Criadores & Criaturas



"Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
"

(Carlos Drummond de Andrade)

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... Por do Sol em Serra Verde ...
Colaboração:Claude Bloc


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domingo, 8 de novembro de 2009

Antonio Nássara - Por Norma Hauer



ALÁ-LÁ-Ô - ANTÔNIO NÁSSARA- UM VITORIOSO

Foi no dia 11 de novembro de 1910 que ele nasceu aqui no Rio de Janeiro.
Já em 1927, aos 17 anos começou a fazer as primeiras caricaturas no jornal "O Globo". Pouco depois ingressou na Escola dae Belas Artes, ao mesmo tempo que começou a dedicar-se à composição.
Em 1930 compôs os sambas "Saldo a Meu Favor" e "Para o Samba Entrar no Céu",que não obtiveram êxitos, mas abrilharam-as portas para ingressar no meio musical.

Ja em 1932 gravou,com Francisco Alves seu primeiro sucesso:"Tipo 7" e, no ano seguinte outro grande sucesso,até hoje relembrado no carnaval:"Formosa",gravação original da dupla Mário Reis e Francisco Alves.

Daí vieram "A Barba Cresceu";"A Lenda do Pastor";"A Menina Presidência";"A Mulher deve Casar"; Adeus Aracy"; Barba Azul"... o primeiro grande sucesso de Dircinha Batista:"Meu Periquitinho Verde". Muito Nássara cooperou para o carnaval,até que,em 1941,lançou uma valsa ("Nós Queremos Uma Valsa") e o sucesso eterno "Alá-lá-ô". Ambos gravados por Carlos Galhardo.
Quando,com Frazão,ele compôs "Nós Queremos Uma Valsa",perguntou a Carlos Galhardo se ele gravaria uma valsa para o carnaval.Ele aceitou e a valsa "estourou".Sabe-se que o Rei Momo adorou a valsa porque nesse ano, varizes o atrapalhavam e era melhor dançar valsa do que samba.

Sem o obetivo de compor para o carnaval, Nássara, que era locutor do Programa Casé, na Rádio Philips, foi convidado por Adhemar Casé para fazer um anúncio para uma padaria na Rua Voluntários da Pátria.Isso porque, a partir de 1932, um decreto do então Presidente Vargas autorizou as emissoras então existentes a transmitir propaganda comercial. Não era mais possível manter uma rádio só com colaboração de seus associados.
Surgiu, dessa forma, o primeiro “jingle” no rádio, que, para agradar ao português, dono da padaria, foi composto em ritmo de fado.

Ele adorou!
Os versos eram assim:

“Oh, padeiro desta rua
Tenha sempre na lembrança.
Não me traga outro pão
Que não seja o pão Bragança".


Quem o apresentava o "jingle" era o cantor Jorge Fernandes.
A partir daí, anúncios variados foram se propagando no rádio, principalmente no então vitorioso Programa Casé.
Os anúncios eram permitiudos, mas nem tudo podia ser anunciado. Certa vez,sem perceber do que se tratava, Casé aceitou uma propaganda de um laxante de um laboratório paulista. Anúncio de laxante era proibido.E mais uma vez, Casé recorreu a Nássara.Este, então, “bolou” o seguinte texto:
“Um casal de noivos brigou. Ele, arrependido, resolveu fazer as pazes, mas a moça estava irredutível. Conversou com a futura sogra, que o aconselhou que presenteasse a filha com algo de valor. Comprou-lhe, então, uma jóia caríssima. E não fez efeito. Deu-lhe um casaco de peles. Mas não fez efeito. Então, lembrou de dar a ela um vidro de Manon Purgativo...Ahhh! Fez efeito!!! Manon Purgativo, à venda em todas as farmácias e drogarias.”
O anúncio foi ao ar sem qualquer problema, mostrando a habilidade de Nássara e Casé e a mentalidade sempre retrógrada dos responsáveis pela censura.

Nássara, deixando de compor devido aos novos rumos tomados por nossa música, nunca deixou de fazer caricaturas, sempre bem humorísticas.

Já em 1985, na Sala Sidney Müller da Funarte, Nássara foi homenageado com um "show"dirigido por Ricardo Cravo Albin, que recebeu o nome de "Alá-lá-ô", no qual foram relembrados seus sucessos carnavalescos. Carlos Galhardo, Marília Barbosa e o grupo "Nó Em Pingo Dágua" foram os artistas que deram vida ao "show". Foram duas semanas com a sala sempre cheia.

