Criadores & Criaturas



"Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
"

(Carlos Drummond de Andrade)

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... Por do Sol em Serra Verde ...
Colaboração:Claude Bloc


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quarta-feira, 9 de junho de 2010

óculos embaçados

A poncheira de vidro
tua cúmplice.

Em um dia febril
pousou dentro dela
um beija-flor.

Era aquele tempo
em que passarinhos
invadiam nossa casa.

Tua poncheira de vidro
ficou branca de susto.

O beija-flor partiu
arranhando as asas
pelas paredes
do corredor.

Era aquele tempo
em que nossos corpos
de madrugada se tocavam.

Eu te beliscava.
Tu entortavas meu dedo.

Tudo que vejo e sinto agora
muda de olhar a cada instante.

Só não me seguem
os beija-flores.

Também tenho absoluta certeza
que a poncheira de vidro
não é a mesma.

CLIQUE - Por Edilma Rocha


Santidade

Sob qualquer hipótese
és eterno.

Mesmo com a minha morte
permanecerás açoitando
a memória dos outros.

Seria injusto da minha parte
somente aos objetos
coubesse meu silêncio.

Tu és toda a totalidade
dos próprios objetos.

Dos seres inanimados.
Falastrões.

Antes que recaia sobre eles
o meu olhar lunático

tu com tua generosidade
assopra aos meus ouvidos

que tipo de alma
devo ter.

O meu fim não tem importância.
É a tua vitória contra o efêmero.

Com a minha morte
estarás livre.

Sem incumbência.

O que pesará
é a lembrança.

Mas sabemos que toda lembrança é falha.
Que todo pensamento é propenso a falha.

Com o meu fim
a única verdade:

tu com tua cerimônia
tu com teu desleixo.

Infinitamente maior.
Além do próprio invisível.

Entre as raízes e o olho do pé de macaúba - por José do Vale Pinheiro Feitosa

Foi uma tarde destas dos tempos sem medição quando nos encaramos. Pedro Belém e este que vos narra. Entre nossos olhares corria um vão maior que muitos séculos. Na aparência nossas idades não tinham mais de 50 anos de diferença, mas nossas almas se distanciavam de modo descomunal: entre as raízes e o olho de um pé de macaúba. Pode não parecer muito, mas tente vencer esta distância subindo pelo tronco da fera espinhosa.

Pedro Belém não tinha imagens para recordar-lhe o que a mente resguardara. Nem fotos ou desenhos. Os mortos do seu tempo passado apenas estavam vivos na sua memória. E ele tinha somente os significados e significantes do seu discurso para dizer-nos como eram e o que eram para ele.

Não havia uma música de fundo a determinar-lhe a saudade e nem uma nota lânguida que acendesse alguma centelha de um momento qualquer de sua vida acontecida. A música era recordada como festa, como evento, seja nos terreiros ou embaixo das latadas nas danças de volteio.

Por certo que nos olhos de Pedro Belém ressurgiam as imagens das paisagens que se reconheciam como algo de então, mas para isso havia uma distância para as pernas já ocupadas pelo trabalho diário. Quando coincidia, Pedro parava com seu olhar amoroso, cuidadoso daqueles momentos ali vividos e a paisagem, ou pé de bogari, ou a ribeira do rio se tornavam o momento eterno daquele homem da distância secular.

O gosto de Pedro bem lhe dizia do conforto do sabor conhecido. Daquela papa de Carimã das noites de inverno, quando se encostava no ombro da mãe para se aquecer em tudo que a proteção tem de calor para embainhar o corte do frio. Nunca mais, na sua solidão de solteirão, bebera uma gemada quente justamente quando a fraqueza do resfriado mais aberta deixava as portas das terminações a partir de onde mais nada havia.

Pedro Belém contava com bem pouco das lembranças dos sentidos para ditar-lhes os acontecidos que lhe dão espírito de povo. Só e quando a natureza espontaneamente ou por uma coincidência de suas obrigações lhes punha à mostra destes eventos sensitivos que tão bem ligam o presente e o passado. Em compensação, Pedro só contava com ele mesmo para dizer quem era, quem foi e pretendia ser.

Muito diferente do que é lá no olho da macaúba. Com seus momentos marcantes, um filme para lembrar aquele instante, um perfume artificial para despertar amores e lembranças sensoriais, uma música para despertar as lembranças de alguém, uma imagem em movimento para capturar uma síntese de pensamento. Pedro Belém e eu nos encaramos com um vão de séculos, não dos séculos um a um, cada cem anos que passou, mas uma espécie de aberração secular, que em pouco menos da metade deu um salto como se virasse a página inteira para outra era.

