Criadores & Criaturas



"Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
"

(Carlos Drummond de Andrade)

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... Por do Sol em Serra Verde ...
Colaboração:Claude Bloc


FOTO DA SEMANA - CARIRICATURAS

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quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

COMPOSITORES DO BRASIL


A mulher mente brincando
E às vezes brinca mentindo
Quando ri está chorando
E quando chora está rindo”
(Nuvem que passou)

NOEL ROSA
Parte dois
Postado por Zé Nilton

Seu companheiro do Conjunto Bando de Tangarás, o músico, compositor, locutor e escritor Henrique Fores Domingues – Almirante – conviveu com Noel Rosa desde antes de descobrirem os caminhos da música. Escreveu belas páginas sobre o gênio da Vila, e enfeixou no livro clássico “No Tempo de Noel Rosa”, Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1977.

Em suas páginas escreveu passagens hilárias sobre Noel, com esta que se segue:

“O sono de Noel era dos mais extraordinários do mundo: duro, pesado, impenetrável.
Certa vez, João de Barro, tendo emprestado seu violão a Noel, necessitou buscá-lo no chalé da Teodoro e Silva (residência do poeta da Vila). Ás volta com sua escolinha, Dona Marta (mãe de Noel), dada a intimidade dos dois, indicou:- Pode apanhar seu violão que está no quarto. E pode acorda Noel. – Noel ressonava e o amigo pensou que pudesse despertá-lo facilmente. Primeiro, tocou levemente o seu ombro. Nenhum resultado. Em seguida balançou-o, dando-lhe sacudidelas, fortes a princípio e fortíssimas no final. E Noel não acordou de maneira alguma.

Arnaldo e Oswaldo Araújo, velhos alfaiates, velhos amigos da família, noutra ocasião receberam encomenda de um terno que Noel necessitava com pressa. A primeira prova pode ser feita na alfaiataria, mas a última forçosamente se realizou na casa de Noel, que não pôde ser despertado. Com a ajuda de Dona Marta ele foi colocado de pé, à força, sem tomar conhecimento de si próprio. Assim ocorreu aquela estranha prova de calça e paletó

Noel reconhecia a própria resistência para abandonar o leito. Quando necessitava acordar em horas prefixadas a fim de cumprir obrigações importantes, ao chegar em casa alta madrugada, distribuía por todos os cantos – sobre a mesa, em cordas estiradas pelos corredores, pendurados nas lâmpadas, pelo chão, à porta do quarto, à vista do fogão, à entrada do banheiro – avisos alertadores, em letras garrafais, com abundância de exclamação, deixando clara sua preocupação em não faltar ao compromisso assumido.

ATENÇÃO!!!
MUITO IMPORTANTE !!!
NÃO SE ESQUEÇAM !!!
PRECISO ACORDAR CEDO!!!
CEDÍSSIMO!!!
GRAVAÇÃO ÀS 10 HORAS!!!
É IMPORTANTÍSSIMO !!!
NÃO ACREDITEM EM DESCULPAS!!!

Na manhã do embarque de Noel para o Sul, Dona Marta viu-se em apuros. Por felicidade, Graça Melo Surgiu. Pouco faltava para o Itaquera zarpar e Noel na cama, insensível aos berros, aos solavancos, à retirada violenta de todas as roupas. (...) Noel foi posto de pé, a muque; enfiaram-lhe as calças, a camisa, o paletó. Atabalhoadamente, Dona Marta completava a mala. Á porta, o carro que deveria conduzi-lo ao cais buzinava aflito. E Noel, meio carregado por Graça Melo, Dona Marta e pelo Calulá (o seu amigo para assuntos de acordar), foi atirado dentro do taxi, como um trapo, semi-inconsciente. No trajeto, ia completando suas roupas à medida que os solavancos do automóvel em disparada permitiam.

Os companheiros – Chico Alves, Mário Reis e outros – o aguardavam, já sem esperanças. E ele subiu, sobraçando a mala entreaberta, desgrenhado, camisa fora das calças, olhos empapuçados, mas feliz.” (pp. 107-109).

Coisas de gênio.

Amanhã, a segunda parte da homenagem a Noel Rosa.

Vamos falar mais um pouco de sua obra, ouvindo:

O orvalho vem caindo, de Noel Rosa e Kid Pepe, com Aracy de Almeida, gravação de 03/11/1933
João Ninguém, de Noel Rosa, com Noel Rosa, gravação de 24/07/1935
Tenho raiva de quem sabe, de Noel Rosa, Kid Pepe e Zé Pretinho, gravação de 25/04/1934
Século do Progresso, de Noel Rosa com Isaura Garcia, gravação de 28/07/1937
São coisas nossas, de Noel Rosa, com Noel Rosa, gravação de 1932
Pierrô Apaixonado, de Noel Rosa e Heitor dos Prazeres, com Maria Betânia, gravação original de 1936, para o filme “Alô, alô Carnaval !
Tarzan, o filho do alfaiate, de Noel Rosa e Vadico, com Noel Rosa, gravação de 1936
Por causa da hora, de Noel Rosa, com Noel Rosa, gravação de 10/10/1931
Mentir (ou mentira necessária) de Noel Rosa, com Mário Reis, gravação de 28/09/1932
A.B. Surdo, de Noel Rosa e Lamartine Babo, com Olga Jacobina e Lamartine Babo, gravação de 1930, para o carnaval de 1931.
Fita amarela, de Noel Rosa, com Francisco Alves e Mário Reis, gravação de 29/12/1932
Pastorinhas (ou Linda Pequena), de Noel Rosa e João de Barro (Braguinha), gravação de 13/12/1937
Cem mil Réis( ou você me pediu), de Noel Rosa e Vadico, Chico Buarque e Luiza Buarque, gravação original de 05/03/1936
Cordiais saudações, de Noel Rosa, com Noel Rosa e o Bando de Tangarás, gravação de 18/08/1931.

Quem ouvir, verá !

Programa Compositores do Brasil
Pesquisa, produção e apresentação de Zé Nilton
Todas às quintas-feiras, às 14 horas
Rádio Educadora do Cariri – 1020 khz
Apoio. CCBN

Despojado

Hora de dormir, criança
levar ao travesseiro
teus sonhos

quem sabe esta noite
lindos devaneios

não apertem tanto o peito
nem forcem muito os olhos.

Sabemos teu peito trêmulo
teus olhos tristes

mas algo me espanta,
tu não te cansas da cama

palmadinhas no travesseiro
um enigmático sorriso

lançado ao teto
à teia de aranha.

Não desejes mais
do que este brando vazio:

hematomas perdendo a cor
com o tempo.

Luiz Carlos Monteiro

Poeta, crítico literário e ensaísta. Formado em Pedagogia e mestre em Teoria da Literatura pela UFPE. Publiquei os livros de poesia Na solidão do neon (Pirata, 1983), Vigílias (Fundarpe, 1990), Poemas (Ed. Universitária da UFPE, 1999), O impossível dizer e outros poemas (Bagaço, 2005) e de ensaios Para ler Maximiano Campos (Bagaço, 2008) e Musa fragmentada - a poética de Carlos Pena Filho (Ed. Universitária da UFPE, 2009). Organizei, em colaboração com Antônio Campos, o livro de contos do Prêmio Maximiano Campos nas versões 2, 3 e 4 (IMC/Bagaço, 2008). Tenho poemas publicados em antologias diversas, além de artigos e resenhas espalhados em sites, jornais e revistas de Pernambuco e de outros estados.
Luiz Carlos Monteiro

