Merry Christmas
(Conto de Natal)
Em seu trono, sob a estratégia lojista e conivência dos pais, ele atendia às crianças que, por suas vezes, absorviam, sem direitos de esclarecimentos, a idéia distorcida da festa... A de que ela só significava presentes dados pelo glorioso e inesquecível Papai Noel!
Trinta minutos para a meia noite...
Nesse fervilhante mercado de sonhos e requintada beleza plástica, as vitrines constituíam-se num espetáculo à parte. Seus criadores, porém, tinham o máximo cuidado de não decorá-las com nada que lembrasse a figura do Menino Deus. Não que o respeitassem, mas porque ele estava se tornando figura imprópria para época. Mas, nas raras vezes em que era encontrado nesses espaços, o pequeno Jesus, juntamente com Maria e José, só era visto na condição de garoto propaganda. Em imagens estáticas, a Sagrada Família ostentava placas de ofertas de produtos cujos preços (com juros de mora embutidos) eram anunciados com falsos descontos de até “50%!”.
E a agitação prosseguia...
Ainda como parte contrastante dessa “Noite Feliz”, a mendicância adulta e infantil perambulava pelas ruas da Metrópole na busca de seus sonhos, não necessariamente de consumo material, mas de reconhecimento social e fraternidade! Suas tristezas em seus olhares colocavam em cheque a sublimidade do Natal, ou seja, aos abastados eram dados os bônus das posses, das alegrias e dos prazeres; aos párias o ônus da pobreza, da tristeza e da fome!
Para ele, o que deveria significar comunidade, solidariedade, confraternização e amor, passou a ter, em alguns desses cantos, conotações de consumismo, egoísmo e gula. Por conseguinte, nada do que Ele estava vendo ali aparentava ser diferente... A fartura, o desperdício e a arrogância dos lares ricos contrastavam com as limitações e preces dos excluídos.
A noite foi chegando ao seu fim!
Magoado pelos homens, o visitante resolveu comemorar o verdadeiro Natal embaixo de um viaduto junto a um grupo de sem-tetos, sem comida e sem mil outros direitos. Ali Ele orou, conversou e dividiu sua ceia com todos. Foi tudo muito simples, mas especial, o suficiente para nutrir, no limite certo, o corpo e a alma de cada um.
No seu último olhar para aquela cidade, Ele continuou sem conseguir disfarçar a sua tristeza, pois tinha a certeza de que, em breve, mais precisamente na celebração da sua Paixão e Morte, como também na Páscoa, sua lembrança seria novamente deturpada.
A Sexta-Feira, por exemplo, hoje popularizada como o feriadão da Semana Santa, não seria cultuada nos templos, retiros nem mesmos nos corações de muitos fiéis, mas nos lazeres dos bares, shoppings, campos e praias.
A Páscoa, comemoração festiva da sua Ressurreição teria como símbolos coelhos e ovos de chocolates (ou de Pá$coa), conforme as estratégias da mídia, da indústria e do comércio. Ou seja, sua imagem seria, mais uma vez, objeto de troca por símbolos mercantis.
Antes de partir, porém, benzeu a todos seus irmãos ali reunidos dando-lhes, inclusive, um beijo em suas faces.
Em seguida, com a leveza de uma ave noturna, andou alguns metros, levitou e sumiu na obscuridade da noite.
Seu rosto nunca mais chegou a ser visto naquele lugar.
A noite e a madrugada chegaram aos seus fins!
Desfigurada, bêbada e a vomitar a bílis de seus pecados, mistos de gulas e soberbas, a cidade acordou com um ar de remorso.
(Conto de Natal)
Por Roberto Jamacaru
À noite, nas ruas daquela grande cidade, sob os efeitos coloridos e mágicos das luzes, músicas e cores, soltas no ar, o que mais chamava atenção de um simples observador, era a ação daquela multidão de gente invadindo shoppings e pequenas lojas comerciais, onde, de forma compulsiva, passava consumir vários tipos de bens para servirem de presentes na Noite de Natal.
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Massificada pela ambição mercantilista, a maioria dessa gente não tinha consciência de que estava sendo monitorada por um personagem de cultura estranha à sua: ele tinha cabelos e barbas brancas, trajava roupão e boina vermelha, portava um saco recheado de presentes e tinha o hábito de distribuir, gratuitamente a todos, o seu comercial e hipnótico sorriso: OH, OH, OH, OH, OH, OH!
Em seu trono, sob a estratégia lojista e conivência dos pais, ele atendia às crianças que, por suas vezes, absorviam, sem direitos de esclarecimentos, a idéia distorcida da festa... A de que ela só significava presentes dados pelo glorioso e inesquecível Papai Noel!
Trinta minutos para a meia noite...
