O processo de desenvolvimento e formação do ser humano se dá em algum contexto social, não sendo este fatalmente determinante, mas, capaz de influenciar fortemente, restando aí também a possibilidade de agir diferentemente do lugar que está inserido.
O conceito de lugar, tão caro aos geógrafos de hoje, é o que identifica o sujeito a determinados espaços e territórios. É lá onde ele desenvolve suas ações sociais, troca experiências e (re)produz um modo de vida. Como já foi dito, é necessário preservar uma idéia de liberdade, pois é nesse espaço que as mudanças culturais ocorrem. De outro modo, toda e qualquer sociedade estaria estagnada.
Quando desenvolvemos os pressupostos básicos acima, fica mais fácil comentar as categorias subseqüentes, caso tenha a necessidade de deixar claro o que queremos dizer. O que me refiro a partir de agora são às constatações e reclamações tão comuns pelos articulistas deste e de tantos outros blogs da região, além da minha própria. Nesse meio, não podemos nos furtar à percepção advinda do meio acadêmico, que é, talvez, a que tem formado a maior parte das “opiniões”. Tais posicionamentos se referem as mais diversas abordagens sobre a sociedade, desde a perspectiva artística a econômica. Porém, de um modo geral, pode-se dizer que passamos por péssimos momentos em todos eles. Facilmente observamos a cara de espanto como articulistas mais velhos têm em relação à gravidade da degradação intelectual e moral no Brasil nestes últimos cinqüenta anos. A perda de uma perspectiva histórica alienou o brasileiro assim como alienaria qualquer outra sociedade, pois, uma vez que retiramos a possibilidade de análise comparativa de alguém, retiramos “toda” sua possibilidade de evolução.
Uma vez que o processo educativo que vem a produzir o que chamamos de “Alta Cultura” é todo desenvolvido através de uma rigorosa absorção dos clássicos, que vão da filosofia, as artes visuais, da música a sociologia, da literatura a teoria política, que se harmonizam e se reproduzem no ser humano como ação individual (em não em bloco, como os ideólogos disfarçados de educadores fazem hoje), estão totalmente fora das políticas de educação do país, pode-se concluir que a única possibilidade de mudarmos o atual quadro partirá, caso de fato aconteça, por meio de ações individuais. Portanto, é você, o leitor que indigna-se, ao ver que o Brasil tem um dos piores índices de educação do mundo que poderá mudar esse quadro. Normalmente a angústia diante de uma visão aterradora como está nos dá a tentativa de ação em conjunto.
Pensar que o número faz a força é um raciocínio instintivo e demasiadamente primitivo em alguns casos. É o que na Grécia antiga chamaríamos de topoi, lugar comum. Fica claro que nem sempre essa conduta é a melhor a ser adotada em todos os casos. Tem-se que levar a conta que o que se quer desenvolver seja “Alta Cultura” fatalmente não será para todas as pessoas, e, talvez nem para você mesmo. Só que neste caso, você pode arriscar e tentar ver até que ponto estruturante poderá desenvolver em sua alma tal empreendimento, correndo assim os riscos e falhas sujeitas no processo. O que torna-se demasiadamente complicado é quando, ao tentar atuar em conjunto (em favor das causas sociais por exemplo) você arrisca a vida de outras pessoas que teoricamente confiam em sua competência.
A ideia mais clara sobre isso que podemos exemplificar é o meio que a coação do Estado nos faz ter que entregar nossos filhos para alheios, onde supostamente serão educados – nos dando a 53ª posição no ranking, atrás da Colômbia, Trinidad e Tobago e Tailândia, mesmo falsificando todos os dados possíveis a respeito dos índices de aprovação -. A possibilidade de uma educação através da iniciativa privada poderia ser uma solução, porém, esta também, sem nenhuma estrutura moral digna que tenha forças para encarar tamanho desafio prosta-se diante da coação do Estado mais uma vez. Dizem: - As melhores faculdades são públicas (sic)! Eles quem detêm o processo seletivo.