Mãe e Filha - Luiz Carlos Monteiro



De passagem por Olinda decido ir à procura de alguém que conheço. Chego ao bairro. Localizo a rua e a casa. Chamo. Moram apenas as duas. Mãe e filha. A mãe aparece. Mesmo me reconhecendo não se altera. Não me convida a entrar e nem alimenta nenhuma conversa. Diz apenas que Ela não está. E retira-se para dentro ruminando seus velhos severos cabelos de prata. Antes fecha a porta. Os olhos frios duríssimos por trás dos óculos dourados.
Vi que a antiga árvore da entrada do jardim da casa definhara bastante. Raízes e galhos implodindo cansada. Não havia rastro dos pneus do carro. Insisto. Mas eu preciso saber onde Ela está. A mãe rebate. Agora eu só sei que aqui Ela não está. Taxativa. Volte outro dia. Digo que não posso vir outro dia. Bate novamente a porta na minha cara. Mais três pancadinhas e falo com Ela. Três pancadinhas de nada. Três pancadinhas assim. Desisto. Seguirei o conselho da velha.
Outro dia eu volto. Um tempo que usarei para lembrar e relembrar. Noites que se sucediam rapidamente até o núcleo de vivências inesperadas de muito pique e festa. Horas encruzadas de contatos com aspirantes a artistas e artistas consolidados. Artistas da vida que se equilibravam com a força da ginga e do verbo. Sucesso garantido com as mulheres malucas desinibidas. Bailarinas poetas atores cantoras músicos pintoras. Gente diversa que compunha o espetáculo repetido de bares alternativos e próprios para turista ver e desfrutar. Barraquinhas de queijo assado e tapioca. Abraxas. Cantinho da Sé. Praça do Carmo. Ladeira de São Francisco.
A loucura de aparência espectral de uns contraposta à lucidez falseada de outros. Alguns mergulhados e embalados no ritmo de cigarros ainda proibidos para consumo geral e somente por lá encontrados. Bolinhas de guaraná e fartura de alcaloides . Sempre guardando qualquer ressonância com um passado tão próximo quanto o presente que se estava a fazer. Todos com sede radical de vida. Boêmios que abraçavam a noite pela noite. Sem trocar a conversa bem-humorada e sem compromisso pela destilaria de saberes acumulados. Na noite cerceada e sem saída inventava-se uma outra noite só ocorrente na claridão de luzes clandestinas.
Amanhece e é preciso retornar ao provisório de um quarto. Transitar pela cidade ainda sonolenta. Resolvo que vou ao duplex das duas para ver se Ela também já voltou da surpresa viageira e errante. Busco sem hesitar pela velha ao basculante da porta. Nenhum sinal humano ali. Estava morta na volta. Não sei o motivo. Velhice talvez. Antes tentava dormir não dormia. Agora dorme sem tentar nem desejar. Dormirá indefinidamente. Não há dúvida de que Ela não voltou. Não pude mais procurá-la.
Mundo Circundante

Pensando em claro - Socorro Moreira

Acordei na madrugada

com a tristeza de um olhar

com um riso magoado

com a dor da minha mãe

com a angústia do meu filho

com o ranger dos armadores

com a minha insanidade.

Se tenho a eternidade

a tristeza é infinita...

Se o pior já passou

o melhor não há de vir .

Sinto um imenso calor

nessa madrugada de fevereiro...

- É o sol que já voltou !

Sombras e Sonhos - Socorro Moreira



Tenho pensado mal dos meus sonhos , mas não posso deles me queixar... Fotografam e revelam os meus desejos conscientes e inconscientes. A culpa é minha se eles são modestos ou mesquinhos.
Concentram-se em coisas realizáveis a qualquer tempo.
Os sonhos alcançam as nossas graças.São respostas às nossas dúvidas. Quem quiser que os entendam. Eu até tento !
Sonhei encontrando todo mundo.
Eram duas salas. Na primeira eu via o povo , como era no passado. Percebo-me tímida , mas de olhar caçador e danado. Pronto ! Cruzei meu olhar com um moço tímido mas de sorriso zombeteiro. Por uma fração de segundos a gente se viu. Só que desta vez , eu congelei o fato.
Na segunda sala a gente apareceu com a roupa do futuro. Cabelos cansados , mas restaurados. Percebi novos rostos, adicionados pela vida.
Se os encontros se desencontrarem, não importa... Nos sonhos eles são perfeitos !
Hoje é quarta-feira. Minha agenda está desobstruída dos trâmites gerais. Posso tudo , inclusive ficar de pernas para cima, e deixar a casa sem almoço.
Pra que é que serve ovos e sardinha ? Também tenho os meus dias de farofa , banana , e doce de pacote.
Acordei sem lembrar do que sonhei , mas lembrando um passado remoto , e uma das minhas inúmeras mortes.
A vida reflete o sonho Tenho parcos sonhos. Economizo distâncias , dinheiro, paixão , e até saúde. Sou tão injusta...! Só não economizo poesia.Por falta de sonhos ela chega de chinelos franciscanos, perambulando no frio fulgor das auroras.
Tenho tudo e deixo de querer o essencial. Estou presa à quatro paredes, e de janelas e portas abertas para o mundo virtual. Lá também não sonho , nem invento realidades. Não brinco de amar.
Não sou exatamente triste, nem exatamente romântica. Sou quase esquisita... Alegro-me com o brilho no olhar dos meus amigos. Absorvo e rejeito a tristeza. Choro-a em prantos, sem entender o meu luto contínuo.... Coisas perdidas , ganhos em caixas vazias. Quando a morte chegar , de nada me separará... A não ser das manhãs e madrugadas, e dos irrespiráveis ares que insisto em tragar.
Eu resumi a vida , e ela teimosa se estica. Comprimi todas as músicas, no repertório de Nana Caymmi ( nunca vou escrever sem dúvidas , o sobrenome Caymmi...). Não gosto de política, nem de Economia, nem de futebol ...Não gosto do risível , nem do aterrador. Vivo as madrugadas que nascem e morrem em mim, num cotidiano repetitivo, desequilibrado com algumas surpresas...
Um desconto ou troco poético , que me roubam do tédio.
O contato com as palavras é recreativo. Tomo café com vogais, e faço sopas com todas as letras.
Faço turismo nos contos de alguns, catando arrepios e extraindo gotas de emoção para molhar a secura do coração. Não sei os motivos da arte. Ela foge de mim , quando a procuro, e esconde-se nos meus porões.

Fotografia de uma quase sexagenária - Socorro Moreira


Sou exatamente assim aos 58 anos idade:
Cabelo molhado , batom nos lábios. Meu sorriso não sabe gargalhar, mas não é triste.
Gosto de roupas leves .Vestidos sem mangas e sem golas . Às vezes ativo cachos , o brilho dos olhos e sorriso (as rugas fazem parte).
Acho lindo o pescoço da Audrey Hepburn ... Provavelmente por não tê-lo , em nenhuma das minhas idades. Mas , o meu pescoço de cearense nunca impediu o movimento do meu rosto.
Sou exageradamente tímida. Mas mostro ainda o colo , sem nenhum pudor. Por puro amor ao conforto.
De dois em dois meses vou ao cabelereiro. Justo nesse dia , faço uma escova , e eles ficam lisinhos por algumas horas.
Não estranho o resultado , embora prefira cabelos ao natural .
Tenho uma expressão viva. Lanterna nos olhos e na boca.
Gosto das minhas rugas : reveladoras do meu caminho através da vida..
Mão no queixo é uma pose confortável, em qualquer idade... Hoje ela suavisa o contorno do rosto. Tenho leveza e suavidade . Afasto o calor do meu rosto com os dedos e um bom ventilador.
Silencio , quando observo o mundo. Na busca do entendimento aprendo a ler os sinais externos e internos... Sou assim: interrogo , e compreendo antes de achar a resposta.
A cara lavada , marotamente me diz : Batom ! E assim ela se protege de qualquer tipo de ressecamento, inclusive aquele provocado pela ausência do beijo.
Nasci filha primeira de uma mulher belíssima. Beleza grega – romana. Meu pai tinha traços de índio, e eu herdei uma mistura exótica: nem feia, nem bonita. Testa enorme, cabelos finos e cacheados, boca e nariz pequenos, cara redonda, olhos grandes e expressivos.
A beleza não é estável , em nenhuma época das nossas vidas.
Aos nove anos eu usava óculos que corrigiam a minha miopia. Era gorduchinha, não tinha cintura, nem cabelos lisos e compridos... Nem tão pouco olho claro.
Aos 12 anos eu já tinha corpo de moça feita. A cintura não era de pilão, os cabelos continuavam me dando muito trabalho. Quando comecei a freqüentar algumas festinhas, passava o dia inteiro com ele nos bobies... Aí eu me transformava numa figura “bonitinha”.
Depois da década de 70, assumi os meus cachos, aprendi a ressaltar os traços harmoniosos do meu rosto. Tinha belas panturrilhas, e uma boa altura. Pele sem marcas de espinhas e cravos.
Mas a testa ainda incomodava-me. Com o passar dos anos assumi minha testa , as rugas que foram aparecendo , e o cabelo natural.
Hoje tenho 58 anos. Gosto da minha imagem. Não enfrentaria uma plástica rejuvenescedora (até porque não tenho dinheiro sobrando para as “futilidades). Não sou escrava de ginásticas, dietas, cremes rejuvenescedores, bloqueadores solares. Envelheci com simplicidade e dignidade. Não tenho fotogenia. Nunca tive. Não gosto de ser fotografada, nem gosto de fotografar. Mas gosto de Fotografia !
por socorro moreira

