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"Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
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"

(Carlos Drummond de Andrade)

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quarta-feira, 4 de novembro de 2009

A ANTROPOLOGIA DE LUTO


Por Zé Nilton

Morre em Paris, aos 100 anos, um dos fundadores da Moderna Antropologia e mentor do estruturalismo nas Ciências Sociais, Claude Lèvi-Strauss.
Deixou um legado dos mais instigantes no campo das Ciências Humanas, notadamente na Antropologia, ou Etnologia, como ele preferia nomear a ciência do homem.
Pouco contato tive com sua obra na graduação em Ciências Sociais. Em teoria antropologica não passamos de Emille Durkheim. Era o tempo da escuridão, os anos setenta. Curioso, um dia descobri um único livro seu na biblioteca. Era “Tristes Trópicos”, ainda não traduzido. Como não estava no index da ditadura, levei para casa. Fiquei extasiado diante daquele escrito, um misto de literatura e ciência. Um discurso comparativo sobre duas realidades construídas historicamente: o novo e o velho mundo, as relações do homem com a natureza e seu contínuo e progressivo distanciamento dela rumo à cultura (sociedade).
A perplexidade do autor diante de uma realidade desconhecida empresta mais encanto à obra, e suas reflexões sobre o significado da civilização e do progresso agudiza o nosso pensamento sobre o mundo e suas descontínuas trajetórias. Aliás, Lèvi-Strauss disse um dia que a Antropologia serve para a gente pensar.
E foi assim eu me peguei um dia, nos confns da Chapada do Araripe, em meio as comunidades de pequenos agricultores, pensado o que significava tudo aquilo que vivenciava nas minhas “observações participantes” sobre o mundus camponês. Intrigava-me a capacidade de “tradução” de meu qualificado informante, o Sr. Pedro Honório, daquele universo exótico que eu havia de torná-lo familiar, condição indispensável para o sucesso na pesquisa de campo.
Pedro Honório falava-me dos lugares, da terra, dos matos, do tempo, do trabalho, das festas e das pessoas com tamanha profundidade, que comecei a desconfiar da relevância da oposição entre ciência e senso comum. Quando falava da vegetação, principalmente, meu informante seguia uma classificação, uma taxonomia local, para que serve e para que não serve esta e aquela planta, que ia das gramíneas às maiores árvores, tanto nas áreas antrópicas quanto na floresta.
Eureka ! Lèvi-Strauss jogou uma luz, e que luz no meu pensar e nas minhs desconfianças. Foi na leitura de “ O Pensamento Selvagem” que pude entender a lógica da ciência, da ciência que não é senso comum, mas é outra maneira de classificar as coisas da dinâmica interna da cultura, e com isto entender e viver no mundo.
Eis o sentido do “relativizar”, um constructo antropológico que clareia o sentido do diferente, do outro, da alteridade, da deficiência de uma verdade universal.
Aprendi com o velho pensador francês, vindo da Filosofia e, por isto mesmo, agregando valor as Ciências Sociais, principalmente na Antroipologia, em refino, estilo, arte e beleza, que podemos conviver pacificamente em sociedade quando, em algum momento, tenhamos que “suspender” nossos conceitos e olhar e compreender o outro na sua diferença, não como uma imagem distorcida e intolerante do meu eu, mas como um espelho em que me vejo e me retoco como ser humano...

3 comentários:

socorro moreira disse...

Belo texto, professor !

Dedê disse...

Uma irreparavel perda para o mundo acadêmico

Ana Cecília disse...

Belo depoimento, meu amigo.
É isso mesmo: alguns autores se tornam parte do nosso mundo pessoal
Abraço!