Tarde quente,
escada no ombro
e quem passa
em suas carruagens
pensa, deduz, imagina:
"uma mísera criatura,
um ser infeliz."
O suor ensopa
arranha meus óculos.
Minha virilha assada.
Meus pés dentro do forno da bota.
O inusitado, no entanto,
chama-lhes atenção:
minha altivez no caminhar
meio dono do pedaço.
Não sabem eles
(nem a grana revela)
que loucura me habita:
poeta, bárbaro, bruxo.
O dia todo na labuta
gladiador de mosquitos
com escada, bolsa,
diflubenzurom e seringa
mas a alma (ou outra coisa além mar)
pisa solo, bate asas, sobe caixas
olha ralos, mergulha no vão do bueiro
como se o corpo não houvesse
como se não sangrassem os calos
como se não queimasse o couro cabeludo.
Em suas carruagens elegantes
no estalo de um raio
faz-se um mistério
quando ousam me encarar.
Não entendem mesmo (nem a grana revela)
como pode um sujeito sob tal sol violento
repartir esse riso lírico
no canto dos lábios.
Deus é um pai bondoso,
diria eu.
Amanhã chove.
Nenhum comentário:
Postar um comentário