(Excertos de reporgem publicada n'“O Estado de S.Paulo)
Ronaldo Correia de Brito relata o processo de criação de "Estive Lá Fora"
Em
Estive Lá Fora, como em Galileia, trato de famílias. Embora quase toda
ação transcorra no Recife, a trama também remete ao Sertão dos Inhamuns,
um dos cenários que mais visito. Dessa maneira, mantenho os vínculos
com a paisagem de meus livros anteriores. O sertão alimenta o imaginário
do personagem Cirilo, irmão de Geraldo; os antigos crimes da família o
atormentam e o fascinam para a morte.
Ali
estavam as 296 páginas do romance que eu pensava escrever desde que
cheguei ao Recife para candidatar-me à universidade, e deparei-me com a
ditadura militar, mais evidente e chocante do que no interior cearense,
de onde eu viera. O terror adquiriu feições diferentes nas cidades
brasileiras, recrudescendo em tempos desiguais, conforme a resistência
política de cada Estado. No Recife, marcado pelas revoluções de 1817 e
1824, com um saldo de mortos e banidos que a história oficial não
costuma referir, as pessoas pareciam habituadas à luta. Já no primeiro
dia após o 31 de março, estudantes de Engenharia marcharam até o Palácio
das Princesas e foram recebidos a bala, morrendo dois jovens no embate.
Em 1969, ano em que cheguei à cidade, as forças de repressão haviam
assassinado o padre Henrique, de apenas 28 anos, um sociólogo que
trabalhava com o arcebispo dom Helder Câmara. O enterro tornou-se um dos
mais emocionantes atos públicos contra a ditadura, acompanhado por 20
mil pessoas no percurso de dez quilômetros do bairro do Espinheiro ao
cemitério da Várzea, com várias paradas por conta de ações da polícia e
prisões de manifestantes.
Tentei
recriar a atmosfera de horror do fim da década de 1960, quando as
medidas provisórias e os atos institucionais haviam limitado direitos
civis e liberdade de expressão. Fora das polaridades direita e esquerda,
comunismo e capitalismo, o Recife também pulsava, como o restante do
mundo, nos ecos da contracultura e do movimento hippie.
ESTIVE LÁ FORA
Autor: Ronaldo Correia de Brito
Editora: Alfaguara
(295 págs., R$ 44,90)
Autor: Ronaldo Correia de Brito
Editora: Alfaguara
(295 págs., R$ 44,90)
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