Criadores & Criaturas



"Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
"

(Carlos Drummond de Andrade)

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... Por do Sol em Serra Verde ...
Colaboração:Claude Bloc


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quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Bibi da Onça - Um Otimista no Natal - Por José do Vale Pinheiro Feitosa

O título carece explicação. Bibi por diminutivo de Beraldo e Onça por feito de coragem ao contrário. Madrugada de valentões: caçada de uma onça que dizimava as ovelhas lá no olho d´água da Serra do Quincuncá. A luta para arrumar a arriscada excursão na coragem de Bibi. Ele acompanhou, mas assim que o rastro da fera e tiquinhos de bosta verde no meio do mato apareceram, deu uma sede de deserto na alma de Bibi. As cabaças estavam secas. Alguém sugeriu que Bibi chupasse um taco de rapadura. Pronto Bibi bateu em retirada a busca de um pote de água dormida. A onça colou ao apelido de Bibi.

Bibi é otimista inveterado. A sentença do patrão das terras onde vive agregado são loas de obediência. Mas ele tem uma arrumação no olhar: o olho esquerdo fulmina o pessimismo dos que reclamam e o direito ilumina as glórias do patrão. O Patrão anda por aí na Hilux refrigerada, mora na cidade e de costuma provar o sal da terra nos mares bravios do Ceará. Bibi é outra coisa: casa com teto vazado feito arupemba e paredes com buracos de espia.

Neste natal o patrão mandou a Hilux na fazenda para pegar as carnes de um carneiro e um peru de primeira. Aproveitou a viagem e mandou uma “ceia de natal” para os agregados da sua fazenda. O olho direito de Bibi da Onça brilhou como uma super nova.

Os agregados que restavam na fazenda eram poucos e Bibi aproveitou para criticar:

- Viram no que dá? É esta tal de Bolsa Família e os homens se aposentando cedo demais. Tem muito caba bom de eito que foi morar na cidade com aquele dinheirão que ganha do governo não quer mais nada com o trabalho. Agora é isso aí! Uma festa desta tinha para mais de quarenta pessoa. Agora é só nós.

De fato os presentes à “ceia” não passavam muito de quinze pessoas. Entre eles uns três sobrinhos de Bibi, Mário e sua mulher Ana, Zé Chulé e a mulher, Tonho e Zefinha e mais outras pessoas que não adianta esticar a lista. E aí veio a ceia. Que decepção. Bibi, abriu a bolsa de plástico e tinha umas seis pet de tubaína. Mario olhou para Ana e estimulou o olho esquerdo de Bibi.

- Mas minino só mandou “espoca bucho”. Antigamente pelo menos tinha aluá. Agora é este bicho que faz nós soltar tanto traque que escangalha o buraco que rima com caju.

- Deixe de ser ingrato. Seu pessimista. Nunca vê as coisas boas que acontece. Tudo é ruim, não adianta dar as estrelas. O aluá é coisa ruim, da casca do abacaxi, suja, cheia de micróbio. Agora não, este refrigerante de primeira é sadio, a água é até pasteurizada.

Mario olha para Ana e comenta: e vai ter pastel?

- Qui nada. Ói lá em riba da mesa, só tem aquela bulacha dura da bodega de Mané da Rola.

Bibi ficou possesso com as palavras de Mario e Ana. Foi de porta a fora e fez uma oração de louvor ao seu patrão, com o chapéu na mão e o olho direito olhando para a casa grande adormecida no silêncio do natal, com tubaína, bolacha dura e sem a Missa do Galo.

Um comentário:

socorro moreira disse...

Existem natais duros de roer, mas a gente consegue amaciá=lo com gosto de estrelas.
Época em que tudo pisca... na cidade e no sertão.
Ceias, na imaginação !


Um abraço feliz !