Brincando com meus eus - Socorro Moreira




Não tenho da vida , senão a própria vida...

E dela, nem sou guardiá.

Tenho afetos tantos ...

E um potencial de amor no coração.


A dor passou,

e não quis ficar ...

Achou o terreno encharcado

de alegria ...

Ela rejeita o bem-estar.

Mas sempre volta ,

esperando lugar pra sentar

Tem sua cadeira cativa ,

mas uma cadeira vazia ,

como a canção de Lupicínio.


Se existe pecado em desejar e fomentar

delicadezas...

Em ser sensível às almas benfazejas ...

Quero pecar , pecar, pecar !


Não sei lidar, nem quero ...

Com o obscuro de alguns

Os meus hachurados

estão iluminados

pela consciência de que

Não sou nenhum, nem algum

Sou uma simples intenção divina

que um casal humano argamassou.

Tô aqui , na estrada.

Curtindo os encontros,

e aprendendo com os inversos,

que estão em mim camuflados.

Brinco com as letras,

picho as paredes,

e repinto os versos,

que escrevi no passado.

Voando solta - Socorro Moreira

Ainda não dormi

Também não rolei na cama

Vivo a quietude dessa

madrugada azul e fria.

Estrelas escondidas

nas nuvens ,

namoram entre si

cortinas cerradas

parceiras encantadas

E eu aqui ...

Sustos, suspiros

Amasso como folha

esse sonhar

Despetalo a flor da noite

voando solta

voando solta

voando solta ...

Sem limites - Socorro Moreira



Nove para uma

Nove fora sete...

Semente de amor

germina

Num corpo só.


A noite vem...

Eu sempre penso

que deixei de achar

desapaixonei-me,

que já sei amar.


Eu sempre acho

que o amor deu zebra

que a letra "z"

já fechou a página

de um livro bíblico

de 60o linhas.


Eu sempre sonho

que o possível

é impossível ainda ...


Eu sempre beijo

na imaginação ,

uma boca aberta

que me sopra versos

depois desconverso

mudo o mote

pulo a prosa

me escondo nas entrelinhas

e durmo no meu proprio ninho.


Eu sempre penso

que nunca me iludo

Sou abortiva

Não deixo nascer...

Mas sei semear,

e de longe vejo

constelações de estrelas

na órbita do meu sol


Sem a neura do ciúme

acendo a luz da paixão.

Por tais momentos dessas mulheres poetas - por José do Vale Feitosa



E dos espaços brotaram tristezas,

Pingos das manhãs orvalhadas,

de iluminação efêmera,

dos momentos fugazes.


Meninas que há de tanto?

Esgotamento de estoque,

de vencimento,

Badaladas de partida.
E os sertões?


No ,Solitário,Silencioso,

E depois renasce.
Não poderia algo assim,

Sem certezas de sustentação,

Muito do que se retira,

Como regra da aridez?


O éden fica ao norte do nada,

alegria nesta roda de bambas,

canto nos contrafortes da alma,

E a poesia nos átomos da respiração.


Meninas,

Não segures a cauda do amanhã,

Basta a cela desta jornada,

destino o sonho da pausa,

se levante houver,

Nascerá qual primeira das manhãs.


Por José do Vale Feitosa


Há um debate sobre qualidade artística, talento (uma espécie de sinal de Deus), para que serve o que se escreve e publica? Não é sem razão que se faz desse modo. Muitos manifestaram tais preocupações consigo mesmo.

Até recordo de uma texto da Isabel Lustosa em comemoração à Padaria Espiritual, quando ela se referia a pequenos burgueses, nas franjas do comércio e da Fênix Caixeiral. Aquele seres menores do universo hierárquico brasileiro com suas pretensões literárias. De qualquer modo, apesar da régua baixa nesta parte do texto da Isabel, desta mesma Padaria surgiram nomes nacionais (não muitos, nunca são muitos na seletividade publicitária).

Na minha geração dos cinco anos que vivi em Fortaleza esta rebeldia cearense em face das Academias, de Letras, apresentou a Padaria como uma alça em que no universo do sou ou não sou, carregou muitos talentos que se desenvolvem no processo.

Afinal o debate não terá uma última palavra e vai muito além, misturando estilos e sentimentos. Aproveito para trazer este texto do blog do Saramago a respeito de um escritor português, em termos do seu estilo, seu anacronismo estético e a memória de todos com a volúpia da modernidade.

José Saramago A obra romanesca de Aquilino Ribeiro foi o primeiro e talvez o único olhar sem ilusões lançado sobre o mundo rural português, na sua parcela beiroa. Sem ilusões, porém com paixão, se por paixão quisermos entender, como no caso de Aquilino sucedeu, não a exibição sem recato de um enternecimento, não a suave lágrima facilmente enxugável, não as simples complacências do sentir, mas uma certa emoção áspera que preferiu ocultar-se por trás da brusquidão do gesto e da voz.

Aquilino não teve continuadores, ainda que não poucos se tenham declarado ou proposto como seus discípulos. Creio que não passou de um equívoco bem intencionado essa pretendida relação discipular, Aquilino é um enorme barroco, solitário e enorme, que irrompeu do chão no meio da álea principal da nossa florida e não raro deliquescente literatura da primeira metade do século. Nisso não foi o único desmancha-prazeres, mas, artisticamente falando, e também pelas virtudes e defeitos da sua própria pessoa, terá sido o mais coerente e perseverante.

Não o souberam geralmente compreender os neo-realistas, aturdidos pela exuberância verbal de algum modo arcaizante do Mestre, desorientados pelo comportamento “instintivo” de muitas das suas personagens, tão competentes no bem como no mal, e mais competentes ainda quando se tratava de trocar os sentidos do mal e do bem, numa espécie de jogo conjuntamente jovial e assustador, mas, sobretudo, descaradamente humano.

Talvez a obra de Aquilino tenha sido, na história da língua portuguesa, um ponto extremo, um ápice, porventura suspenso, porventura interrompido no seu impulso profundo, mas expectante de novas leituras que voltem a pô-lo em movimento.

Surgirão essas leituras novas? Mais exactamente, surgirão os leitores para esse ler novo? Sobreviverá Aquilino, sobreviveremos os que hoje escrevemos à perda da memória, não só colectiva, mas individual, dos portugueses, de cada português, a essa insidiosa e no fundo pacóvia bebedeira de modernice que anda a confundir-nos o sistema circulatório das ideias e a intoxicar de novos enganos os miolos da Lusitânia?