Antonio Gabriel Nássara faleceu em 11 de dezembro de 1996, um mês depois de completar 86 anos. primeira


norma hauer

O Chevette vermelho do meu pai - por Socorro Moreira- (para o meu irmão Alfredo Moreira Neto)


Em 1974 meu pai trocou o carro por um chevette zero. Como não tinha dinheiro pra comprar carro zero todo ano , tinha pelo tal , o maior cuidado. Horas por dia passava polindo a pintura , sem deixar que nela ficasse, sequer uma manchinha. Dormia coberto , e não saia em dias de chuva. Era um brilho só ! Em 1975, transformou o modelo, e o carro não saiu do zero., e assim fez por mais alguns anos... Até 1987 , quando faleceu. Não sei se por zelo ou mania, o carro era tratado com a maior frescura do mundo.
Um dia ele saiu numa sexta-feira , e não voltou por dois dias. A casa ficou triste e preocupada. Minha mãe já pressentindo o destino do sumido, só rezava. Ela trabalhava numa instituição educacional , nas imediações do "gesso". Na segunda-feira estava a caminho da escola, quando avistou o carro do meu pai, em frente a uma daquelas casas , que se diziam "suspeitas". Não quis conversa. Caladinha, pegou em casa a cópia da chave , arranjou um motorista , escondeu numa garagem amiga, e esperou os acontecimentos.
Chega meu pai , desesperado ... Roubaram meu carro ! Perdi o carro !
Compadecida com a tristeza do marido , ela abre o jogo : seu carro tá guardado. Por que fiz isso? Achou que eu pudesse deixar ao relento um carro, do qual tem tantos ciúmes? E se chovesse? E se o sol do meio dia estralasse a pintura ou desbotasse o vermelho ?A gente casou ou não casou no católico e no civil? Pois então... Eu zelo por tudo que é seu !
A Valda é quase uma santa, mas ninguém consegue enganá-la. Claro que ela perdoava, porque sabia-se amada. Os homens do tempo do meu pai não eram castos, nem irresponsáveis... Faziam porque eram "machos" ! No fundo, no fundo, só amavam as nossas mães , e costumavam pecar, sem deixá-las !
Era pra valer, o "até que a morte nos separe." Foi assim com os meus pais, e não tenho dúvidas do quanto foram felizes, e de que tenham mesmo nascido um para o outro. Minha mãe , filha de Maria; meu pai, boémio inveterado.
No final da vida, completamente convertido e redimido, Moreirinha viajou primeiro pra construir uma morada eterna . Aposto que nessa morada tem um chevette vermelho na garagem.
socorro moreira

Efeito do Ócio

A loucura abriu a porta
em noite quente de lua
(não olhei pra cima)
talvez ainda cheia
ou bem fininha.

A loucura veste-se
com pele de embuá colorida.

Ai do poeta
que não olhou pra cima
não sabe se a lua engordou
ou faz regime.

Minha barba rala.
Meus dedos barulhentos.
Meus olhos que vivem caindo
sobre as sandálias japonesas.

Digam adeus poeta
que já me encheste o saco

e eu digo:
castrem-me.

O dente-de-leão

Filho de um pintor,
seu maior desejo era tornar-se músico, maestro.
Mas teve que estudar filosofia para ser professor e ganhar a vida.
Um dia, deitou-se no campo, perto da linha Maginot,
linha de fortificações edificada nos anos 30,
na fronteira da França com a Alemanha.
Queria apenas contemplar a natureza.
Mas, de repente, viu-se fascinado
ao observar uma flor estranha, uma flor-estrela,
o dente-de-leão,
que os franceses chamam pissenlit.
A forma complexa da taraxacum officinale
levou-o a refletir sobre a reprodução sistemática de certas estruturas.
Logo depois, viria ao Brasil,
onde manteve contato com algumas tribos indígenas:
Bororós, Caduveos, Nambikwaras.
Registou tudo:
desenhos corporais, falas, mitos, músicas, culinária,
estruturas de parentescos...
Tornou-se um dos homens mais conhecidos do século XX.
Suas idéias invadiram quase todas as áreas do saber.
Deixou-nos há poucos dias,
com 100 anos de idade.
O rapaz do dente-de-leão era
Claude Levy-Strauss.
___