E os espinhos não me deixam descer até as raízes da macaúba.

COMPOSITORES DO BRASIL


CHICO BUARQUE
Parte II
“Nem toda loucura é genial.
Nem toda lucidez é velha.” (cit. por Chico Buarque).

Por Zé Nilton

Naqueles tempos, a famosa década de 1960, tudo era muito questionado. Inicialmente pela questão dos ventos democráticos que respirávamos desde 1945, e no meio da década, pela questão do estado de direito subtraído pelo regime militar. Época de beligerância e desassossego. Era comum digladiarem-se em campo aberto e depois fechado, a direita e a esquerda armada, artística, católica, estudantil, intelectual, movimentos musicais etc.

Bons tempos aqueles em que se brigava e se produzia tendo como valor o esteticamente correto, seja no plano político, educacional, urbanístico, artístico... enfim, que tal um passeata contra a guitarra elétrica ?

No plano musical um fato é bem marcante desse período de muita inspiração nas cabeças e nas bocas, nos corações e mentes, mas também como disse, de cobrança e de fustigação pelo que deveria ser o novo, o belo, o melhor. Estabeleceu-se o confronto entre tradição e inovação na cultura brasileira e, no caso, na música brasileira.

Conta-se ter havido um ligeiro affair entre Gilberto Gil e Chico Buarque por ocasião do 4º. Festival da Música Popular Brasileira, da Tv. Record – S. Paulo – em 9 de dezembro de 1968, quando a música de Chico Buarque “Benvinda” ficou em sexto lugar no júri oficial, mas obtendo a primeira posição no júri popular.

Como havia um desencontro nas propostas tropicalistas de Gil e Caetano por parte de Chico, no momento em este cantava com o MPB4 o famoso samba, Gil teria gritado “superado”!

No mesmo dia o jornal Última Hora publicava um artigo de Chico sobre o episódio. Acho que vale a pena reproduzi-lo para reflexão:

“Estava mal chegando a São Paulo, quando um repórter me provocou. “Mas como, Chico, mais um samba? Você não acha que isto já está superado?” Não tive tempo de me defender ou de atacar os outros, coisa que anda muito em voga. Já era hora de enfrentar o dragão como diz Tom. Enfrentar as luzes, os cartazes e a platéia, onde distingui um caro colega regendo ou coro pra frente, de franca oposição. Fiquei um pouco desconcertado pela atitude de meu amigo, um homem sabidamente isento de preconceitos. Foi-se o tempo em que ele me censurava amargamente, numa roda revolucionária, pelo meu desinteresse em participar de uma passeata cívica contra a guitarra elétrica. Nunca tive nada contra esse instrumento, como nada tenho contra o tamborim. O importante é ter Mutantes e Martinho da Vila no mesmo palco.
Mas, como eu ia dizendo, estava voltando da Europa e de sua música estereotipada, onde samba, toada etc são ritmos virgens para seus melhores músicos, indecifráveis para seus cérebros eletrônicos. “Só tenho uma opção”, confessou-me um italiano, “sangue novo ou a antimúsica. Veja, os Beatles foram à India...” Donde se conclui como precipitada a opinião, entre nós, de que estaria morto o nosso ritmo, o lirismo e a malícia, a malemolência. É certo que se deve romper com as estruturas. Mas a música brasileira, ao contrário de outras artes, já traz dentro de si os elementos de renovação. Não se trata de defender a tradição, a família ou a propriedade de ninguém. Mas foi com o samba que João Gilberto rompeu as estruturas da nossa canção. E se o rompimento não foi universal, culpa é do brasileiro, que não tem vocação pra exportar alguma coisa. Quanto a festival, acho justo que estejam todos ansiosos por um primeiro prêmio. Mas não é bom usar de qualquer recurso, nem se deve correr com estrondo atrás do sucesso, senão ele se assusta e foge logo. E não precisa dar muito tempo para se perceber “que nem toda loucura é genial, como nem toda lucidez é velha”.
(Homem, Wagner. Histórias de Canções: Chico Buarque. São Paulo: Editora Leya, 2009, PP-73-74)

Na segunda parte do COMPOSITORES DO BRASIL, quinta, falaremos um pouco de sua obra, entre 1967 a 1978. Na sequencia:

RODA VIVA. 1967
BENVINDA. 1968
GENTE HUMILDE (Garoto, Vinícius e Chico). 1969
APESAR DE VOCÊ. 1970
CONSTRUÇÃO. 1971
PARTIDO ALGO. 1972
FADO TROPICAL. (Chico Buarque e Ruy Guerra).1973
ACORDA AMOR. 1974
JORGE MARAVILHA.1974
TANTO MAR. 1975
MEU CARO AMIGO( Chico Buarque e Francis Hime). 1976
MANINHA. 1977.
GENI E O ZEPELLIN. 1978

Quem ouvir verá!