O tempo, que tudo sabe, o dirá. Não percebemos que, desleixando a nossa memória própria, esquecendo, por renúncia ou preguiça mental, aquilo que fomos, o vácuo por esse modo gerado será (já o está a ser) ocupado por memórias alheias que passaremos a considerar nossas e que acabaremos por tornar únicas, assim nos convertendo em cúmplices, ao mesmo tempo que vítimas, de uma colonização histórica e cultural sem retorno.

Dir-se-á que os mundos real e ficcional de Aquilino morreram. Talvez seja assim, mas esses mundos foram nossos, e essa deveria ser a melhor razão para que continuassem a sê-lo.

Ao menos pela leitura.

por José do Vale Pinheiro Feitosa

Petit Gateau


Ingredientes


150 g de chocolate meio amargo (amaro da lacta, conte 21 quadradinhos)

150 g de manteiga

1 xícara de açúcar

1/2 xícara de farinha de trigo

3 ovos inteiros

3 gemas


Modo de Preparo


Em banho-maria, derreta a margarina e quando estiver quente acrescente o chocolate acrescente as gemas, os ovos e o açúcar e mexa bem
Acrescente então a farinha de trigo mexendo bem
Unte as forminhas com manteiga e coloque a massa
Leve ao forno por 8 minutos, mas dependendo do forno pode demorar mais, fique de olho, e retire assim que formar uma casquinha

Dica: Servir com sorvete de creme e calda de chocolate quente.

Profiteroles



Ingredientes para a massa :

1 xícara (chá) de água
3 colheres (sopa) de manteiga
1 1/4 xícara (chá) de farinha de trigo
1 colher (chá) de açúcar
1 colher (café) de sal
4 ovos
Manteiga e farinha de trigo o quanto baste para untar.
Ingredientes para a calda:
170 g de chocolate ½ amargo, picado
½ xícara (chá) de creme de leite, fresco
1 colher (sopa) de manteiga
1 colher (sopa) de açúcar
1 colher (chá) de conhaque (opcional)
Ingredientes para o recheio:
500 ml de sorvete de creme ( pode substituir pelo sabor de sua preferência)

Modo de Preparo

Coloque a água, a manteiga, o açúcar e o sal numa panela média, leve ao fogo baixo
Misture bem até ferver
Retire do fogo, acrescente toda a farinha de uma vez
Mexa com uma colher
Volte a panela, com a massa, ao fogo baixo novamente, mexendo sempre, por 5 minutos
Retire do fogo e transfira a massa para a batedeira
Bata em velocidade alta por 3 minutos
Acrescente os ovos, um a um, esperando 30 segundos entre cada adição (este processo é importante para que a massa não talhe)
Retire a massa da batedeira e coloque dentro de um saco de confeitar com bico liso
Unte uma assadeira com manteiga e farinha
Aperte o saco de confeitar sobre a assadeira, formando bolinhas
Deixe um espaço entre as bolinhas
Leve ao forno pré-aquecido e asse até que comecem a dourar
Verifique com um palito se o interior das bolinhas está cozido
Retire do forno e reserve

Para fazer a calda, pegue uma panela, acrescente o creme de leite e leve ao fogo baixo para esquentar, antes de ferver, desligue e acrescente o chocolate picado, a manteiga, o açúcar e o conhaque
Misture bem até que fique um creme
(não esqueça de fazer isso com o creme de leite ainda quente, para poder derreter o chocolate)
Para a montagem, pegue os profiteroles já assados, abra-os ao meio com uma faca (estes estarão meio ocos por dentro)
Recheie cada um com o sorvete e tampe com a outra metade
Coloque-os em uma taça grande ou outro recipiente para sobremesa, cubra com a calda de chocolate decore e sirva a seguir
Dica: ao fazer a montagem da sobremesa use sua criatividade
Pode acrescentar castanha moída por cima, chantilly, frutas cristalizadas, morangos
Etc
Tudo Gostoso

A Injustiça que mata – por Magali de Figueiredo Esmeraldo

Deus fez um plano para toda a humanidade e os homens fogem desse plano. O ser humano é tão imperfeito, que em vez de fazer a vontade de Deus, persegue os mais fracos e humildes. E o que é pior, comete as maiores barbaridades contra os seus irmãos inocentes quando estão no poder, com a desculpa de defenderem a ordem. Esquecem até que o sol nasceu para todos.

No pequeno livro “O Beato José Lourenço e sua Ação no Cariri” de José Alves de Figueiredo muito me sensibilizou a maneira como o escritor fez a defesa do Beato José Lourenço. Embora já tenha lido sobre o Caldeirão, para mim, esse depoimento foi marcante, pois foi feito por alguém que viveu na época do beato e, era proprietário de um sítio vizinho ao Caldeirão e o conheceu de perto.

O Beato José Lourenço chegou ao Juazeiro muito jovem, com apenas 20 anos de idade, em l890, vindo da Paraíba, sua terra natal. Era um verdadeiro fanático do Padre Cícero e o enxergava como um santo superior, uma vez que em sua mentalidade estreita, a figura do padre se engrandecia. Quando o beato chegou ao Juazeiro, a beata Maria de Araújo ainda vivia e o fanatismo estava no auge. Em vez de ir explorar as pessoas como alguns faziam, preferiu pegar na enxada, dirigindo-se ao campo, para viver de modo honrado da profissão de agricultor. Com esse objetivo, foi se instalar numa parte do Sítio Baixa Dantas, arrendando essa terra ao seu proprietário, senhor João de Brito.

Dentro de pouco tempo transformou alguns hectares de terra seca, num lindo pomar com frutas variadas, como também uma cultura de algodão, cereais e mais outras qualidades de plantas e hortaliças. O beato José Lourenço com o seu trabalho foi prosperando e ganhando fama. E também, com seu elevado espírito de caridade, começou a acolher numerosas famílias pobres e encher de órfãos o seu próprio lar. Tinha tanto desprendimento, que não se incomodava de gastar o fruto do seu trabalho com essas pessoas que passaram a constituir a sua família.

Durante muitos anos, viveu tranquilamente na Baixa Danta, e ninguém o incomodou por levar uma vida de ajuda humanitária.

Na revolução de 1914, foi recolher-se em Juazeiro. Mas, mesmo estando disposto a morrer pelo Padre Cícero, não tomou parte na luta, porque tinha um coração extremamente sensível e não desejava fazer mal a ninguém.

Após o movimento ter acalmado, o beato voltou à sua lavoura, encontrando-a destruída em parte. Recuperou as perdas com muito trabalho em curto período de tempo.

O Padre Cícero ganhou de presente um touro de raça e o entregou a José Lourenço para este cuidar. Como o beato tinha afetividade para com os animais, empregou pessoas para cuidar do touro que se tornou um belo animal admirado por todos. Alguns fanáticos mais exagerados, achando que iam agradar ao Padre Cícero, enfeitavam os chifres do boi com grinaldas de flores. Além do mais acreditavam que a urina do boi servia de remédio.

A lenda do boi santo foi deturpada pela imprensa e José Lourenço acusado injustamente de estimulador de um grosseiro fetichismo. Foi preso e obrigado a comer a carne do boi “Mansinho” que era muito estimado por ele. Suportou todas as humilhações sem protestar. Quando solto, sem guardar mágoas de quem o perseguia, voltou a Baixa Danta para o seu trabalho.

O proprietário do sítio precisou vendê-lo e o novo dono queria receber a terra imediatamente. Com o seu desprendimento perdeu todo o seu trabalho, e sem causar confusão foi para o Caldeirão dos Jesuítas, terreno do Padre Cícero que fica situado entre os sítios Lagoinha e Cruzinha. Isso ocorreu no ano de 1926.

