Criadores & Criaturas



"Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
"

(Carlos Drummond de Andrade)

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... Por do Sol em Serra Verde ...
Colaboração:Claude Bloc


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quinta-feira, 23 de junho de 2011

A carga tributária brasileira - José do Vale Pinheiro Feitosa

Peço desculpa ao Armando por insistir no assunto e pondero que apenas estou fazendo uma postagem e não nos comentários como ele fez por que a postagem original já está muito antiga dada a grande atividade do blog. Este assunto é fundamental. A carga tributária e os serviços prestados à população. Além de outras atividades como fomento e criação de infraestruturas para instalação de capacidade produtiva. A tendência do Estado é que se avalie a eficiência de todas as políticas.
O Armando Rafael contestou o que escrevi não como idéia, mas como confronto de dados. Inclusive apresentou uma série de exemplos emblemáticos de situações precárias na manutenção de estradas, saúde e educação. E aí temos que considerar dois fatores: a) há uma inércia na classe média tradicional ao procurar sempre suas próprias soluções, independente do Estado, através do desembolso próprio em serviços privados e b) há sub-financiamento em diversas atividades estatais.
O Armando não abordou o que falei sobre a carga tributárias através de impostos indiretos pois aí é que se encontra o espírito do meu texto: os ricos não pagam o que deveriam em impostos. Aliás o meu texto tem por base pesquisa comparativa mundial. A qualidade de quem paga e como deve ser pago o imposto é a discussão, não a repetição de que a carga é muito alta. Aliás até aconselho que se leia o Delfim Neto sobre o mesmo assunto, embora partindo da idéia que a carga tributária é alta no conjunto do PIB.
Aí reside o argumento da Folha de São Paulo, do Estado de São Paulo, do Globo e, claro, da Veja e do Afif. Toma-se a carga tributária como um todo e não a questão de quem deve pagar mais e quem deve pagar menos. Mas é bom que se veja a que números da Folha de São Paulo está falando. Leia a tabela abaixo:
Carga Tributaria Mundial
Pais
%
País
%
País
%
Suécia
51,1
Brasil
38,1
Portugal
34,5
Dinamarca
50,6
Polônia
37,9
Grécia
33,7
Finlândia
46,2
Rep.Checa
37,4
Turquia
32,1
França
46,0
Canadá
37,4
Irlanda
31,9
Bélgica
45,4
Hungria
37,0
Holanda
31,7
Áustria
44,3
Reino Unido
36,6
Austrália
29,9
Itália
43,0
Islândia
35,4
EUA
29,0
Luxemburgo
42,1
N. Zelândia
35,1
Japão
27,6
Noruega
41,8
Espanha
35,1
Coréia Sul
23,9
Alemanha
40,1
Suíça
35,1
México
16,5
FONTE: Forbes Global / OCDE e Recita Federal ( Brasil)
*Carga medida s/ PIB