Informações:
Programa Compositores do Brasil
Sempre às quintas-feiras, de 14 horas as 15 h.
Rádio Educadora do Cariri – 1020 kz
Pesquisa,produção e apresentação de Zé Nilton
Apoio: CCBN.
Retransmitido pela HTTP//:cratinho.blogspot.com

Tao

Não sei se existe
algo tão milagroso

quanto caminhar
e sentir o corpo.

Sem pensar nele.
Deixar-se andar.

Do quarto
à sala.

Da varanda
ao banheiro.

Os joelhos rosnando
a cada passo.

Fertilidade

Não penses que o diabo
confabula maldições
contra tua miserável alma.

Que o mundo inteiro conspira
a favor da tua desgraça.

Uma topada que te decepa o dedo.
Junto com ele aquela unha encravada.

Não acredites nos teus pesadelos.
No zumbido natural aos ouvidos
de quem é cego.

A cigana estava de ressaca
ao ler tuas mãos.

Acalma-te.
Teu destino é um passo.

Basta um passo.

As ideias são bolas de gude
e estas astros
girando na órbita
de uma cabeça tonta.

Se conseguires dar um passo
serás dono da tua vida.

Os demônios te pedem perdão.
A cigana um café quente.

O mundo continua
da mesma forma.

A ponta acesa
de um cigarro.

Vê ao teu lado
a silenciosa exuberância
dos objetos. Não te iludas:

há muitas batalhas em torno
do torrão de açúcar
da migalha de pão
do cadarço solto.

Um Brinde a Amizade - Por Magali de Figueiredo Esmeraldo

A amizade é muito importante na vida das pessoas. Ninguém vive sozinho. O ser humano precisa do outro. A amizade verdadeira, sincera e madura é aquela em que aceitamos os amigos com defeitos e qualidades e vice–versa. Os amigos verdadeiros sempre nos apóiam nos momentos alegres e tristes. Quem tem bons amigos, mesmo que sejam poucos, deve agradecer a Deus essa dádiva que Ele nos oferece.

Sempre procuro agradecer a Deus os amigos que tenho. Recentemente passei por um momento triste com o falecimento da minha mãe. E os meus amigos me apoiaram e me confortaram. Serei eternamente grata a todos. Tantos os amigos de Crato como os de Fortaleza se solidarizaram comigo através da presença, dos e-mails, dos comentários nos blogs e dos telefonemas. Amigos de verdade se alegram com a nossa felicidade e nos consolam nos momentos tristes.

Participando aqui dos blogs da região, reencontrei amigos e amigas de infância e construí novas amizades, que prezo muito. E o que é mais importante, a amizade está acima das diferenças de opinião. Nada impede de que eu seja amiga de alguém que tenha o pensamento político diferente do meu, professe outras religiões ou não tenha crenças. É fundamental que respeitemos a pessoa e suas diferenças.

A sabedoria popular nos ensina que: “quem tem um amigo tem um tesouro”, “mais vale um amigo na praça, do que dinheiro na caixa”.

Na Bíblia há muitas passagens sobre a amizade. No livro dos provérbios encontramos as seguintes citações: “Assim como os perfumes alegram a vida, a amizade sincera dá ânimo para viver." (Pv27,9), “Algumas amizades não duram nada, mas um verdadeiro amigo é mais chegado que um irmão”( Pv18,24).

Em todos os tempos as pessoas se preocuparam com a convivência fraterna. E nos dias atuais isso é muito importante, pois nossa sociedade está muito violenta. Não poderia ser diferente com as pessoas que viveram na época em que a Bíblia foi escrita.

Jesus em toda a sua vida viveu cercado de amigos. Chorou quando Lázaro morreu (Jo 11,35). Chorou pelo amigo e veio lhe trazer a vida de volta. Jesus quando ressuscitou Lázaro pediu aos presentes que o desamarrassem soltando os panos que o envolvia. Com essa ação libertadora Jesus nos convida a continuar a sua pratica, desamarrando todos os laços que prendem as pessoas a uma a situação de morte.