O Caldeirão era uma terra sem nenhuma benfeitoria, mas o beato, assim como na Baixa Danta, construiu sua casa, um engenho de madeira e fez roças. Simultaneamente, diversas casas foram sendo construídas ao redor. O Caldeirão se tornou uma bela propriedade com uma população trabalhadora e obediente ao beato que, na mais rigorosa ordem a orientava para o bem. Não existiam armas, só instrumentos de trabalho.

O Beato José Lourenço sofreu inúmeras perseguições injustas como se fosse perigoso a ordem. Era mal compreendido e não sabia se defender, sendo preso várias vezes injustamente.
Tinha um grande coração, pois num período de seca sustentou por vinte e três meses dando uma refeição diária, além do pessoal que já morava com ele, a mais quinhentas pessoas, com alimentos que tinha guardado nos depósitos do Caldeirão.

José Alves de Figueiredo foi preso no tempo do Estado Novo, por ordem do chefe de Polícia da época, simplesmente por ter defendido José Lourenço com o artigo publicado no jornal “O Povo, de Fortaleza em 07.06.1934.

O Caldeirão foi uma experiência comunitária baseada na mensagem igualitária da Bíblia. As autoridades temendo que essa experiência se tornasse uma nova Canudos destruíram o Caldeirão em 1936 com muita crueldade, realizando um grande massacre, cujos números mortos nunca se soube quantos.

Por Magali de Figueiredo Esmeraldo
Tendo como fonte: “O Beato José Lourenço e sua ação no Cariri” de José Alves de Figueiredo, Museu do Ceará, Fortaleza, 2006

Não há vagas - Ferreira Gullar

O preço do feijão
não cabe no poema. O preço
do arroz
não cabe no poema.
Não cabem no poema o gás
a luz o telefone
a sonegação
do leite
da carne
do açúcar
do pão

O funcionário público
não cabe no poema
com seu salário de fome
sua vida fechada
em arquivos.
Como não cabe no poema
o operário
que esmerila seu dia de aço
e carvão
nas oficinas escuras

- porque o poema, senhores,
está fechado:
"não há vagas"

Só cabe no poema
o homem sem estômago
a mulher de nuvens
a fruta sem preço

O poema, senhores,
não fede
nem cheira

Ferreira Gullar

De Lupeu Lacerda



Meu olho me incomoda. Penso na bíblia sem serventia na sala: “se teu olho etcétera e tal, arranca-o e joga-o na fogueira”. Os caras não eram de brincadeira não. Olho jornais antigos. Gosto de noticias frias. Uma amiga minha fala que amou São Paulo as escuras. Imaginou que fosse o fim do mundo, mas não tinha trilha sonora competente, e ela sacou que era só mais um desastrezinho. Um cara escreveu no jornal “meu deus, eu não vi o rio de janeiro”. Me deu vontade de responder que também não. Fiquei com receio que ele entendesse que eu o estava apoiando, que aquilo era um tipo de oração e tal, não repliquei. Passo em revista as revistas, e meu amigo Gustavo me conta que a uniban não aceita meninas de vestidinho. Se teu olho te envergonha... me cago de medo desse povo que volta e meia proíbe alguma coisa. Mirisola diz que Jesus só anda mal acompanhado. Porra mirisola, você me assusta com sua lucidez. Daí penso que lucidez também pode ser passível de proibição. Assim como também não concordar. – “você nãoconcorda? Seu filho da puta! Vou cortar fora seus testículos para que você não estupre mais ninguém!” ui. Ui. Ui. Se meu olho me incomoda... o pastor quer cortar fora pedaços das pessoas: comeu? Corta o pau. Jogou bola ruim? Corta o pé. Roubou do povo? Recebe um milhão de votos e vai eleito. Minha poesia pede pra passear lá fora, peço pra ela fazer silêncio, que pode ser que apaguem as luzes, que pode ser que eles venham com seus cassetetes pra bater a granel, que pode ser que os picolés derretam, que pode ser que William bonner seja expulso por andar de minissaia expondo a bunda branca de vergonha do jornal nacional.



por lupeu lacerda

Da dor - por Ana Cecília S.Bastos



A dor é algo como se não fosse.
Derrapagem à beira do abismo
(aquele como se não estivesse).
Holofote sobre escura porção de sombras.
Eco à revelia do próprio eu
re-ver-be-ra-ção
por sobre o dia.
Fissura aberta minando,
ora esquecida ora sempre,
em alguma parte do corpo
como se fosse o todo.

Dasdô?
Na infância era uma prima
e seus olhos encovados.


Vegetalizar o poema - Hildeberto Barbosa Filho


Lendo os poemas de Everardo Norões, reunidos em Retábulo de Jerônimo Bosch, é impossível não pensar nas implicações semânticas deste título. Pintor holandês da transição do século XV para o século XVI, Bosch tematiza, por meio de cores fortes e de técnica libertária, os antagonismos entre céu e inferno, em meio aos quais o homem se debate desesperadamente contra seu inimigo eterno, transmutado em diversas figurações: animas, vegetais, monstros, duendes, seres fantásticos, enfim, toda uma grei que o cerca de terror e de espanto. Os paradoxos, as antíteses e os oxímoros, associados à plasticidade das metáforas, constituem, portanto, os recursos naturais de sua sintaxe pictórica.

A correspondência entre poesia e pintura não se dá, aqui, tão somente por esta ou aquela alusão que algum poema faça ao criador do “Jardim das delícias”, mas, sobretudo, porque a poética de Everardo Norões, desde Poemas (1999) e A rua do padre inglês (2006), assim como na obra em foco, deixa-se habitar pelos elementos da natureza. Em essência, os quatro elementos (ar, água, fogo e terra), como também seus derivados: frutas, bichos, objetos, paisagens, personas... Tudo, no entanto, submetido a um dinamismo metafórico e sinestésico que protagoniza, assim como em Bosch, os eternos conflitos da alma humana.

Sua poesia, por conseguinte, trai, de início, um compromisso frontal com o dizer, entenda-se o dizer como o conteúdo pensante e afetivo da mensagem, em que pesem, sempre na arquitetura de sua dicção, o logos do fazer,o sentido de depuração estilística e a consciência da linguagem. Seu lirismo, como bem percebeu Fábio Andrade, em breve ensaio que lhe dedicou na revista Crispim, número 2, “não é transbordamento sentimental do verso, mas, ao contrário, força de concentração e depuramento poético de todo excesso que traga facilidade no sentir”.

Nas sete partes do livro é este o princípio que rege as estratégias do discurso. Os treze primeiros poemas como que ensaiam um pequeno tratado da memória, um exercício de recordar, isto é, de trazer o mundo de volta ao coração como sugere Emil Staiger, nos seus Conceitos fundamentais da poética. Porém um recordar que dispensa o saudosismo romântico, que foge ao lugar-comum da “poesia-lágrima”, para injetar, no corpo da lembrança, o sal de um olhar cético, distanciado, aberto à presença de aspectos invisíveis e de ingredientes insuspeitados. O poema de abertura já define o modus operandi do poeta:

O canário
debulhava trinados.
Na rede
fluíam fábulas.
Sobre muros e telhados
os urubus empinavam
lições de trevas.
No alto,
apenas uma nuvem
me escutava.

Observe-se que o procedimento descritivo não é nada linear. Não há intenção realista na composição do quadro. O locus, que não é ameno, é descrito por sugestão, diria por desconstrução da tópica tradicional, o que, não diluindo a substância emotiva, essencial à fatura do poema, instiga o pensamento e a reflexão. Eis uma técnica que se repete e repercute nos outros textos e que, decerto, define a linguagem de um poeta. No poema número 3, cujo motivo é a cabra, as “estacas” se transformam, num belo e ousado exemplar metafórico, em “retas submetidas / à álgebra do cativeiro”, e a própria cabra, um desses bichos que reside na morada poética de Everardo Norões, “De longe, resplandece: // focinho de luz ondeante, // a deslumbrar entre galhos”.

