Não terá sido, certamente, por mero acaso que se considera a Grande muralha da China , por consenso, a maior obra da engenharia humana. Os seus mais de 8000 kilometros, construídos por mais de quinze séculos, além de ser a única construção humana visível do espaço sideral, credenciam-na a este posto. Acredito, no entanto, que existe, como em tudo neste mundo, uma razão subjacente, para tamanho encantamento. A humanidade é fascinada por muralhas. Desde o Gênesis, quando nossos ascendentes primevos – Adão e Eva—foram escorraçados “para fora dos jardins do Éden” , subentende-se que alguma fronteira existia entre o paraíso e o resto do terra: quem sabe uma muralha? A queda de Tróia pressupôs um drible nas suas muralhas através das peripécias de um Cavalo oco, atapetado de guerreiros no seu bojo. O crescimento das nossas antigas civilizações aconteceram pela a construção de fortes, muros , cercas, com o objetivo claro de protegê-las contra o ataque dos inimigos. Um Muro, também, - o “das Lamentações—é o lugar mais sagrado dos judeus, nos dias de hoje. O desenvolvimento da Sociedade Feudal e depois Capitalista erigiu o muro como seu tótem: o símbolo da propriedade privada. Após a Ia. Grande Guerra, a França criou também a sua muralhinha na Fronteira entre ela, a Itália e a Alemanha: a Linha Maginot. A Guerra da Coréia criou um muro virtual : o Paralelo 38. Mesmo com o advento do comunismo, nos primórdios do Século XX, o muro continuou plenamente em voga, basta lembrar a Construção do mais famoso deles, o de Berlim, em 1961. A queda do de Berlim , em 09/11/89, há exatos vinte anos, não cessou a construção de muitos outros muros . Os Estados Unidos erigiram um imenso na sua fronteira com o México na tentativa desesperada de impedir a entrada de migrantes hispânicos. Israel elevou em 2002, na Cisjordânia, um outro muro com o fito de afastá-la dos palestinos. Nos tempos atuais, as grandes cidades dividem-se entre os criminosos presos por trás dos muros das prisões e o resto da humanidade presa atrás de muros altíssimos construídos ao redor de suas residências. Os maiores conflitos mundiais entre nações e entre pessoas encontram-se centrados em limites de fronteiras: até onde vai o meu muro e onde começa o seu ? O adolescente, na esquina, se pergunta : deve ou não usar um muro plástico ( a camisinha) , na tentativa de evitar a gravidez e as doenças sexualmente transmissíveis ? Existem ainda as paredes que construímos sem nenhuma argamassa: intuitivamente cada um dos nós delimita um espaço. Até aqui é meu, até aqui é seu : no ônibus, na rua, no trabalho, na escola, em casa. Sem falar nas imensas paredes que erguemos ,psicologicamente, entre nós mesmos e as outras pessoas: inimizades, picuinhas, despeito, inveja, competição. A raiz da intolerância no mundo encontra-se no soerguimento paulatino de muitas barreiras : ideológicas, religiosas, culturais, étnicas, econômicas.
A queda do Muro de Berlim, há vinte anos, representa muito mais que o esfacelamento de uma ideologia, de uma outra maneira fechada e maniqueísta de interpretar o mundo. O Muro talvez seja o maior símbolo histórico da humanidade. A respiração do planeta depende da queda de infinitas muralhas construídas física, virtual e psicologicamente ao longo de toda nossa história. O futuro depende da nossa capacidade de fabricar pontes, passarelas, no lugar de muros e cercas. Quando levantamos uma fortaleza , nem percebemos, mas na outra sala, simultaneamente, já começamos a confeccionar o nosso próprio Cavalo de Tróia.
A queda do Muro de Berlim, há vinte anos, representa muito mais que o esfacelamento de uma ideologia, de uma outra maneira fechada e maniqueísta de interpretar o mundo. O Muro talvez seja o maior símbolo histórico da humanidade. A respiração do planeta depende da queda de infinitas muralhas construídas física, virtual e psicologicamente ao longo de toda nossa história. O futuro depende da nossa capacidade de fabricar pontes, passarelas, no lugar de muros e cercas. Quando levantamos uma fortaleza , nem percebemos, mas na outra sala, simultaneamente, já começamos a confeccionar o nosso próprio Cavalo de Tróia.
J. Flávio Vieira
4 comentários:
Prezado Flávio,
Quero parabenizá-lo pelo belíssimo texto. Uma verdadeira aula de vida e história. Gostei....
Um abraço,
Bernardo
Prof Bernardo,
Como vão as coisas ? tudo bem aí pelo RJ? quando é que arruma os teréns e retorna ? O Cariri está sentindo a sua falta. Ainda bem que vc continua postando seus textos tão espiritualizados, acredito que vc é único nesta visão por aqui e isto ajuda a oxigenar o mundo.
Grande Abraço,
Zé Flávio
Menino de Deus,
Pela primeira vez gostei de me enfronhar na história.
Acho que fui influenciada por quem escreveu.
Alderico me havia traumatizado, mas você desentocou em mim a nova perspectiva dos fatos no mundo.
Obrigada pela aula.
Abraço,
Claude
Baixou o espírito de Padre gomes ! Um grande abraço, claude.
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