A origem das fogueiras de São João


       A história de São João, da maneira a qual é contada oralmente no interior do Brasil, é algo distinta daquela com que é conhecida nas cidades.
       Muita gente crê que a fogueira e os fogos de São João deve-se à uma promessa feita pela prima de Maria, Isabel, que mesmo depois dos sessenta anos de idade ficou grávida de um filho, que viria a ser João Batista. As duas primas moravam distantes, porém Isabel morava no alto de um espigão. Isabel prometeu à Maria que, tão logo desse a luz, acenderia uma grande fogueira e soltaria fogos de artifício; dessa maneira, Maria ficaria sabendo da boa nova. Maria não podia ir visitar a prima por ela também estar grávida e a caminhada era bastante dura.
       A outra lenda sobre João Batista dizia que João, ainda menino, era um santo muito folgazão, daqueles que exalam alegria todo o tempo. E a coisa que ele mais gostava eram as festas.
       No céu, conta-se, que todos os santos comemoravam seus aniversários com festas. Havia uma festa para cada um deles. E foi então João reclamar a com Deus. Se todos os outros santos tinham suas festas, ele também queria uma para si. E Deus, na sua infinita bondade, prometeu-lhe uma. E disse-lhe Deus que sua festa seria a mais bonita. João ficou muito feliz com a nova, que saiu correndo pelo céu, fazendo algazarras, contente da vida, chamando a atenção de todos os outros santos para si.
       Ele, na sua euforia, espalhou para todos que pudessem ouvir que , finalmente teria sua festa, e que ela seria a mais bonita de todos os santos. João dizia a todo mundo que na sua festa faria uma fogueira muito grande, fogueira esta que seria vista pelo mundo todo, que ela seria tão grande que quase poria fogo no mundo. Na sua festa, dizia João, ele soltaria rojão, fogos de estrelinhas e teria além de rezas, muita bebida. A vontade de João era tanta que parecia embebedar-se de tanta felicidade. Ele afirmava que, de todos os santos, sua festa seria a mais bonita.
       Desde então, todos os santos, com medo de que João ponha fogo no mundo e comporte-se mal, o fazem dormir na véspera de seu aniversário, anos após ano; séculos após séculos. Assim, até hoje, as pessoas comemoram o dia de São João de maneira segura. Em alguns cantos do mundo há o costume das pessoas baterem nas casas, perguntando: -"São João passou por aqui?" E a resposta é sempre: "ainda não"!
       No céu, quando João acorda, sempre pergunta:
       - "Hoje é o dia da minha festa?"
       Então, os outros santos respondem que não, ou que seu aniversário já passou; que ele dormiu e que a perdeu. Então, João começa novamente a fazer planos para sua próxima festa, garantindo que não a irá perdê-la, de modo algum. Mas, sempre, com medo do fogo, os outros santos farão com que João durma, fazendo-o perder sua festa mais uma vez. E isso se repete, pela eternidade afora.
       Desejo que todos continuem a festejar São João de modo seguro, com fogueira pequena, para não pôr fogo no mundo e que bebam só um pouquinho para se aquecerem do frio do inverno. Desse modo continuamos a festejá-lo em paz, com a graça de Deus.
        E se alguém, mesmo em sonho, te perguntar se São João passou por aqui, diga-lhe que ele está dormindo! Não seremos nós os culpados se este João pôr fogo no mundo, não é verdade?
        Escrevi este texto baseado em informações trocadas com a Tita (86), a Dadá(82), da Luciene Lima, crítica literária; e em menções dispersas trocadas nos sites que esporadicamente visito.Acredito que a humanidade está dormindo para as coisas simples. Uma metáfora pode fazê-los acordar. Há Joões aos montes nas ruas, passando frio em noites de inverno, sem comida, sem horizontes, perdidos. Espero que a humanidade possa ajudá-los antes que façam uma fogueira tão grande, que possa por em risco o mundo.
        -Se ainda houver tempo, é claro.


 Antônio Carlos Affonso dos Santos – ACAS.
É natural de Cravinhos-SP. É Físico, poeta e contista.

Fonte: http://www.fmauriciograbois.org.br/portal/noticia.php?id_sessao=53&id_noticia=5633

Coisas nossas, por Zé Nilton


Sobre origens

Para o prof. Antonio Alves – o Toínho – de Ponta da Serra

Coisas nossas lembrar as origens e a caminhada humanas do estado de natureza para a cultura, do nomadismo ao sedentarismo e nos situarmos nessa história enquanto sociedade.

Historicamente tudo começa lá pelo quaternário, último período da Era Cenozóica, quando o homem, surgido mais precisamente no sul da África, iniciou seu processo de caminhada pela terra em busca de alimentos na qualidade de caçadores-coletores.

Pelo caminho o homem vai se cruzando com outros bandos humanos até mais adiantados, porque deram a largada primeiro. Instaura-se o processo de miscigenação que hoje nos leva a crer não haver “raça” pura na face da terra.

Dizem os especialistas em Antropologia, Arqueologia e Paleontologia, animados pelos historiadores das sociedades primitivas, que já bem adiante, pelo Neolítico, os homens se encontram chegando à América do Norte pelo estreito de Bering, numa dessas marés baixas das Eras Glaciais, e paulatinamente, vão ocupando todo o continente americano, quando já estavam mais aprimorados enquanto espécie - o chamado “Homo sapiens”.

Enquanto a antropóloga Niede Guidon, executiva do Museu do Homem Americano, no Piauí, assume que chegamos por aqui por volta de 60 mil anos, seu colega do México, Juan Comas, registra 22 mil anos como marco de nossa entrada no continente.

Hoje, nova polêmica está em curso quanto às rotas de chegada. Em vez de uma só, pela ponte terrestre do Estreito de Bering, há possibilidade de outra, pela costa americana, através de embarcações. Um recente estudo A História da Humanidade Contada pelo Vírus, de Stefan Cunha Ujvari, Editora Contexto, 2008, dá conta da presença de ovos do Ancylostoma duodenale, aquele do nosso Jéca Tatu, em cropólitos (massa fecal fossilizada) em índios americanos. Esses ovos não poderiam ter migrado pelo gelo, por razões óbvias, dentro do intestino de levas e levas de sapiens.