Deste modo, tudo o que seria “educação” fica sujeito a tal processo. Observe bem que, se analisarmos a história do conceito de educação, em nenhuma hipótese, tivemos um estágio tão humilhantes como agora, onde um sujeito ou entrega de imediato sua educação nas mãos abstratas do Estado e sofre suas conseqüências concretas, ou entrega-se para iniciativa privada que, no máximo, lhe deixa apto a submeter-se a um vestibular, controlado para variar, pelo Estado. Essa violência silenciosa tira toda a perspectiva de modificação de um país que só poderá ser modificado pela educação. Os investimentos econômicos assim como a melhoria de seus índices, são sempre vôos de galinha, sem a capacidade de manutenção por um período mais rigoroso, uma vez que a economia cresce, vemos paralelo a isso um péssimo índice de educação, saúde e violência.
Não quero aqui reduzir e simplificar a importância do desenvolvimento econômico e comercial do país, porém, não é através disso que haverá de fato alguma mudança. Dar melhores condições econômicas a um povo sem nenhuma educação não é garantia nenhuma, além da sua subsistência. É aí apenas uma garantia biológica, no sentido mais estrito do termo. A cultura é a base de qualquer sociedade e somente através de mudanças e investimentos nesse aspecto, onde o mesmo detêm elementos como a economia, a religião, a linguagem, entre tantos outros, é que veríamos, daqui a três ou quatro gerações, alguma mudança. Como o leitor pode observar, os investimentos que temos pelo menos nos últimos cinqüenta anos só ocorreu em alguns pontos isolados, não dando a possibilidade de articulação e nem de conjunto. Quando uso a palavra “conjunto”, não me refiro a tentativa comum de pasteurizar as consciências, como é o que já vem ocorrendo, mas sim a tentativa de garantir e restaurar a noção de individualidades, onde a existência das mesmas pode atuar de modo harmônico dando-nos resultados melhores.
Para isso torna-se urgente resgatar e priorizar o que já foi perdido e contabilizar quais os pontos fundamentais que estamos corrompidos. Talvez seja a hora de cortar na carne e acabar com o amadorismo de muitos em salas de aula, acabar com a politização da educação pois nem só de política e de supostas “consciências críticas” viverá o homem. A religião e a linguagem devem ser restauradas urgentemente assim como o vigor dos clássicos da literatura. Sem o estudo rigoroso das artes não se desenvolve o imaginário de uma sociedade. O homem só é homem, não pela sua simples capacidade de raciocínios lógicos, coisa que até um orangotango faz, mas, sobretudo pela sua capacidade de imaginar. Uma sociedade com seu imaginário corrompido pela classe de pseudo-artistas está fortemente comprometida. Não estamos no luxo dos anos 60 quando filósofo Mário Ferreira dos Santos nos anunciou: - “Os bárbaros chegaram aos portões”. Não só chegaram como agora os servimos submissos. Eles tomaram de conta dos governos, escolas, universidades enfim... A pergunta que não quer calar é: Até quando os bárbaros poderão virar diretores de escolas, políticos, professores, “artistas”?
A primeira coisa que me vem à mente a essa altura é a obra do filósofo Louis Lavelle, em seu livro “A Presença Total”, onde o mesmo nos dá a responsabilidade de ter um modo de vida de fato presente nas circunstâncias que de fato vivemos. Encarar a realidade é a única forma de viver dignamente.
Ortega y Gasset nos fala que as únicas ideias de fato verdadeiras são aquelas do náufrago que, uma vez sabendo que nada de resta estando ele agarrado apenas a uma tábua... É nesta precisa hora que nos interessa saber quais pensamentos estão presentes, pois assim, em um ponto crítico da vida, só restarão os pensamentos mais verdadeiros, essenciais, fundamentais para sua existência. Estando nesse ponto crítico onde divido que exista situação cultural pior, qual seria nossa atitude diante da “Presença Total”, qual seriam as “Idéias do Náufrago”?
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