Tudo começou com a chegada de Seu Augusto da Serra Verde, carpinteiro caprichoso, um exelente profissional preparado pelo seu pai. Era um negro fino e educado que passaria a viver conosco por um bom tempo trabalhando nos famosos quadros de formaturas com seus retratinhos pequenos.
Eu, Ricardo e Roberto, formamos uma comitiva para pedir a Seu Augusto que realizasse o nosso sonho de criança, construindo uma casinha para as nossas férias no velho pé de Sapota.
Ele aceitou prontamente.
A imensa árvore cobria o pequeno quintal com sua sombra e os seus galhos que passavam do telhado da casa do meu avô. Desde o desaparecimento do bicho "Preguiça" que morava por lá, subir na árvore tinha ficado sem graça.
Mãezinha concordou com a ideia, imaginando que ficaríamos brincando em casa, aos olhos de todos.
Aos pouco velhas portas e janelas foram se transformando em piso, paredes e telhado para a nossa casa da árvore. Era um sonho! As férias chegaram junto com a finalização do arrojado projeto arquitetônico do carpinteiro. Era um sobe e desce o dia inteiro e a minha avó falava à toda a hora:
_ Telma, quando der fé, cai um menino!
Seu Augusto resolveu rapidamente o problema construindo um bandejão içado por uma corda que levava e trazia tudo que precisávamos lá em cima. Bem abaixo na varanda, ele ouvia nossas vozes nas brincadeiras de criança. Eu desenhava no caderno e preparava as comidinhas, Ricardo e Roberto jogavam xadrez, dominó e liam o almanaque do Tio Patinhas e Edilsinho por ser menorzinho, não ficava quieto, pulando de galho em galho, gritando:
_O voo de Tarzan !
Gritava bem alto batendo no peito magrelo enquanto olhávamos boquiabertos a sua agilidade nos saltos. Subia cada vez mais alto e um dia resolveu realizar um voo que intitulou, "O voo da Morte". Subiu até avistar as palmeiras da Praça Siqueira Campos. Os galhos fininhos sustentavam as recentes folhagens da velha Sapota e ele se preparando para a mais audaciosa das façanhas.
_É hum, é dois, é três... Já!
E voou feito um macaco a procura de outro galho para se segurar, mas o galho fininho quebrou e assistimos a descida em dois tombos. O primeiro em cima do telhado onde Seu Augusto trabalhava e o segundo no chão do antigo quintal. E ainda o despencar de algumas telhas... Foi um barulho que correu todo mundo. Seu Augusto, mesmo mancando, pegou rapidamente o menino nos braços fortes e o levou até minha mãe, que disse:
_ Coloquem na cama de Edilma e vamos chamar Dr. Humberto!
Edilsinho muito sério e franzindo a testa, assistia a correria com um ar de abusado. Verificado que por milagre o menino não tinha sofrido nem um arranhão, mas estava sem fala, mãezinha gritava;
_ Fala menino... fala menino...!
Ele saltou da cama e disse:
_ Eu estou é só vendo a frescura de vocês !
Diante de tal exclamação, estava são e salvo.
Imediatamente, meu avó mandou chamar dois homens armados de facão e ordenou que botassem abaixo a velha Sapota com o nosso sonho de criança junto.
Edilma Rocha
2 comentários:
Edilma,
Eita que história boa! Como sempre você encanta a gente com as reinações e danações dessas crianças traquinas.
Parabéns pelo conto!
Maravilha.
E não é elogio barato, não, viu?
Claude
Claude,
Gosto de reviver essas lembranças.
Edilsinho se foi muito jovem e não teve direito as recordações.
Beijo,
Edilma
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