MINHA
RUA ERA UM RIO
E lá volto eu ao tema da minha rua. A rua Irineu Pinheiro onde morei, onde muitos moraram...
Lida a história assim de fora, talvez nem
desperte a saudade de quem morou no Pimenta, em meio àquele mundo de crianças
que se juntavam em suas brincadeiras, mas espero que compreendam que escrever
sobre isto não é pieguice, mas prazer que a minha rua me dá compelindo-me falar
dela.
A Irineu
Pinheiro corre do poente para o nascente (e vice-versa). Nesta semana, um
fim-de-semana prolongado, lembrei-me mais uma vez dela e da vida que hoje corre
por ela alterando-lhe o aspecto, o movimento, a vivência.
Ontem
era uma rua quase silenciosa, mas cheia de vida. Cheia de trinados de aves e
gatos ronronando nos muros dos quintais, pontilhada, de onde em onde, por casas
(remanescentes do meu tempo de criança), dialogando entre si.
Ontem
também a via toda bordejada, nas margens, por carros adormecidos. Por entre as
calçadas, quando chovia, corria um “rio” que descia lá do Sossego e
desassossegava a vida da gente... Lá também passava nossa vidinha do dia-a-dia,
nossas estripulias infantis.
Estranhamente,
o silêncio da tarde tecido rua abaixo, descia pela minha alma tão aconchegante
que nem as brincadeiras abandonadas pelas calçadas conseguiam romper a magia.
Havia momentos para se estar só, para se adivinhar o que havia de ser amanhã:
missa, cinema, passeio pelo Granjeiro, matinal no Tênis Clube...
Certos dias, depois da chuva, o Crato se iluminava. No ar eu sempre percebia o sussurro da luz e de bandos de pequenos, quase invisíveis, insetos flutuando nos raios de sol. Todos em suspensão, em estranhas danças... Tudo na minha rua tinha um ar de encantamento. Sentia-se a magia do tempo. Sentia-se os laços de amizade apertando-se. Sentia-se a vida deslizando plácida pela nossa janela.
Deslocava-me
continuamente, por umas horas, a percorrê-la de forma total, pra lá e pra cá, em
qualquer das suas margens. Sim, nas margens, pois é disso que se trata: a minha
rua era um rio de sol, de luz que ainda se estende, desliza e corre, por onde
se pode navegar como quem desliza num sonho dourado pela saudade.
Desse
rio, sou apenas afluente, assim como todos que ali moraram nesses tempos idos.
(Re)nasço no poente de minha vida e vago pelos pontos cardeais que só eu vejo.
Insisto no verbo amar, onde tudo começou. Passo hoje pela Irineu Pinheiro e me
revigoro. Semeio o dia.
Claude Bloc
3 comentários:
Claude Bloc é Poetiza das escritas e da alma!Lembro da Irineu Pinheiro quando ''subiamos'' para a casa de Tio Derval e muito tempo depois ela me apresentou/presenteou o meu Esposo, e por conta dele também moramos na Irineu Pinheiro por 04 anos; Eu chorei quando lá cheguei com saudade da minha rua do coração Claude, a José Carvalho, mas depois aprendi a gostar de lá, por que lugar bom é onde somos felizes e temos o que recordar com alegria, gratidão e saudade. Parabéns Claude por suavolta ao Crato, ao Pimenta!
Maravilha. A poetisa da saudade. Com sua permissão, estarei publicando também lá no Blog do Crato, afinal de contas nem só de asfalto e concreto vive uma cidade.
Quando é que vamos tomar nosso cafezinho, por falar nisso ?
Abraços, Claude!
DM
Vc me mata de saudade. E esse senhor aí deve ser o seu José Neves. Lembra dele?
Lá no fundo vejo a casa de Julia. No terreiro dela jogávamos peão e bola.
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