Criadores & Criaturas



"Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
"

(Carlos Drummond de Andrade)

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... Por do Sol em Serra Verde ...
Colaboração:Claude Bloc


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terça-feira, 15 de novembro de 2011

A Chaminé 

(Claude Bloc)

Minhas aulas muitas vezes pareciam poemas bordados na tela. Preparava textos para inserir no contexto e gostava de provocar alguns temas, instigar a reprodução de algum escrito de autores reconhecidamente versados em poesia ou literatura. Naquele dia eu também escrevia algo de meu e falava exatamente sobre a solidão...até me inspirei num texto de Cecília Meireles, onde ela dizia que a solidão não existe.

Esse era um tema recorrente e nessa aula, nesse dia, eu explorava a solidão, uma palavra um tanto quanto complexa, mas bem sugestiva visto que poderia ser abordada sob alguns dos seus variados aspectos.

Diante desse mal da solidão que corrói o mundo e que, de alguma forma, faz as pessoas se fecharem num individualismo planejado, me lembrei de uma imagem que fotografei na Serra Verde. Nela uma chaminé... Tudo o que resta do engenho que lá existia. Uma chaminé imponente e solitária que hoje se ergue mostrando as marcas impiedosas do tempo. O mato já toma conta de seus arredores e a cada ano, o tempo a consome mais um pouco e a distancia dos dias gloriosos em que soltava a fumaça da lenha e do bagaço de cana que eram lançados na fornalha.

O mês de julho na Serra Verde era um mês festivo. Férias! Primos e amigos engrossavam o rol de crianças na Fazenda. A primeira garapa cheirava em nossas narinas como um convite às delicias do mês. Íamos ao engenho em bando, de manhã e sobretudo à tarde. De casa levávamos uma lata de óleo bem lavada, com as beiradas devidamente batidas para não machucar as bocas ávidas pelo néctar da cana de açúcar.

A meninada chegava no engenho animada. Havia uma espécie de concurso para saber quem agüentava beber um litro de garapa de uma lapada só...  Quem ganhasse, pegava o primeiro alfenim.

Pedíamos a Josa, para raspar algumas canas tortas, apropriadas para “colher” o mel na gamela, antes que Redondo começasse a mexer aquele líquido cheiroso e fervente fazendo com que ele açucarasse até dar o ponto da rapadura.

Com o mel já “colhido”, íamos rodando as canas para ele não escorresse e para que ele pudesse esfriar, de forma que pudéssemos pôr a mão e puxá-lo até que virasse alfenim. A cor viscosa e dourada ia embranquecendo, o mel soltando da mão, até que fôssemos capazes de degustar aquele “puxa-puxa” que era para nós um manjar delicioso. Depois de açucarado o sabor não era o mesmo.

Hoje a chaminé continua lá em pé, incólume. Solitária. Esquecida. No seu topo um mandacaru “fulora” na seca. Mas fica aqui uma pena imensa dessa solidão em que hoje se encontra e das ruínas em que serpenteiam as saudades da vida e das alegrias que sentíamos quando a fumaça dessa chaminé exalava o cheiro da moagem. 

Claude Bloc

2 comentários:

Edilma disse...

Claude,

Adorei o texto que faz jus a foto.
O tema "solidão" se transformou na delícia dos produtos do velho engenho de cana de açúcar. Em meio as palavras senti o doce sabor da infância.
Obrigada pelas recordações açucaradas.
Por falar em doce, tem "nego-bom" aí?
Beijo!

Claude Bloc disse...

Aqui tem "nego bom" sim... Já decidiu quando vai vir?

Abraço

Claude