Descrições estranhas de coisas conhecidas, o familiar se transformando no insólito, os objetos se apresentando de maneira criativa, a energia visual, olfativa, tátil, melódica, gustativa impregnando os seres, os âmbitos, os lugares, os climas, as atmosferas, tudo converge, nesta poesia singular, para a medida lírica concentrada, para a linguagem como item aglutinador de dispersos fragmentos, para a harmonização dos vocábulos, no plano geométrico da forma, face ao caos natural que rege o movimento da matéria. Veja-se, por exemplo, qualquer texto da segunda, terceira ou quarta partes. Quer me detenha no ludismo conceitual e imagético de poemas como “Goiaba”, “Pitanga”, “Buriti” e “Hortelão”, quer atente para a metalinguagem indireta e oblíqua de “Mancha” e “Euclides”, tudo nos leva ao brilho e ao império transfigurador da linguagem e à desautomatização do olhar. Leia-se o poema “Euclides”: “O fascínio do cacto. // A ponta do espinho. // A fulguração do tiro. // Vegetalizar o homem: // tudo tornar folha, // corroída // pelas minúsculas formigas // das letras”.

“Vegetalizar o homem”: considere-se a força metafórica deste verso. Diria que Everardo Norões intenta vegetalizar o poema, encharcando-o com os líquidos vitais da natureza orgânica. A propósito, fundir os reinos animal, vegetal e mineral não consistiria num eco poético de Bosch contaminando a pintura vocabular de Everardo? “Sob as palavras // tudo se transfigura: // a urze, a pedra, o horto.”, diz o poeta em “Mancha”. “Flamboyant”, por sua vez, assim termina:

sou
apenas a ferida
no alto de uma tarde
uma coroa de espinhos
no silêncio.

Em rápida entrevista, também publicada na Crispim, número 2, o poeta afirma que a poesia, para sobreviver, “tem que revelar todas as coisas que o olho comum não vê”, ou, à maneira de um Manoel de Barros, “precisa guardar o cheiro de nossos quintais”. Pois bem: a manufatura apurada, de teor erudito, urbano e cosmopolita, não deixa, contudo, de compactuar com as raízes telúricas, com os veios identitários do seu ethos cultural, com os mitos de origem, embora este pacto, na expressão poética deste cearense-pernambucano, não se feche, em momento algum, ao intercâmbio com outras geografias literárias, numa dialógica intertextual das mais ricas e variadas. Basta perceber a componente européia, árabe e africana que o autor aproveita na tessitura de tantos versos.

Para além de Bosch, que detecta o homem acuado sob garras de inimigos cruéis e monstruosos, aparecem, na lírica de Everardo Norões, outras vozes que sinalizam para a propositura do humano, para a perspectiva do poético, para a opção seminal da experiência artística, face à barbárie dos engodos materiais e tecnológicos que a razão, aquela razão a princípio humanística, depois instrumentalizada, não conseguiu evitar. Neste sentido, sua poesia, como toda autêntica poesia, é germe de resistência, é “técnica a serviço da emoção”, no feliz enunciado de Marco Lucchesi, em nota de orelha sobre A rua do padre inglês.

Lucchesi, aliás, o poeta Lucchesi, vê-se representado, neste Retábulo de Jerônimo Bosch, num dos seus mais belos poemas, “O coração do poeta”. Texto dramático em que o coro, a primeira e a segunda voz operam como que uma espécie de dissecação estético-visceral deste autor que, ao lado de nomes como Euclides, Faulkner, Ovídio Martins, Hafiz, Hemingway, Rimbaud, Santo Agostinho e Ovídio, entre outros, compõem o complexo de suas “afinidades eletivas”.

Lendo os poemas de Everardo Norões, revivo a experiência decisiva das epifanias poéticas, convicto de que, entre tantos fermentos da vida cultural, a poesia é indispensável, sobremaneira quando a poesia não teme o limite do verso, não abdica da origem metafórica e, em especial, não se compraz, a exemplo de tantos arrivistas das falsas formas, na lúdica mitografia da linguagem pela linguagem, no artifício vazio dos metabolismos experimentais, na pirotecnia tautológica do grafismo ou da página em branco.


Comarca das Pedras, maio de 2008.

Foi o fim do mundo no Crato - José do Vale Pinheiro Feitosa



Assis Valente, compositor, nascido em Senhor do Bomfim, na Bahia, um dos preferidos de Carmem Miranda, participou do tema com um samba de primeira: "Anunciaram e garantiram que o mundo ia se acabar. Por causa disso a minha gente lá de cada começou a rezar. E até disseram que o sol ia nascer antes da madrugada."

Como sabemos, Senhor do Bomfim tem tudo a vê com o Crato. Eqüidistante de qualquer capital nordestina, é o Crato o epicentro da região. Especialmente no miolo da praça, pois lá fica o centro do Universo. Nada escapa, qualquer acontecimento é onisciente. Desde uma fagulha que acende o falso sinistro da mercadoria para roubar do seguro até um sobrenome mundialmente famoso que tem parentes na cidade. Por isso mesmo que é natural se dizer: "só no Crato" ou mais ainda "nem no Crato". Mas um dia aconteceu.

Foi um dia qualquer. Clima ameno, sol claro, capaz de iluminar até pensamento escondido; estudantes na escola, trabalhadores no trabalho; os do escritório e os outros do balcão; a limpeza urbana e os da saúde curando doença. Tudo normal. A vida de sempre, entre uma calçada e outra, no labirinto das ruas; respirando nas praças; o "pelo sinal" na frente das igrejas; susto dos juros alto na porta dos bancos; as sementes para o plantio, tudo andando como sempre andava.

Se tudo andava, era o mesmo de sempre, quem haveria de suspeitar que o fim estaria próximo. Ninguém, menos ainda o adolescente com tanta paixão que é capaz de morrer por ela; o velho que lamenta a vida para espantar a morte; o perdedor que denuncia a quebra das regras ou o penitente que espia com olhos nos pecados futuros.

O professor Edmilson da geografia da Universidade Regional do Cariri acabava de chegar em sala de aula, era a 14ª hora daquele dia. Em tais horas, ao sair-se de dentro do ar condicionado dos automóveis no ambiente quente, os óculos se umedecem e por isso o professor os retirou para limpar-lhes os vidros. Os alunos na modorra pós prandial, de olhos cansados, esperavam o professor concluir a tarefa. Bosquinho atendia os últimos fregueses do almoço, por trás do balcão de seu box no mercado. Muita gente estava no embalo que costuma realizar os sonhos das sestas medianas. Os cratenses, como Sodoma, viviam na paz dos seus espíritos.

Os passarinhos estavam silenciosos devido ao clima daquela hora. Nenhum urubu enfeitava a vasta toalha do céu azul. Raros carros voltavam do almoço para o trabalho e alguns alunos atrasados suavam até chegar ao templo do saber. Todo o clero realizava a sesta, os comerciantes se recostavam nos balcões com a preguiça da baixa contagem de freguesia. Os bancários fechavam os balanços das operações, os motoristas de praça até esqueceram as histórias vantajosas e sob a copa das árvores, entre cochilos e pensamentos enevoados, aguardavam uma corrida ao menos "para fazer um chá".

Quer dizer a cidade estava despreocupada. Nada poderia tirar-lhe o sossego. Apenas era um morno silêncio dorminhoco. Quem trabalhava ou realizava alguma tarefa ou eram os restos que sobraram da manhã ou o começo lento do que viria pela tarde. Era tudo tão igual que nada poderia ser acrescentado, nem a última notícia da televisão ou mesmo a abertura do Vídeo Show tinha algo que não fosse o mesmo de sempre. Apenas esta narrativa monotemática.

E aí?

Nem suspeitem. Num segundo, antes que o professor Edmilson desse o último toque no enxugar das lentes dos seus óculos, que Bosquinho ensaboasse o último prato, o padre pigarreasse o seu ronco, aconteceu.

