Criadores & Criaturas
"Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata."
(Carlos Drummond de Andrade)
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segunda-feira, 12 de setembro de 2011
Meu Cunhado Maurilo por João Marni
Meu Cunhado Maurílo
A “menina dos olhos” de papai, como a considerava, encontrava-se numa tristeza de fazer dó! Vovó Olga, devagar e cuidadosa como quem caça onça, sussurrou muito próximo às lágrimas da neta Lôra: _ Chore não, minha filha, o namoro acabou, mas acho que você tem é sorte, pois êle, não lhe merece; parece um pirata velho, tal qual o Barba Azul! Depois de alguns meses o namoro reatou. E vovó: _ É isso! Não sei como você não notou direito nesse rapaz maravilhoso, maduro, já feito na vida! Voltou Maurílo para ficar. Casou-se por amor, até porque à época, o sogro não era mais da moda na gangorra social, a ponto do futuro casal relacionar os convidados à luz de velas, na casa da noiva. Poucos dias depois, veio a cerimônia, e ouvi, num breve discurso, nosso pai dizer: _ Maurílo, cuida bem de Lôra, pois ela é a “menina dos meus olhos”!
Como tudo que é sensato, providencial e bonito vem mesmo é de Deus, ganhamos, a partir de então, mais um luzeiro em nossas vidas. Embora parecesse irascível, Maurílo foi um apaixonado, dedicado à esposa e aos filhos. Homem livre, bem sucedido, mostrava-se genuinamente irreverente, às vezes contundente; dono de humor fino, inteligente, com tiradas incomuns, hilariantes. Simpático, sempre verdadeiro, amealhou amigos, raros não simpatizantes, mas nenhum inimigo. Foi doce e brincalhão tal uma criança e, enquanto adulto, nos fez desejar sempre a sua presença, pois era estimulante, justo e, sobretudo, fiel às suas paixões: família e amigos. Acho que posso transcrever um aforismo do poeta escocês David Hume que cai como uma premonição antiga sobre o homem Maurílo: “Nós somos livres quando não estamos impedidos de fazer o que queremos, e quando não somos compelidos a fazer algo que não desejamos”.
Agora, na velhice jovem da terceira idade, voltou à doçura da infância, brincando muito com a sobrinha neta Maria Alice e passou a buscar a companhia de Jesus, sem saber-se doente, retornando a frequentar seus altares, inclusive convencendo e estimulando a seus amigos mais próximos que assim também procedessem, semanalmente fazendo passear entre suas mãos as pérolas de Nossa Senhora, no Terço dos Homens.
Corajoso, amante da vida, bagunçou a sequencia da reação humana diante da inexorabilidade do fim da carne ante o veredicto médico, não negando sua condição de doente, não barganhando histericamente, aceitando este peso com uma serenidade admirável e entregando-se ao Criador, cheio de confiança!
Atitudes que desmoralizam a muitos de nós, afeitos que somos a coisas do chão! Não é bom o apego a sonhos e projetos difíceis de execução. Todos são escritos na praia e a maré sempre vem... A dor é mesmo um território santo, onde pisam apenas os que amam de verdade. Creiam, Lôra, Maria Fernanda, Rodrigo e Maria Teresa, que todos nós do círculo familiar e demais amigos à nossa volta, comungamos do sofrimento da perda, mas nos encontramos unidos na fé, o que nos alegra muito. Não é que a vida seja breve. Maurílo viveu o suficiente, o seu momento, e marcou a todos nós de forma positiva. É que Deus ora espera, espera, e outras vezes revela-Se apressado em recolher o que é D’êle.
João Marni de Figueiredo
Crato, 10.09.2011
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2 comentários:
João Marni,
Ao ler suas palavras me transportei em pensamentos a um passado feliz vivido entre a escola Dom Bosco, os ensaios das quadrilhas em sua linda casa e a alegria de uma colega e amiga chamada "Lôra" que encantava a todos.
Hoje ela derrama lágrimas no lugar do seu costumeiro sorriso. Mas é por uma grande saudade, sentimento que levará para sempre. Vai aprender a viver de um modo diferente, sentindo a falta de alguem que esteve ao seu lado...
O rapaz bonito, elegante e cordial disse adeus a mocinha feliz...
Deus sabe colocar as coisas certas no seu devido lugar, aos poucos...
Pois esta vida é uma constante despedida...
A minha solidariedade a amiga "Lôra" e familiares...
Edilma
João Marni,
Conheci Maurilo tinha uns 12/13 anos quando ele frequentava a casa de seu Pedro Libório, na Zé Carvalho.
Depois de muito tempo o reencontrei aqui no Crato em meio à sua família e, apesar de não termos conversado nesse ínterim,quando eu estava em busca de conseguir alugar a casa em que moro atualmente, encontrei-o nas proximidades do posto do Marciano e contei-lhe o que buscava e ele, solicitamente, me pôs em contato com Dr. Heládio para que esse intermediasse a negociação do aluguel, (visto que a casa pertence a Tereza Marcia, sobrinha de Dr. Heládio).
Esse gesto de solidariedade me deixou comovida e agradecida, pois eu já buscava encontrar um lugar para morar no Crato e nunca dava certo.
Hoje, olhando para os fatos ocorridos tão rápida e inesperadamente, não consigo entender como numa pessoa que parecia tão bem se escondiam os prenúncios dessa viagem.
Solidarizo-me a Lôra e familiares pela perda.
Abraços fraternos
Claude
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