Jesus nos disse ainda: “O meu mandamento é este: amem-se uns aos outros, assim como eu amei vocês. Não existe amor maior do que dar a vida pelos os amigos. Vocês são meus amigos, se fizerem o que eu estou mandando. Eu já não chamo vocês de empregados, pois o empregado não sabe o que o seu patrão faz; eu chamo vocês de amigos porque eu comuniquei a vocês tudo o que ouvi do meu pai.” (Jo 15, 12-15). Jesus nos convida ainda hoje a desenvolver o amor e, quer de cada um de nós uma adesão livre, de amigos, não de servos. Jesus é o amigo que dá a vida pelo amigo. A amizade é dom de Deus e a vontade de Jesus é que testemunhemos o amor de Deus.

Todos nós que temos bons amigos somos privilegiados. Convido a todos a brindar a amizade e homenagear os amigos sinceros, que nos alegram, animam nossa vida e contribuem para a nossa felicidade.

Por Magali de Figueiredo Esmeraldo


Meu computador está sem funcionar há mais de uma semana. O técnico já chegou , e ficou de voltar, nem sei quando. Estou usando um "note" , que todos os dias amanhece com uma função minada. Como se não bastasse o impedimento de postar vídeos, agora não está permitindo , nenhuma das outras propriedades: postar imagens, por exemplo. Mas tudo bem ! Temos tantos colaboradores , que nada faz falta !
Vou providenciar meu almoço. Hoje, a comida é bem caseirinha .Simples, mas por isso mesmo carece de mais carinho.
Depois eu volto, para ler e me deleitar com novas postagens .
Um dia ameno e iluminado para todos !

CLIQUE - Por Edilma Rocha


Lânguida maré

Quietude de maré baixa
em dia nublado
lentidão/sonolência
languidez de maré baixa
beijo das ondas na areia
de leve,
murmurando segredos delicados
lambendo a concha solta na areia
lassidão
marasmo
eu também lânguida
largando-me preguiçosa
na areia.
(StelaSiebraBrito)

Cela

A porta tem vontade própria.
Seguro pelo polegar direito
seu dorso de madeira.
Ela se rebela.

Pensando bem: não é a porta
merecedora do livre arbítrio.

É o vento (senhor dela)
que lhe diz com que força
deve bater na parede.

Submissa a porta obedece.

"Amigos novos e antigos"

Eu te agradeço ... - Socorro Moreira

o batom dividido
o sanduiche partilhado
a companhia na noite do escuro
a troca de poesias
a hospitalidade , o abraço,
o telefonema, o livro emprestado
o remédio receitado
o CD replicado, o filme sugerido
o presente de aniversário ...
a carona concedida
a prece unida
o jarro de violetas,
a toalhinha bordada,
o email carinhoso,
o pedaço de bom-bocado.
As alegrias vividas
as tristezas superadas
o conselho recebido
a partida inesperada
a música no pé do ouvido
o instrumento dedilhado
a solidariedade, a cumplicidade ...
o olhar enternecido
a certeza da amizade !


Amigos Novos e Antigos

Composição: Aldir Blanc - João Bosco


As frases e as manhãs


são espontâneas


Levantam do escuro


e ninguém pode evitar


Eu tento apenas


mostrar cantando


O lado oculto do meu coração


Eu tenho às vezes


no olhar tardes de chuva


E sons percorrendo


alamedas na memória


Eu tento apenas


mostrar cantando


O que há nos lagos


do meu coração



"Quando para mucho


me amore de felice corazon


Mundo paparazzi me amore


chika ferdy para sol


Questo obrigado tanta mucho


que can eat it carrosel"


Alguém entrou nomeu peito agora


Mas só depois

vou saber quem é.