Nossos olhos piscaram e ao final os óculos do professor Edmilson já se espatifavam na lajota da sala de aulas. Bosquinho, de olhos arregalados, se agarrando às bordas do prato feito a última materialidade da vida. O padre mais ofegante pelo chamamento de Deus que pela apnéia do sono. Gente se abrigando do perigo por toda cidade. A cachorrada vadia, feito um gás se expandia em todas as direções, em seus latidos loucos e desesperados. Jumentos murchavam as orelhas em amplo sinal do inevitável. As verdureiras do mercado viraram seus balaios, esparramando mercadoria ao redor. Reações divergentes: quem dormitava encostado nos balcões tanto se soltara dos braços que apoiavam seus queixos, tendendo a arriar a cabeça, quanto se empertigaram de tal forma em sinal de alerta, com tanto vigor, que o fruto só poderia ser um torcicolo.

A lista do mundo se acabando, ao contrário deste, continuaria por muito mais. Ninguém ficou indiferente no Crato. As rolinhas voaram do ninho, os gatos faiscaram seus olhos desde os monturos em que se escondiam. Os ratos cruzaram a praça da Sé, as pessoas que estavam na praça ou correram para qualquer rumo ou ficaram congeladas de pavor. Vicelmo que descansava na rede após o noticiário do meio dia, levantou a cabeça acima da varanda, se lamentando por não ter mais tempo para alardear aquele fim de mundo. Perdia a reportagem, mas não o vício de querer sua manchete. Literalmente o Crato se acabou. Como alguém de lá certamente diria: só outro Crato. A mais dolorosa conclusão de que nada mais tinha jeito mesmo.

Mas sobre ruínas, embaixo do sufoco dos destroços, das lágrimas das perdas, dos gritos do fim, certamente que a curiosidade da cidade jamais se apagaria. Terminada aquela cena dos dois últimos parágrafos o que se ouvia:

- Qui diacho foi isto?

- É a guerra mundial. O estouro da bomba atômica.

- Não, foi o terremoto que destruiu tudo. Estamos todos mortos, naquela fase em que os espíritos ainda não concluíram que passaram para o outro mundo.

- Qui nada isso é a Pedra da Batateira que veio abaixo. Agora vem a água inundar tudo.

- Isso é maldade dos Americanos, são eles atacando o Brasil para os russos não pegarem nós para eles.

- São os pecadores. Estes meninos fumando maconha, os pais de família indo ao cabaré, as mulheres andando com a bunda prá fora. Isso é castigo do céu.

Mais um tempo e começaram a se preocupar com os parentes e amigos. O quê acontecera com eles? Do quê teriam sido vítimas? Onde estariam?

Daí concluíram que estavam ainda vivos e que o estrondo que viera do céu não provocara nenhum estrago material. A não ser os óculos do professor Edmilson. Tudo mais estava o mesmo. Quer dizer, a exceção do cérebro fervilhando de pavor e o coração galopando de ladeira abaixo, nada com seus corpos acontecera. O epicentro do fim do mundo teria sido bem aqui, bem junto ao peito e no centro do medo em suas cabeças. Sobras do fim do mundo foram em busca dos amigos e dos pontos de encontro para entenderem o que lhes havia acontecido.

Ali pelas quatro horas, após passar na ótica e por lá se demorar entre a encomenda e a troca de experiência com os comerciantes, o professor Edmilson foi para o box do Bosquinho, pois, certamente, lá se condensariam os vapores daquele incerto acontecimento.

As teorias foram tantas que somente pela vontade de um novo Diderot, quem sabe fosse este o médico José Flávio Pinheiro Vieira, em uma nova Enciclopédia, poderia catalogar o volume imenso do conhecimento recolhido. Bosquinho vendeu muito caldo, mas quase atrapalhava o próprio negócio pois sempre esteve no centro das inúmeras rodas que se formaram. Teve explicação para cada momento, cada ato, cada um com sua sentença. Ali pelas cinco e meia da tarde, chegou a notícia que uma senhora do sítio Currais morrera do coração perante os céus em explosão.

Naquela noite os sonhos foram revolutos. As infiltrações dos pesadelos foram muitas e variadas. Crianças tiveram que ser acalentadas pelos pais. Casais dormiram agarradinhos pelo sinal do renascimento. O Crato se acabara, mas, em um segundo, renascera novamente. Todos satisfeitos por serem redivivos.

Alguns dias após, através de colchas de retalho da mídia, afinal tudo se explicara.

Quem provocara o desastre no Crato fora o Presidente Miterrand da França.

O quê?

Você tem toda a razão de estranhar.

O Concorde dele, entre Brasília e a Venezuela, rompeu a barreira do som sobre o Crato e a cidade se acabou.

Foi o fim do mundo no Crato.



José do Vale Pinheiro Feitosa

Maysa interpreta Chão de Estrelas

São Brás - O Santo do dia !





Oração a São Brás


- Protetor das doenças da garganta - (3 de fevereiro)
Ó glorioso São Brás, que restituístes com uma breve oração a perfeita saúde a um menino que, por uma espinha de peixe atravessada na garganta, estava prestes a expiar, obtende para nós todos a graça de experimentarmos a eficácia do vosso patrocínio em todos os males da garganta.
Conservai a nossa garganta sã e perfeita para que possamos falar corretamente e assim proclamar e cantar os louvores de Deus.
A bênção de São Brás: “Por intercessão de São Brás, Bispo e Mártir, livre-te Deus do mal da garganta e de qualquer outra doença. Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Amém”.

Mulher - Silvio Caldas

Sílvio Caldas - Geraldo Freire




Sílvio Antônio Narciso de Figueiredo Caldas nasceu em 1908, no bairro de São Cristóvão, no Rio de Janeiro, numa família grande e musical.

O pai, Antônio Narciso Caldas, possuía uma pequena loja de instrumentos, consertava e afinava pianos e era compositor (Orlando Silva chegou a gravar uma valsa sua, "Neusa", em 1938). A mãe, a avó e as tias cantavam no coro da igreja, nas festas e quermesses. Um dos seus quinze irmãos, Murilo Caldas, três anos mais velho, também se tornaria cantor, obtendo certo prestígio nos anos 30.

Sílvio Caldas cresceu ouvindo música e cantando em festas familiares e escolares. Sua primeira apresentação ocorreu aos seis anos de idade, numa conferência no Teatro Fênix. À época, ele já integrava um bloco carnavalesco chamado Família Ideal.

Parte da infância e a adolescência de Sílvio se dividiram entre as diversões e alguns serviços. Seus pais lutavam com dificuldades pela sobrevivência da família, e ele começou a trabalhar cedo – aos nove anos, como auxiliar de mecânico. Depois, exerceu uma série de atividades.

Em São Paulo, para onde foi tentar a sorte aos dezesseis anos, foi lavador de automóveis e mecânico em diversas oficinas. Chegou a trabalhar até na rodovia Rio-São Paulo, como motorista e cozinheiro. E a ser leiteiro, depois, no estado do Rio. Entre um serviço e outro, cantava e fazia boemia.

O cantor Sílvio Caldas foi o maior responsável pela consolidação da seresta na música popular brasileira, tendo contribuído para o gênero também como compositor, nos anos 30. Por isso, ele se tornou identificado como "O Seresteiro do Brasil", epíteto ao qual se manteve fiel durante toda a sua longa carreira.

Como grande seresteiro, Sílvio Caldas cantou muitas valsas. Mas também se mostrou, igualmente, um excepcional intérprete de sambas. Nesse campo, suas interpretações marcadamente cadenciadas fizeram do seu um canto inconfundível entre os outros de seu tempo e de todos os tempos no país. A essa notável e irresistível cadência, se somaram a clareza e o apuro na emissão da voz, para caracterizar um estilo aperfeiçoado, de reconhecida brasilidade. Por tudo isso, ele acabou sendo chamado de "O Poeta da Voz" por Guilherme de Almeida (autor de uma obra poética de notável musicalidade na poesia brasileira do século 20).

