Estava tão perto, bastava atravessar a rua, no caso, a Avenida Teodorico Teles, onde morava Padim Zuza, meu avô. Do outro lado, ela e seu sorriso, à mesma distância, claro. A vontade de ir até àquela janela do outro lado só era menor que a timidez que impedia seu atravessar. Coisa de adolescente. Sempre, à mesma hora, o ritual repetido: debruçar-se à janela, aprumar a vista para a janela da casa de frente, sonhar. Sabia que ela tinha o mesmo desejo e a mesma timidez, por isso, o mesmo ritual.
Era a melhor parte das férias. Numa tarde de um junho quase julho passaram pela rua que os separava quase 30 fuscas, duas freiras e uma carroça carregando móveis usados, puxada por um cavalo castanho. Seu irmão menor viu e contou. Ele mesmo nada percebera além do debruçamento da menina à sua frente. Apenas praquela janela tinha olhos.
Nas férias seguintes, a casa da janela enfeitada foi alugada a outra família. Foi a pior parte das férias. Numa tarde, ele contou 41 fuscas passando pela rua, a maioria deles branco. Duas freiras voltaram a passar. À tardinha, bem lentamente, passou uma carroça de saudades puxada por um cavalo azul.
Xico Bizerra
4 comentários:
Prezado Xico Bizerra.
Quantas lembranças,
Dos tempos de infancia.
Quantas saudades do velho Zuza,
Da casa do outro lado da rua.
Dos fuscas, das freiras, da menina e muito mais.
Coisas que o tempo levou,
E que pelo seu valor,
Não esqueceremos jamais.
Parabens pela bela cronica.
A. Morais
Senti-me tocada pelas tuas, e pelas minhas lembranças.
Morais,
Xico descreveu tão bem o cenário que de certa forma me senti aquela menina na janela... Creio que muitas histórias de amor de gente da nossa época começaram assim e exatamente desta forma...
Texto tocante...
Abraço,
Claude
obrigado a Morais, a Socorro e a Claude por serem tão generosos.
Abraços a todos,
XICO BIZERRA
Postar um comentário