Criadores & Criaturas



"Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
"

(Carlos Drummond de Andrade)

ENVIE SUA FOTO E COLABORE COM O CARIRICATURAS



... Por do Sol em Serra Verde ...
Colaboração:Claude Bloc


FOTO DA SEMANA - CARIRICATURAS

Para participar, envie suas fotos para o e-mail:. e.
.....................
claude_bloc@hotmail.com

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Coisas nossas, por Zé Nilton


Por onde andarão?
(Dalmir em primeiro plano)

Para Vicente Almeida, um destemido pequeno-grande homem.

Coisas bem nossas lembrar-se de tempos e pessoas que povoaram nosso universo, e deixaram marcas profundas feito ondas, vagueando ao léu do tempo dentro de nós, e captadas a qualquer momento, quando nos lembramos de felicidade. Bom demais.

Três rapazinhos varzealegrenses conheci-os, numa fase difícil de nossas vidas, quando por aqui tudo era muito desolado. Costumava olhar ao longo da Rua João Pessoa, e contar nos dedos quantos transeuntes, carroças, carros e bicicletas circulavam, morosamente, pela rua grande, ainda sombreada por benjamins de copa redonda. De tempos em tempos a rua era sacudida, por ocasião dos “queimas” das lojas Romcy e Asteca. Seu Almir, de um lado da rua, e o grande Modesto Tavares, do outro, atraiam pessoas que vinham para este fim, por que calendarizado no ciclo de festividades da cidade.

Francisco Dalmir de Freitas, Darlan e o menino Demontieu. Três irmãos, três amigos dos tempos das vacas magras.

Corria o ano de 1968 quando nos conhecemos. Primeiro Dalmir, depois Demontieu. Estivemos os dois por alguns anos no mesmo local de trabalho. Dalmir, muito romântico, sonhador e louco por música; Demontieu, circunspecto, caladão e sempre preocupado com a vida, apesar de seus 14 anos.

Por questões de idade e de estado d´alma tornei-me mais afeiçoado a Dalmir. Invejava sua caligrafia, sua tranqüilidade e sua beleza. Sua presença enchia-nos de alegria, ao tempo em que nos esquecíamos de nossas agruras, agudizadas pelos baixos salários e pela falta de perspectiva.


Muito esticada ainda era a linha divisória do rural e do urbano. De um lado e do outro as marcas da riqueza e da pobreza eram perversamente expostas. Em cada esquina homens, mulheres e crianças tinham nome - esmoler.

Dos entornos da cidade os doidos apareciam para fazer morrer de rir o “hitch society” da época formada de abastados comerciantes, decadentes agropecuaristas e promissores servidores públicos.

Mas, voltemos a Dalmir.

Nossas almas se cruzavam à medida que nos descobríamos reciprocamente. Logo notei nele um estro gracioso e uma inclinação para a arte da música, mercê de sua afinação e ritmo. Tinha mesmo uma queda para a música e para cantar. Só não tinha jeito para tocar instrumentos. Ainda tentei.

Certa vez, num domingo, olhando na televisão que ficava na parte de exposição das Lojas Stuart, na Siqueira Campos, vidrei no quarteto MPB4. Miltinho, Magro, Aquiles e Ruy, num uníssono, interpretavam “Derramaro o Gás”, de Luiz Gonzaga e Zé Dantas. Fui atraído por aquela idéia de ecletismo musical, e nunca mais o deixei.

Não deu outra, num dado fim de semana, lá estávamos nós: eu, Dalmir, e dois outros que não me lembro, usando os mesmos instrumentos do famoso quarteto: violão, bongô, tambô, triângulo e voz, se metendo a imitar logo quem... o MPB4, pode ?

Tiramos algumas músicas, mas o fracasso se deu pela desafinação das vozes. Não se junta pessoas para cantar de uma hora para outra. O canto exige técnica, e bota técnica nisso.

Terminamos mesmo embalando as músicas de iê, iê, iê, tipo Renato e Seus Blues Caps, Deno e Dino, Os Vips, Os Jovens e, claro, o grande Roberto Carlos. Fizemos uma apresentação na casa das Irmãs de Santa Terezinha. As freiras gostaram, sem antes nos pedir, baixinho, para ali não se cantar “Quero que vá tudo pro inferno”, obviamente.

Por onde andarão Dalmir, Darlan e Demontieu ?

Certo dia recebi um CD de Dalmir contando piadas. Surpresa. Guardei uma que conto para vocês:

No tempo em que as rádios usavam aparelho para realçar o eco, imitando a Rádio Globo, certo jovem foi fazer um teste para locutor, numa rádio local.

Ao começar a ler o texto, falou uma palavra esdrúxula, uma coisa que ninguém entendeu a que o eco teria dito: Como é, homem?”

Gostaria muito de encontrá-los porque tenho os três irmãos dentro de meus sonhos, esperanças e crença na natureza humana, virtudes que as mantenho desde menino-moço.

Saibam todos: esses três pobres moços do passado ficaram marcados em minhas lembranças em colorido e cinemascope. Hoje cada um desfruta do gozo de terem vencido na vida pelo trabalho.

E para quem gosta, hoje, no programa Compositores do Brasil, na Rádio Educadora, (www.radioeducadora1020.com.br), às 14 horas, o excelente Eduardo Gudin e suas músicas bem elaboradas e inteligentes.

Agradeço à Magnólia Fiuza pela foto.

Bom fim de semana

3 comentários:

nino disse...

Legal, Zé Nilton.Dalmir é realmente um sujeito bacana.Fomos amigos de trabalho nos escritorios de Walter junior, Carlos Cesar e Cristovaldo.Se ver ele, diga que Cacau mandou lembranças.

Zé NIlton disse...

Grande Cacau, estou na espreita para encontrá-lo. Quando o vir, direi de suas lembranças e de todos os amigos que ele possui por estas bandas.
Um abraço.

Claude Bloc disse...

Zé Nilton, já lhe disse que aprecio demais o que escreve.

Nesse texto percebe-se sua grande sensibilidade no que tange ao resgate do tempo através das boas amizades...

Seu relato flui como uma saudade ligeira que desce pela correnteza da vida. Gostei demais.

Abraço,

Claude