Embora amoroso, o lirismo de Sílvio Caldas recusava um romantismo excessivamente derramado. Singelo, sua simplicidade estava de par com um zelo técnico. Autêntico, nem por isso se prendeu ao repertório de um único período ou de um único gênero.

Felix Mendelssohn- compositor e regente dee orquestra alemão.





3 de fevereiro de 1809, Hamburgo (Alemanha)
4 de novembro de 1847, Leipzig (Alemanha)


Felix Mendelssohn-Bartholdy foi neto do filósofo Moses Mendelssohn e pertencia a uma família de ricos banqueiros judeus, convertidos ao cristianismo. Recebeu educação esmerada. Além de piano e composição, estudou literatura e arte, dominando a expressão literária com a mesma facilidade com que dominou a música. Estudou em Berlim (1811), depois em Paris. Em 1821 esteve em Weimar, tocando na presença de Goethe.

Mendelssohn começou a dar concertos aos nove anos de idade. Alcançou grande popularidade como compositor e regente. Esteve várias vezes no Reino Unido e viajou pela Alemanha, Áustria, Itália e Suíça. Em 1835 assumiu a direção da famosa orquestra do Gewandhaus, em Leipzig, e fundou, em 1843, o conservatório da cidade, onde ele e Schumann ensinaram composição.

Mendelssohn é um compositor eclético, embora de linguagem muito pessoal. Inspirado por sentimentos românticos, ele criou obras de alta qualidade formal, fiel ao classicismo vienense.

Seu Concerto para piano e orquestra nº 1, em sol menor, composto quando Mendelssohn tinha 17 anos, é obra tecnicamente difícil, mas já de valor. Nessa mesma época, compõe sua primeira obra-prima, a brilhante Abertura para Sonho de uma noite de verão, obra rica em efeitos atmosféricos e com melodias de um lirismo fascinante.

Entre as obras mais conhecidas de Mendelssohn encontram-se as várias coleções para piano das Canções sem palavras. São pequenas peças melodiosas, sentimentais ou espirituosas.


Elegância musical
Em 1829 Mendelssohn afirma-se como regente, revivendo a então esquecida Paixão segundo são Mateus, de Bach, em Berlim. No mesmo ano visita o Reino Unido. Um verão na Escócia o inspira a compor a abertura As Hébridas, também denominada A Caverna de Fingal.

Sua obra-prima da maturidade é o Concerto para violino e orquestra em mi menor, opus 64, de 1845, o mais melodioso e brilhante concerto violinístico.

Como regente Mendelssohn teve o imenso mérito de ressuscitar Bach e criou o repertório dos concertos sinfônicos de hoje, com base nas obras de Haydn, Mozart e Beethoven.

Das sinfonias de Mendelssohn é importante citar também a nº 5, Sinfonia da reforma, e sobretudo a Sinfonia italiana, de 1833.

A obra de Mendelssohn, banida da Alemanha pelo nazismo, sobreviveu à hostilidade anti-semita. Suas composições, vivas e harmoniosas, foram incorporadas ao repertório internacional como representação máxima da elegância musical do século 19.

Nem romântico nem clássico, Mendelssohn seria mais apropriadamente definido como uma espécie de parnasiano avant la lettre. Sua obra combina a ortodoxia clássica e o colorido romântico.


Enciclopédia Mirador Internacional

Luiz Peixoto - por Norma Hauer

Ele nasceu no dia 2 de fevereiro de 1889 em Niterói, recebendo o nome de Luiz Carlos Peixoto de Castro. Ficou conhecido como LUIZ PEIXOTO.

Dentro da arte de seu tempo, Luiz Peixoto foi completo: caricaturista, teatrólogo, diretor de teatro, poeta, pintor escultor, letrista de nossa música ´popular...

Como caricaturista trabalhou nos órgãos mais importante de sua época, como “O Malho”; “Revista da Semana”, “Fon-Fon”...e mais tarde no Jornal do Brasil.

Também montou cenários no Theatro Municipal e eram suas as alegorias da avenida feitas para os desfiles carnavalescos.

Era uma personalidade eclética.

Nem todos sabem, mas todos conhecemos a valsa “Lua Branca” de Chiquinha Gonzaga, Foi exatamente Luiz Peixoto quem colocou a letra permitindo a cantores e não apenas instrumentistas executarem tão famosa composição.

Quem disse que “numa casa de caboclo, um é pouco, dois é bom, três é demais?.Foi exatamente Luiz Peixoto, pela voz de Gastão Formenti., assim como descreveu uma casa na colina e a sempre lembrada “Ai, Ioiô, eu nasci p’ra sofrer ou Linda Flor... Essa música de Henrique Vogler recebeu duas letras diferentes. Uma foi de Luiz Peixoto. A primeira gravação foi na voz de Aracy Cortes.

Com o compositor Ary Barroso, Luiz Peixoto compôs “Na Batucada da Vida”,”Por Causa desta Cabocla” e a sempre recordada “Maria, o teu nome principia nas palmas da minha mão...

Quando Carmen Miranda,depois de uma temporada nos Estados Unidos, aqui esteve em 1940,não foi bem recebida no rádio nem no Cassino da Urca porque diziam que voltara “americanizada”...

Foi então que, com Vicente Paiva Luiz Peixoto compôs

“Disseram que eu voltei americanizada,
Com o burro do dinheiro
Que estou muito rica”...

Parece que, de fato, ela voltou “americanizada, tanto que retornou aos Estados Unidos, onde morreu em 1955.

Luiz Peixoto também fez parte do “cast” do Cassino da Urca, nos anos 30 e 40, até 1946, quando os cassinos foram fechados.

Luiz Peixoto faleceu em 14 de novembro de 1973, aos 84 anos.
Norma Hauer

Retorno


Hoje quando voltava para casa, depois de mais um dia de trabalho e calor e sonhos, senti que era a hora de mostrar-me agora novamente no Crato do Ceará. Nos últimos dois meses foi pura assimilação de retorno, malas e o que colocar dentro delas.
Um retorno à terra do calor, de sentidos de exatidão e paixão.
Nestas duas semanas que estou aqui muita coisa aconteceu. As melhores são as pessoas que revi e conheci. Sem falar no trabalho. É uma dádiva estar restaurando peças do Museu do Crato junto com Gabriella, peças de mais de duzentos anos. É inimaginável estar fazendo parte da história do Crato, assim de uma hora para outra.
Nossos suores estarão para sempre, nesta cidade, nossos amores e desamores, coisas que carregam os homens de sentimentos, que doam-se de corpo e alma. Doar-se pela história cultural e social de um povo não é fácil. É um árduo caminho que nos leva a muitas incompreensões e glórias. Mas não importa as glórias e nem os que acham que nada sabemos. Sabemos do olhar de cada um, dos sorrisos, dos braços abertos de boas vindas, dos que daqui já saíram e voltaram e saíram e voltaram novamente, trazendo na bagagem apenas esperança de um mundo novo, não de um Crato novo, mas de ideiais justos, sabedoria nas derrotas e engrandecimento das vitórias. Não um engrandecimento de egos, mas de personalidade, de integridade e principalmente humanismo, no saber cair e levantar-se quantas vezes for preciso. E quantas vezes for preciso gritar e calar-se. Ir e voltar. E amar, sempre amar.
Por tudo que lutamos é porque amamos, por tudo que criticamos é por amor e por tudo que calamos é porque amamos. E vivemos intensamente porque amamos.

Então volto ao Crato com todo amor que me é possível ter, para doar-me de corpo e alma aquilo que amo: os outros. Pois bastam-nos uns aos outros para um mundo de paz, sabedoria e crescimento.

Mais uma vez agradeço a Socorro por seus braços abertos de boas vindas, e o prazer de conhecer Claude com sua alegre espontaneidade, esse seu riso contagiante, obrigado.