Bom, mas nós aqui dessas bandas do Ceará, como por todo o interior do Nordeste, somos descendentes de índios da grande nação Cariri, que habitava desde o norte da Bahia até o norte do Piauí, passando por Sergipe, Alagoas, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará.

Interessante observar que as condições sócio-ambientais permitiram a manutenção de traços bem característicos em nossa população, basta prestar atenção em nosso biotipo. Temos um corpo assim, uma cabeça assim...

No grande Cariri encontramos muitos conterrâneos com feições bem nítidas, na compleição física, da herança cariri. Isto porque nosso cruzamento teria sido recorrentemente entre índios com índios, índios com europeus, já que o estoque negróide pouco se reproduziu por aqui.

Costumes e mais costumes nos saltam à vista ou, de tanto familiar, não nos apercebemos sobre suas origens.

Quem não gosta de uma redinha após o almoço. De uma tapioca, beiju... O uso do cachimbo é bem presente pelas mulheres em comunidades campesinas. As falas de algumas pessoas lembram sons da língua indígena. A cor da pele e dos cabelos. Os trejeitos musicais de bandas de pífanos. E vai por aí...

Então, meus amigos, gostaria de juntar à História do vencedor à do vencido, e lembrar eles também nesse momento de comemorações ancestrais.

Aliás, uma das maiores lembranças em favor dos índios habitantes dessas terras antes da vinda dos europeus, é aquela em que, por ordem da carta régia de 05 de março de 1755 e da lei de 06 de junho do mesmo ano, as autoridades luso-brasileiras fazem chegar aos rincões do Brasil os alvarás de criação de “vilas de índios”, minudenciando os detalhes das instalações físicas até a constituição do governo local. Há um cuidado em manter orientações exaradas desde 1680 em favor da integridade indígena, um sempre apelo da coroa em tornar todas as humanidades vassalas do reino português.

Obedecendo fielmente as orientações de 1755, as primeiras autoridades da Vila Real do Crato foram compostas por seis senadores. Seguindo a carta régia o poder executivo ficou nas mãos de um índio, José Amorim e de um colonizador, o abastado agropecuarista com título honorífico do Estado Português, o capitão Francisco Gomes de Melo. Aliás, como ainda não havia instituída a figura do prefeito por esses tempos, os dois foram elevados ao status de “juízes ordinários”.

Tem uma turma na historiografia local que não vibra com a condição de um índio ter sido também nossa autoridade primordial. Mas é a História que o conduziu àquele mister, muito embora logo, logo, a Câmara do Senado advogue todo o poder municipal para si.Mas aí é outra história...

Nesta foto lhes apresento Rosa Carlos de Melo, residente na Serra do Araripe. Uma índia cariri em tudo, no jeito de ser, de fazer e de falar.

Rosa Carlos de Melo é coisa nossa, e através dela eu saúdo a memória de nossos antepassados.

Convido-os para ouvir pela Rádio Educadora, nesta quinta, às 14 horas, o encanto dos festivais da canção no Brasil, no programa Compositores do Brasil, através também da www.radioecudadora1020.com.br

Bom fim de semana.

Fiquem com a música de Antonio Adolfo e Tibério Gaspar – BR3 – com Tony Tornado e Trio Ternura, vencedora da fase nacional do 5º. Festival Internacional da Canção, em 1970


Um pouco de História do Crato

Pedro Esmeraldo

Antes, queremos agradecer a figura notável de Jorge Carvalho: enviamos nossos parabéns pelo seu trabalho eficaz em defesa da nossa terra.

Sempre tivemos a ousadia de defender este município com unhas e dentes para evitar os sonhos de inimigos piegas que atacam nossa terra arrebatando todo o patrimônio, quer cultural, quer físico e moral, levando tudo para si com gestos de crueldades inadmissíveis.

Não somos trouxas para acreditar nas artimanhas desses piegas que não sabem fazer outra coisa senão fomentar a discórdia e a intolerância de seus vizinhos.

Queremos lembrar a todos, que pertencemos a mesma região de homens capazes de sobrepujar a desigualdade e a mentira desairosa que provém desses inimigos febris e que somos obrigados a tolerar por meio de força política desigual.

