Criadores & Criaturas



"Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
"

(Carlos Drummond de Andrade)

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... Por do Sol em Serra Verde ...
Colaboração:Claude Bloc


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sábado, 24 de setembro de 2011

Quatro cantos

- Claude Bloc -


Fico quieta...
Deixo que a tarde
inunde a casa.
Retiro dos quatro cantos
a saudade acumulada,
as flores abandonadas
e então, livre de tanta espera,
olho o tempo, quando anoitece
quando o relógio bate apenas
as horas de alegria
e estampa nossos sorrisos
em volta da mesa
nossos passos pelo tabuado,
todos os sinais que ficaram
onde os sonhos
entrelaçam as mãos. 

Claude Bloc

Benigna, a Santa de Santana do Cariri -- por Armando Lopes Rafael


Inhumas é um povoado do município de Santana do Cariri. Localizado a 2 km do centro da cidade, lá ocorre um fenômeno da religiosidade popular, fato comum no chão dos místicos nordestinos. Trata-se da devoção à memória de uma jovem – Benigna Cardoso – alvo da veneração pelo povo simples de Inhumas e sítios vizinhos a este povoado.

Curioso em conhecer esta história fui até Inhumas e ouvi de um habitante daquela localidade que á fora palco, há 70 anos, de uma tragédia. A adolescente Benigna Cardoso, nascida naquela localidade, em 15 de outubro de 1928, levava uma vida igual às demais mocinhas da zona rural naqueles recuados tempos. Fazia as tarefas de casa e era encarregada, também, do abastecimento de água da família que a criava, pois era órfã.

Para tanto se deslocava, todos os dias, até um riacho distante da sua casa e trazia – num pote de barro – a água necessária ao consumo do dia. Sua formosura atraiu a atenção de um jovem de sua idade, Raul Alves de Oliveira, também residente em Inhumas. Mas Benigna nunca alimentou a expectativa do namoro pretendido por Raul.

No dia 24 de outubro de 1941, nove dias após completar treze anos de idade, Benigna iniciou cedo seus afazeres domésticos. À tardinha, colocou o pesado pote na cabeça e, enfrentando o sol causticante, tomou o caminho da fonte de água. Antes de atingir o local, numa curva da estrada, apareceu de repente Raul que lhe fez propostas amorosas recusadas de forma categórica pela mocinha. Tresloucado, Raul sacou de uma faca que trazia e golpeou por três vezes o corpo franzino de Benigna. Um dos golpes quase decepou a cabeça da jovenzinha, tamanha a fúria que dominava o homicida.

O fato chocou a todos. Depois da morte da jovem começaram as romarias ao local onde ela foi assassinada. Até hoje, muitas pessoas da redondeza de Inhumas fazem promessas rogativas à alma de Benigna. Até pessoas ilustres nascidas em Santana do Cariri – mas residentes em outras regiões do Brasil – recorrem à intercessão da jovenzinha para obter graças.

Um modesto marco, encimado por uma pequena cruz, recebe muitos ex-votos dessas graças alcançadas. O povo de Inhumas se refere à Benigna como “A santa mártir”. Seria bom que a Prefeitura de Santana do Cariri mandasse construir no local uma capela ampla para abrigar os que ali vão rezar, acender velas e deixarem ex-votos pelas graças alcançadas por intercessão da jovem Benigna Cardoso.

Padre Christiano Coêlho, vigário por longos anos de Santana do Cariri, e já falecido, escreveu, ao lado dos dados de nascimento de Benigna, no Livro de Batizados da Paróquia: “Morreu martirizada às 4 horas da tarde do dia 24 de outubro de 1941 no sítio Oiti. Heroína da Castidade. Que sua santa alma converta a freguezia e viva de proteção às crianças e às famílias da paróquia. São os votos que faço da nossa santinha”.
O bispo de Crato, dom Fernando Panico, instalou a Comissão Diocesana para estudar a  documentação existente sobre Benigna. E um padre da diocese de Crato foi a Roma, neste mês de setembro, coletar dados para instruir a causa diocesana sobre um provável processo da heroicidade de mártir Benigna Cardoso.

