, a Socorro, ou o Zé Flávio estão, que eu perco o entusiasmo com a escrita e via de regra, não publico nada.

Mas recebendo esse choque de 220 volts aí que você me deu, quem sabe eu consiga reservar alguma parte do meu escasso tempo aqui para me aperfeiçoar.

Como ninguém nasce sabendo, eu presumo que com muito estudo E prática eu possa melhorar.

O objetivo deste breve conto, foi suprir uma deficiência lá do Blog do Crato nos finais de semana. Desde que o Zé Flávio não quis mais postar lá por causa de divergências políticas, ficou uma lacuna nos "causos humorísticos". Então, como ninguém quis escrever algo assim, é aquela coisa: "Quem não tem cão, caça com gato."

Embora escrevendo muito ruim como eu, pelo menos, a gente vai tentando fazer um quadro de histórias de humor numa base semanal ( que Deus nos dê inspiração ), rs rs.

Um grande abraço,
E muito muitíssimo obrigado mesmo.
Maravilha. Morro feliz!

Dihelson Mendonça

Dihelson Mendonça disse...

E desculpem-me os muitos erros aí na minha resposta, escrito às pressas. Já vejo erros absurdos, mas não vou editar não. Dá pra entender...

Abraços