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"Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
"

(Carlos Drummond de Andrade)

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sexta-feira, 1 de janeiro de 2010

CLAUDE, MA CHERRY


Por Zé Nilton


Puxa, você agora foi demais. Tocou com um fio elétrico na minha alma adormecida. Ou naquilo que estou agora. Esse moto - continuo da vida é só um moto - continuo da vida, com suas conseqüências. Eu também preciso de metáforas pra sobreviver...

Que bom te encontrar assim, porque “arre lá”, onde estão os outros, como disse Fernando Pessoa? Simplesmente eu estou agora tal qual você. Todos os tutanos que sustentavam minhas energias concretas e imaginárias foram chupados pelo tempo. E a gente fica naquela de só desejar um ano bom para os outros. E pra mim? Parece até que a gente, nessas horas, joga tudo para o outro como uma sublimação daquilo que falta na gente. Como almejar pro outro o que não tenho?

Diria que você se despiu ao dizer: “Eu, cá comigo, fico pensando: onde está a magia que morava dentro de mim? Onde está o mundo reluzente de energias cósmicas que formigava em minhas ansiedades? Onde estou?”

Você, assim como eu, está num não lugar. Assim como esteve o nosso querido poeta Manuel Bandeira, quando descreveu seu apartamento que ficou na sua memória, solto no ar, porque fora destruído, lá para as bandas do bairro da Glória.

E por falar em Bandeira, acho que cai bem, nessas suas (minhas) horas mortas, lhe presentear com um de seus poemas que termina por continuar na gente a mesma melancolia

Profundamente

Manuel Bandeira

Quando ontem adormeci
Na noite de São João
Havia alegria e rumor
Estrondos de bombas luzes de Bengala
Vozes, cantigas e risos
Ao pé das fogueiras acesas.

No meio da noite despertei
Não ouvi mais vozes nem risos
Apenas balões
Passavam, errantes

Silenciosamente
Apenas de vez em quando
O ruído de um bonde
Cortava o silêncio
Como um túnel.
Onde estavam os que há pouco
Dançavam
Cantavam
E riam
Ao pé das fogueiras acesas?

— Estavam todos dormindo
Estavam todos deitados
Dormindo
Profundamente.
*
Quando eu tinha seis anos
Não pude ver o fim da festa de São João
Porque adormeci

Hoje não ouço mais as vozes daquele tempo
Minha avó
Meu avô
Totônio Rodrigues
Tomásia
Rosa
Onde estão todos eles?

— Estão todos dormindo
Estão todos deitados
Dormindo
Profundamente.

Beijos
Zé Nilton

Um comentário:

Claude Bloc disse...

Você acertou com o presente.
Sei que este poema de Bandeira é um dos mais conhecidos, mas sempre me tocou de forma ímpar.

Apesar do contexto diferente, a cena da noite junina com fogueira acesa,bombas, cantigas, risos, o sono das crianças, e, depois de tudo, as lembranças dos que já se foram, a ausência das pessoas que amamos e que já se encontram em outro plano, dormindo profundamente...

Tocante!

Pensei estar sozinha neste barco mas vejo que vozes se levantam para saudar o ano com a mesma condição e pensamento...

De qualquer forma foi muito gentil sua lembrança em me dedicar esse texto. Como disse, tem tudo a ver comigo.

Feliz 2010! Afinal a felicidade existe.