Uma cruz a caminho do Rio – por Marcelo Musa (*)

O regime comunista polonês orgulhava-se de ter criado, com Nowa Huta - distrito operário próximo a Cracóvia planejado como modelo de sociedade marxista -, a "primeira cidade sem Deus" da Polônia. Na verdade, era apenas uma cidade sem igreja. Sem o prédio de uma igreja. Por isso os operários levados para povoar Nowa Huta ergueram uma simples cruz de madeira no meio da cidade. E se revezavam montando guarda a essa cruz, enquanto esperavam que sua cidade se tornasse uma paróquia.

Em 1963, o jovem bispo de Cracóvia decidiu aumentar a pressão sobre o governo comunista para que finalmente fosse permitido aos católicos de Nowa Huta erguer sua igreja. Na noite de Natal, debaixo de chuva e sob temperaturas negativas, Karol Wojtyla rezou a missa do galo em Nowa Huta pela primeira vez. Muito antes da queda do comunismo na Polônia, Nowa Huta ganhou sua igreja. Para o então futuro papa ficou uma lição que ele levaria para o seu pontificado de mais de 25 anos: a Igreja não é um edifício. Também não é a hierarquia sozinha. A Igreja é a presença dos fiéis cristãos. Onde quer que eles estejam, ali estará a Igreja. Mesmo que seja em torno de uma simples cruz de madeira em Nowa Huta. E foi confiando nisso que João Paulo II pôs a Igreja de volta no centro da discussão dos destinos da humanidade no final do século 20.
Uma cruz igualmente simples e profundamente simbólica está no Brasil. Ela é uma criação de João Paulo II e, de certa forma, é filha direta da cruz de Nowa Huta. Trata-se da Cruz dos Jovens, que iniciou em São Paulo, no domingo, dia 18, uma grande peregrinação por dioceses da América do Sul a caminho do Rio de Janeiro, sede da próxima Jornada Mundial da Juventude, em 2013. Há quem veja, mesmo dentro da Igreja, as Jornadas Mundiais como pouco mais do que uma celebração. Ou uma ótima oportunidade de "evangelizar os jovens", como gosta de dizer parte do clero. Uma espécie de grupo de jovens da paróquia em larga escala. Mas é muito mais do que isso.
A ideia da Jornada Mundial da Juventude começou a se delinear na mente do beato João Paulo II ao fim do Ano Santo de 1984. A grande cruz de madeira que ficou durante todo o ano na Basílica de São Pedro foi confiada aos jovens por ele. A tarefa, disse João Paulo II, era "levá-la para todo o mundo". Ainda não estava claro o que isso viria a significar. Os jovens levaram cruz a eventos católicos e, aos poucos, ela foi ganhando importância como símbolo. Até que o papa enviou os jovens, com sua cruz, para Praga, então parte da Checoslováquia ainda sob domínio comunista, de onde era arcebispo o cardeal Tomasek, preso pelo regime comunista nos anos 1950.
Aí, com a Cruz dos Jovens no mesmo papel da cruz de Nowa Huta, nasceu a ideia das Jornadas Mundiais da Juventude. A simples, mas eloquente, cruz de madeira seria levada pelos jovens, com a audácia e a coragem típicas da idade, a qualquer lugar do mundo. Mesmo onde não a quisessem. Fosse uma cidade além da Cortina de Ferro, como Praga, fosse para capitais de uma Europa pós-cristã, como Paris.

No pontificado de Bento XVI, o comunismo - a mais duradoura e das sanguinárias experiências de engenharia social que marcaram o catastrófico século 20 - já é um monstro derrotado. O perigo, aponta o papa, é o relativismo moral que aceita apenas o cálculo de satisfações como critério e insiste em usar o poder do Estado para manter a visão religiosa dos cidadãos fora do debate público. Esse é o sentido profundo das Jornadas Mundiais da Juventude. É preciso levar a sério a análise do papa de que os jovens são os protagonistas da Jornada. Elas não servem para os padres e bispos evangelizarem os jovens. Elas servem, isso sim, para os jovens evangelizarem o mundo.
(*) Marcelo Musa é jornalista de “O Estado de S.Paulo”