A “magia” do futebol – Por: José Nilton Mariano Saraiva

Sob um mesmo teto, dentro de um mesmo evento, só que em duas frentes distintas, acontece a “magia” do futebol: coletivamente, nas arquibancadas das arenas da vida, através do outrora impensável e democrático congraçamento dos mais distintos e díspares atores sociais (do médico ao engraxate, do biscateiro ao industrial, da empregada doméstica à deslumbrada socialite, e outros tantos) que, deixando de lado temporariamente suas idiossincrasias, problemas, soberbas e frustrações, em uníssono e irmanados põem-se a roer unhas, vibrar com o desempenho do time do coração, vaiar, aplaudir, premiar a senhora mãe do árbitro com adjetivos os mais “carinhosos”, deglutirem o mesmo anti-higiênico e gostosíssimo “cai-duro” ou mesmo a macaxeira cozida, preparados ali mesmo, na hora, sem importar-se de que venham acompanhados daquele maravilhoso suco repleto de coliformes fecais, antes de, e até que enfim – momento supremo e apoteótico – se enroscarem na comemoração do gol tão esperado; ali, não tem essa de seletividade, de um ser maior que o outro, de alguém se afirmar e se impor em razão de ostentar um anel de “doutor” ou um vistoso cordão de ouro no pescoço; não, ali não tem essa de autoridade, de excelência, de rei do gado; a “magia” dos futebol os faz, mesmo que momentaneamente, iguais, unos, irmãos, complementares, até. Ou, como diria Nelson Rodrigues, um dos nossos grandes dramaturgos e apaixonado por futebol: “todos os torcedores de futebol se parecem entre si como soldadinhos de chumbo; têm o mesmo comportamento e xingam com a mesma exuberância e os mesmos nomes feios, os juizes, os bandeirinhas, os adversários e os jogadores do próprio time” (pelo menos até a saída do estádio, acrescentaríamos).
Já lá embaixo, entre as quatro linhas do “tapete verde” de um Maracanã ou Castelão da vida, ou mesmo no campo de terra batida dos tímidos “estádios” interioranos, a “magia” do futebol se nos apresenta solo, individualizada, personalista, de um só e único dono: o craque, o fora-de-série, aquele que faz a diferença, que desequilibra, magnetiza e é capaz de, numa fração de segundo, deixar o adversário esparramado de quatro no chão, após um drible desmoralizante, ou aplicar-lhe um “banho-de-cuia” magistral, deixando-o a ver navios, antes de aninhar a bola no fundo da rede.
E ninguém mais emblemático para representar tão esfuziante personagem que o nosso saudoso Mané Garrincha, titular absoluto do time do Botafogo e na seleção brasileira em duas Copas do Mundo; recorramos, novamente, ao que escreveu Nelson Rodrigues, ao final da batalha decisiva da Copa do Mundo de 1962, Brasil 3 x 1 Tcheco-Eslováquia, realizada no Chile, quando nos sagramos bicampeões: “Amigos, a bola foi atirada no fogo como uma Joana D’Arc. Garrincha apanha e dispara. Já em plena corrida vai driblando o inimigo. São cortes límpidos, exatos, fatais. E, de repente, estaca. Soa o riso da multidão - riso aberto, escancarado, quase ginecológico. Há, de novo, em torno de Mané, um batalhão de tchecos. Novamente, ele começa a cortar um, outro, mais outro. Iluminado de molecagem, Garrincha tem nos pés uma bola encantada, ou melhor, uma bola amestrada. O adversário pára também. O Mané, com quarenta graus de febre, prende ainda o couro. A partida está no fim. O juiz russo espia o relógio. E o Brasil não precisa vencer um vencido. A Tcheco-Eslováquia está derrotada, de alto a baixo, da cabeça aos sapatos. Mas Garrincha levou até a última gota o seu olé solitário e formidável. Para o adversário, pior e mais humilhante que a derrota, é a batalha desigual de um só contra onze.. A derrota deixa de ser sóbria, severa, dura como um claustro. Garrincha ateava gargalhada por todo o estádio. E, então, os tchecos não perseguiam mais a bola. Na sua desesperadora impotência, estão quietos, imóveis. Tão imóveis que pareciam empalhados. Garrincha também não se mexe. É de arrepiar a cena. De um lado, uns quatro ou cinco europeus, de pele rósea como nádega de anjo; do outro lado, feio e torto, o nosso Mané. Por fim, o marcador do brasileiro, como única reação, põe as mãos nos quadris como uma briosa lavadeira. O jogo acabava ali. Garrincha arrasara a Tcheco-Eslováquia, não deixando pedra sobre pedra. Se aparecesse, na hora, um grande poeta, havia de se arremessar, gritando: "o homem só é verdadeiramente homem quando brinca". E não houve, em toda a Copa, um momento tão lírico e tão doce. Aqueles quatro ou cinco tchecos, parados diante de Mané, magnetizados, representavam a Europa. Diante de um valor humano insuspeitado e deslumbrante, a Europa emudecia, com os seus túmulos, as suas torres, os seus claustros, os seus rios. A última jogada de Mané, no adeus aos Andes, foi uma piada linda e plástica. No mais patético das batalhas, a seleção brasileira soube brincar. E esse toque de molecagem brasileira é que deu à vitória uma inconcebível luz”.
Taí, senhores, a essência da “magia” do futebol.

Ausência de Tristeza - Daniel Hubert Bloc Boris

para claude

Um grande abraço, Claude!
Daniel e Dihelson

Cliques para Edilma

Um toque de vermelho





No jardim de Tony (mano)


Claude Bloc