O que almejamos é que sejamos um povo corajoso e deixamos de lado a falta de lutas a fim de evitarmos essa desigualdade desses políticos hostis que constantemente veem nos arrebatar os bens patrimoniais deste município.

Notamos que esses homens aventureiros querem crescer as custas dos chapéus alheios, pois não enfrentam a luta, não querem ter dificuldades de conseguir seus melhoramentos através do trabalho árduo, suor e lagrimas.

Há rumores que pessoas desiguais ao Crato querem colocar para trabalhar na Exposição taxistas de outra praça. Isso é um erro porque todo município tem a sua soberania, isto é, só deve trabalhar aqui os taxista locais. Não venham confundir bagulho com bugalho, deixe o Crato em paz, só para os cratenses.

Por isso, avisamos: o municípios do Crato vem crescendo visto que o nosso trabalho é feito com amor e dignidade sem prejudicar o patrimônio dos seus vizinhos.

Mostramos com muita atenção que o município do Crato cresceu, viveu sempre perseguido por meio das forças desses políticos fanáticos e que não sabem como possuir a igualdade, a honestidade e a paz de espírito.

Desde tempos imemoriais, Crato foi perseguido e continua sendo perseguido pela falta de coragem dos políticos pois alguns não têm amor a cidade e deixam correr tudo frouxo, sem esboçar um pingo de reação em defesa da terrinha.

Ah Crato velho sofredor! Por que não reagimos? Porque não temos coragem de pegar umas armas e partimos para a luta sem esmorecer, procurando crescer em pé de igualdade com esses outros municípios que não sabem procurar a concórdia e a igualdade no correr do tempo do século XXI.

Crato é zombado por esses inimigos dizendo que só tem uns anos e Crato é muito mais velha que eles, mas não cresce porque seu povo é acomodado

Puro engano! Crato é pouco mais velho que o outro município vizinho, visto que essa outra localidade foi fundada em 1827 pelo padre cratense Pedro Ribeiro da Silva, Neto do brigadeiro Leandro Bezerra Monteiro, aquele homem que abafou a revolução de 1817. Afirmamos porém que o Crato foi fundado por frei Carlos Maria de Ferrara no ano de 1764, visto que esta cidade só é mais velha que a outra apenas 63 anos de idade e não tivemos proteção alguma de campanhas miraculosas, protegida por um senhor e seus algozes fanáticos filhos do Crato. Portanto Crato tem o orgulho de enfrentar a luta como estamos enfrentado atualmente com dignidade e com trabalho.

Crescemos com a força do nosso trabalho e não somos prestigiados pela força governamental que se entrega facilmente aos políticos incompreeciveis do outro municipio.
Crato – CE, 17.06.2011

Ainda há juízes em Berlim - Emerson Monteiro

Quando ouvi as recentes notícias do decreto de prisão preventiva para os acusados em processo de irregularidades licitatórias na administração municipal de Senador Pompeu, por parte do Tribunal de Justiça do Ceará, logo lembrei de uma narrativa que cabe aqui contar.

Desenvolvida em forma de versos pelo escritor François Andrieux com o título de O moleiro de Sans-Souci, ela diz que, no ano de 1745, na Prússia, Frederico II desfrutava das benesses de um novo castelo que acabara de construir, quando, da sacada do edifício monumental, analisando a linda paisagem em volta, notou a existência, bem ali nas proximidades, de um moinho que destoava do contexto e enfeava a beleza tão escolhida para o seu desfrute. Nisso, o rei tratou de chamar seus emissários, que buscaram o proprietário da construção oferecendo adquirir o moinho e acabar de vez com o desgosto revelado nos caprichos do monarca. Não contavam, no entanto, com uma pronta recusa do moleiro.

O governante insistiu com veemência nas poderosas intenções, as quais não lograram quebrar a resistência do modesto vizinho.

Vai lá, vem cá, mesmo diante de veladas ameaças, a compra deixou de acontecer. Sob o peso das pressões, o dono do moinho manteria o propósito, recorrendo, em consequência, aos tribunais, sendo dele a expressão famosade que Ainda há juízes em Berlim!

Apelou às instâncias superiores na Capital do país e ganharia a causa. Manteve o lugar do seu moinho. Falam até que, ainda hoje, podem se ver resquícios daquela modesta edificação exemplo de uma justiça isenta e forte, a detrimento dos desejos de quem ocupava o cargo máximo da Prússia naquela ocasião.

...