Nesse fervilhante mercado de sonhos e requintada beleza plástica, as vitrines constituíam-se num espetáculo à parte. Seus criadores, porém, tinham o máximo cuidado de não decorá-las com nada que lembrasse a figura do Menino Deus. Não que o respeitassem, mas porque ele estava se tornando figura imprópria para época. Mas, nas raras vezes em que era encontrado nesses espaços, o pequeno Jesus, juntamente com Maria e José, só era visto na condição de garoto propaganda. Em imagens estáticas, a Sagrada Família ostentava placas de ofertas de produtos cujos preços (com juros de mora embutidos) eram anunciados com falsos descontos de até “50%!”.
E a agitação prosseguia...
Ainda como parte contrastante dessa “Noite Feliz”, a mendicância adulta e infantil perambulava pelas ruas da Metrópole na busca de seus sonhos, não necessariamente de consumo material, mas de reconhecimento social e fraternidade! Suas tristezas em seus olhares colocavam em cheque a sublimidade do Natal, ou seja, aos abastados eram dados os bônus das posses, das alegrias e dos prazeres; aos párias o ônus da pobreza, da tristeza e da fome!
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Em meio a todos, e sem conseguir disfarçar a sua profunda tristeza, um anônimo acompanhava, a passos lentos, o vai-e-vem daquela multidão estressada. Nessa mesma noite, véspera de seu natalício, seu espírito havia acabado de visitar o Universo inteiro. Esteve ele no exibicionismo festivo das altas sociedades, nos silêncios dos hospitais, nos clamores dos presídios, nos abandonos dos asilos e orfanatos; nas dores das guerras, nas preces dos templos religiosos, nos prostíbulos, nos shows midiáticos nos mais inacessíveis dos lares... Enfim, andou por todos os cantos e recantos da terra onde o Natal estivesse sendo celebrado.
Para ele, o que deveria significar comunidade, solidariedade, confraternização e amor, passou a ter, em alguns desses cantos, conotações de consumismo, egoísmo e gula. Por conseguinte, nada do que Ele estava vendo ali aparentava ser diferente... A fartura, o desperdício e a arrogância dos lares ricos contrastavam com as limitações e preces dos excluídos.
A noite foi chegando ao seu fim!
Magoado pelos homens, o visitante resolveu comemorar o verdadeiro Natal embaixo de um viaduto junto a um grupo de sem-tetos, sem comida e sem mil outros direitos. Ali Ele orou, conversou e dividiu sua ceia com todos. Foi tudo muito simples, mas especial, o suficiente para nutrir, no limite certo, o corpo e a alma de cada um.
No seu último olhar para aquela cidade, Ele continuou sem conseguir disfarçar a sua tristeza, pois tinha a certeza de que, em breve, mais precisamente na celebração da sua Paixão e Morte, como também na Páscoa, sua lembrança seria novamente deturpada.
A Sexta-Feira, por exemplo, hoje popularizada como o feriadão da Semana Santa, não seria cultuada nos templos, retiros nem mesmos nos corações de muitos fiéis, mas nos lazeres dos bares, shoppings, campos e praias.
A Páscoa, comemoração festiva da sua Ressurreição teria como símbolos coelhos e ovos de chocolates (ou de Pá$coa), conforme as estratégias da mídia, da indústria e do comércio. Ou seja, sua imagem seria, mais uma vez, objeto de troca por símbolos mercantis.
Antes de partir, porém, benzeu a todos seus irmãos ali reunidos dando-lhes, inclusive, um beijo em suas faces.
Em seguida, com a leveza de uma ave noturna, andou alguns metros, levitou e sumiu na obscuridade da noite.
Seu rosto nunca mais chegou a ser visto naquele lugar.
A noite e a madrugada chegaram aos seus fins!
Desfigurada, bêbada e a vomitar a bílis de seus pecados, mistos de gulas e soberbas, a cidade acordou com um ar de remorso.
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Esparramados em alguns lares, ruas e shoppings, o excessivo e colorido lixo do ter exalava no ar a fedentina do egoísmo e da falta de solidariedade humana!
Noite infeliz...
Noite infeliz...
Tente dormir em paz, meu Jesus!
Noite infeliz...
Noite infeliz...
Tente dormir em paz, meu Jesus!
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Conto por Roberto Jamacaru
2 comentários:
Belo conto, Roberto!
expressa muito do que também eu sinto. O que desejo para mim, para você, para todos nós, é que possamos viver com felicidade e sentido - resistência maior a esse mundo tão acelerado e despersonalizante.
Abraço!
Roberto,
Meu Natal hoje se chama solidão.
Enche-me o peito apenas o amor pelo aniversariante. O resto é silêncio...
Enche-me o peito apenas a saudade dos meus que se foram. A alegria antiga se foi...
Mesmo assim desejo a todos que o Natal seja Feliz e que estes sentimentos meus se dissipem e afrouxem, para dar lugar à felicidade.
Abraço a você e Fanka e obrigada pelo lindo texto que nos ofereceu neste Natal!
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