O carro de Pedro Maia - por Socorro Moreira


Hoje passei o dia no Juazeiro. Festa de aniversário com direito a todas as alegrias. Caio meu ficou mais velho. Tá virando um Senhor, e eu nem quero pensar muito nisso.
O fato é que no caminho lembrei as histórias de Carlos Esmeraldo, curti o companheiro sorriso de Magali, e pulei de trampolim para algumas das minhas lembranças. A primeira delas me fez voltar à infância. Não tínhamos transporte próprio, e usávamos os carros de aluguel, esporadicamente. Embora na praça já estivessem á disposição aero wills, fuscas, minha mãe só chamava, o Pedro Maia. O carro era lindíssimo para quem gosta de antiguidades, mas pra gente naquela idade era um carro caindo aos pedaços. O Pedro Maia por ser primo do meu pai, ganhava a simpatia da minha mãe, que nos dizia: “besteira... não quero que vocês se criem com respeito humano (nunca entendi... ou entendi?). Ela queria nos dizer , que a gente tinha que ter personalidade, e encarar as coisas sem nos preocupar com o que o mundo todo pensava ou fazia. Não deveríamos ter vergonha de fazer coisas lícitas, simples... Bom, eu e as minhas irmãs morríamos de vergonha de passear no tal carro. Um dia fomos esperar meu pai no aeroporto, vindo da Capital Federal (já era Brasília!), todo prosa, até de palito, tal e qual a situação sugeria. No caminho até chegar lá, por onde passávamos os meninos jogavam pedrinhas, e xingavam o carro velho. Nos acocorávamos pra que ninguém nos vissem. Quando meu pai chegou , olhou pra minha mãe com um riso de troça , e perguntou-lhe : Valda , e não tinha um carro mais novo”?
Bem feito pra Dona Valda... Ficou sem resposta.
Hoje eu daria tudo pra voltar àquele exato instante. Não só curtiria o carro daquela pessoa tão especial e amiga, como agradeceria à minha mãe a providencial escolha.
A gente precisa crescer para entender o valor de certas coisas!
Como fui idiota...!
E graças à minha mãe, eu hoje desfilo com uma sandália de griffe com a mesma naturalidade com que uso um chinelo de borracha... Aprendi !
socorro moreira

Pérolas nos bastidores ... - por Cariricaturas -(foto de Samuel Aráujo Gregório)


Liduina Belchior disse...

As asas da borboleta estão abertas em seu ângulo máximo.
Preciso abrir meus braços bem esticados assim e pronunciar:
LIBERDADE!!!!!

heladio disse...

Uma deslumbrante borboleta
paira sob uma bela flôr,
ávida por seu sustento.
Enquanto nós humanos,

contemplamos atoleimados,
buscando inspirações,
nunca comparáveis,
a tão simples
ocorrência da natureza.

Vera Barbosa disse...

libéluas

voos

cir
cu
la
res

p
e
r
p
e
n
d
i
c
u
l
a
r
e
s

d e s e j o s

Um pedaço apenas de chocolate - Por Rosa Guerrera


Abrí hoje um caderno onde por muito tempo arquivei pensamentos. E o poeta Carlos Pena Filho me caiu ás mãos, no pedido mais lindo em todo o seu azul de espera , chopes, amor, vida e morte. Dizia ele que , gostaria muito : “ que no dia da sua morte, alguém sentasse num banco de jardim e comesse calmamente um chocolate’. Com que serenidade esse homem esperava o passo final de todos os homens ! Como seria bom se soubessemos nos mais tristes e amargos momentos do destino, comer um pedaço de chocolate num banco de jardim! Quem sabe assim não encarássemos com um olhar mais doce os revezes do destino ! Vivemos tão avidamente o dia a dia , esquecemos tanto a poesia, dificultamos tanto nossos relacionamentos que os amores acontecem , vivem e morrem sem que tenhamos um minuto dedicado aos seus verdadeiros valores. E a medida que vamos correndo em busca de alguma coisa que muitas vezes nem sabemos o seu perfil, o tempo , esse eterno clandestino , vai se infiltrando nos nossos dias e nas nossas noites , e quando despertamos para a realidade , é que compreendemos que construímos com as nossas próprias mãos o vazio ou a espera. E tudo isso porque não sabemos saborear um chocolate num banco de jardim... Hoje analisando mais uma vez esse grande poeta , ou até talvez motivada por essa sábia frase, eu vou sair por aí ... caminhando sem identidade , sem mágoas, sem olhar nuvens cinzas no céu da minha vida . E como uma forasteira dentro da minha cidade . vou procurar um banco de praça , e comer também calmamente um pedaço de chocolate. Quem sabe assim eu não consiga alcançar o azul de Carlos Pena e entender finalmente que a felicidade bem que pode ser encontrada nas coisas mais simples da vida . Talvez até nesse pedaço de chocolate que resolvi saborear hoje nesse banco de praça , onde tantas vezes passei sem prestar atenção ao seu convite . Quem sabe !

por rosa guerrera

Abstêmio

Antes de saborear o frango assado
com uma belíssima taça suco de uva

sento-me na cadeira giratória
imagino um poema da infância

onde o musgo mais verde
onde as formigas aos encontrões
trocavam impressões sobre o quintal vizinho.

Meus pulmões tão limpos, bem.
O coração sempre batendo tambor.

Levanto-me agora:
a saliva prende-se no canto da boca.

Engulo.

Nuvens Alaranjadas

Preciso da candura infantil
senão viro bicho.

Saio por aí com olhos vermelhos
presas pontiagudas
garras afiadas.

Por demais enfadonho
canibal dos próprios sentimentos.

Morder o pescoço.
Sorver o mesmo sangue.

Esperar o amanhecer:
enfiar a estaca no peito,
descansar da vida.

Bom dia !