Em fases nebulosas das crises de moralidade pública, nada mais benfazejo, pois, do que um Judiciário fiel aos propósitos sobre os quais são firmados os poderes constitucionais de uma República de verdade. Por mais audaciosos e hábeis que sejam os meliantes, eles baixarão a crista perante os rigores da Lei bem aplicada nos momentos certos, servindo assim de balizamento às práticas sociais e políticas durante todo o tempo da História.

www.monteiroemerson.blogspot.com

Distrações na oração

(Artigo publicado no Jornal "A Presença "- nº 241 - Setembro de 2004 -- Paróquia de São Mamede – Lisboa)


São Bernardo de Claraval (1094-1153 ) foi um dos maiores santos de França e até da Igreja: Fundador da Ordem de Cister, conselheiro de Papas e reis, promotor da segunda Cruzada, pregador e poeta. Conta-se em sua vida esta história pitoresca. Certa vez o santo ia de viagem montado no seu cavalo, de hábito branco e com religiosa gravidade.

Como os santos inspiram confiança, ao passar por um povoado aproximou-se dele um humilde lavrador e começou a conversar com o famoso abade, de quem tanto se falava no mundo. Meteram-se na conversa assuntos de coisas devotas e Bernardo queixou-se de que às vezes, pelos inúmeros assuntos que o preocupavam, não conseguia rezar com a devida atenção que desejava.

-- Que é que diz, Senhor Abade? - exclamou o bom lavrador. Então o senhor se distrai quando está a rezar? Palavra de honra, julgava que fosse santo!

-- E você, meu filho - replicou o grande santo – você não padece de distrações na oração ?

-- Não, não, Senhor Abade - assegurou com firmeza o lavrador. Deus me livre de tal falta de respeito a Ele. Eu, quando me ponho a rezar, ponho-me a rezar e mais nada. Caio de joelhos, ergo as mãos, e já não estou mais neste mundo. Podem tilintar moedas de ouro ou tocar trombetas a meu lado. Eu cá estou a rezar! Deus e eu, e mais nada!

O santo sorriu e exclamou:
-- Grande e extraordinária graça é essa, meu filho! Asseguro-te que só para almas muito escolhidas é que a bondade de Deus costuma conceder essa graça (e São Bernardo cravou no homem um olhar e um sorriso de paterna desconfiança). Não me leve a mal, amigo, mas eu sinto a tentação de desconfiar. Rezar sem distrações, será possível?

-- É tão verdade o que acabo de dizer, como tenho o Céu como verdade - respondeu um pouco melindrado o bom e espontâneo camponês.

-- Tiremos a prova agora mesmo - acrescentou o santo. Se você for capaz de rezar sem distrações um Pai-Nosso, dou-lhe este cavalo em que estou montado !

-- O quê, santo Abade! Fala a sério, dá-me o seu cavalo?

-- Já lhe disse e torno a lhe propor. Se for capaz de rezar um Pai-Nosso sem nenhuma distração, o cavalo é seu!

O lavrador, radiante, fazia festinhas na cabeça do animal e exclamava:
-- Cavalo forte e elegante, eu já te tenho!

E começou a prova. O homenzinho inclinou a cabeça que segurou com as mãos, como se quisesse prender o pensamento naquela hora. E começou a rezar baixinho: "Pai-Nosso, que estais nos Céus..."

Foi pronunciando as palavras com religiosa atenção, e recolhido como uma piedosa imagem.

Quando chegou no "O pão nosso de cada dia" parou um instante, levantou o rosto e perguntou ao santo: -- Diga-me, padre Abade, o senhor me dá também as rédeas?

-- Meu filho - continuou o santo - que pena! Nem cavalo, nem rédeas, porque você se distraiu!

O lavrador, lançando um olhar saudoso para o animal, suspirou:

-- Ai, que rico cavalinho eu perdi agora!

Que lição podemos tirar desta história?
Há duas espécies de distrações: as exteriores, que são por exemplo, olhar para o lado, fixar-se nas pessoas que entram e saem, ler qualquer coisa, fazer comentários, etc. Tais distrações podemos e devemos evitar. Porém, distrações interiores ou mentais, ninguém as consegue evitar.

Santa Tereza de Ávila dizia com graça, que “a imaginação é a louca da casa", que andava sempre a vaguear em nossa cabeça. É um cinema que nos mostra o filme dos acontecimentos da vida, ou as imaginações que o demônio quer fazer girar em nosso interior.
Tais distrações são inevitáveis.