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"Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
"

(Carlos Drummond de Andrade)

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segunda-feira, 24 de maio de 2010

Os Filósofos da Batateira e a dialética do personagem e ator - por José do Vale Pinheiro Feitosa

Reunião de apenas alguns. Mitonho, Chico Preto, Chambaril e Bunga. Foi um pouco pelo acaso. Mitonho vinha pela estrada do brejo quando viu de longe a silhueta de Samuel, um terrível cobrador de dívidas, desviou-se pelo Arisco. Chambaril com uma toalha displicentemente nos ombros, carregava uma tora de sabão para lavar-se no rio e o caminho mais perto era o do arisco. Bunga estava procurando o seu jumento que deixara amarrado numa área e apenas encontrou o toco de corda partida.

Chico Preto era o único sábio naquele pleno das quatro horas no sítio Batateira. Destilava um opúsculo de Hume sobre a teoria do conhecimento, especialmente sobre as impressões vindas pelos sentidos e a formação das idéias. Isso embaixo da generosa sombra de um grande cajueiro, naquela altura pontilhando o folhado verde de rubros e amarelos cajus doces. Entre uma chupada cuidadosa com as manchas do sumo na sua camisa e uma lambida na ponta dos dedos, passava as folhas que digeriam um dos filósofos da Grã-Bretanha.

Com diferença de minutos os quatros Filósofos da Batateira estavam sentados em animada conversação. E que conversação! Tratava a dialética entre os personagens e os atores. Mitonho argumentava:

- Olhem bem o exemplo: Brizola era o personagem, o neto dele que é deputado federal pode ser apenas o ator.

- E Brizola tem neto deputado? Eu não sabia não! – interrogou Chambaril.

- Tem – esclareceu Chico Preto – e agora anda querendo beber o chimarrão do avô. Mas sempre resta uma dúvida: Brizola tinha a alma do seu tempo, o neto tem a farsa do tempo do avô. Ninguém vive o tempo do outro. Vive coisa parecida, que são sonhos, desejos, rumos que se tomam entre uma geração e outra, mas cabe a cada geração encontrar os inimigos dos seus sonhos e lutar contra eles. Não adianta ser apenas o ator. Isso tem pouca duração assim como o ato de um drama.

E foi neste clima que Bunga deu sua palavra: o caçuá da carga pode até durar muito, mas a carga é sempre diferente. Depende da safra e da vontade pelo produto. Tanto a safra muda durante o ano como o desejo vai mudando até mesmo na própria pessoa.

Pronto, como costumava com ao maior e mais profundo filósofo que a Batateira já tivera e tem, Chico Preto arrematou aquela breve reunião:

- O personagem está se queimando sob o sol de todos os dias. Esfola os dedos dos pés de tantas topadas na vereda irregular das noites escuras. Tem os ouvidos vitimados pelo vigor das respostas que lhe dão todas as vezes que sua voz se manifesta. O personagem não tem alternativa a não ser ele mesmo. Já o ator, apenas interpreta e ninguém consegue interpretar e viver ao mesmo tempo. Só interpreta, já com suas entranhas pedindo socorro ao badalar do final da peça. O intérprete cumpre apenas uma peça em pequenos atos, já o personagem é consumido pelos atos de uma vontade coletiva inteira, no espaço de um povo definido e no tempo que constrói os atos desta vontade.

Chico catou o livro largado ao seu lado no pedregulho do arisco, todos se levantaram com os movimentos do mais real dos personagens: foram todos mergulhar no poço que fica perto do Alto do Urubu.

2 comentários:

socorro moreira disse...

E UMA "TORA" DE DOCE DE BURITI
QUE EU NUNCA MAIS COMI...?
E O MEU ENTUSIASMO POR BRIZOLA,
QUE A MORTE MINOU?
PENSO NOS PERSONAGENS DE AGORA...
zÉ XIMENES E CELINA , ACOMPANHADOS PELO OLHAR DE jOAQUIM, QUASE ME CONVENCERAM EM QUEM VOTAR , PRA QUE O VOTO SEJA VÁLIDO .
QUANTA FALTA DE PAIXÃO E EMOÇÃO, NA ESCOLHA DO NOSSO PRESIDENTE !
AINDA HÁ POUCO LI UMA MANCHETE E DESISTI DE COMPLETAR A LEITURA DO TEXTO:
MINISTROS RECOMENDAM O VETO DE AUMENTO DE 7,7 % PARA APOSENTADOS.
O QUE PENSAR , DEUS DO CÉU ?!
DEIXO O PROBLEMA PARA SER DISCUTIDO PELOS FILÓSOFOS DA BATATEIRA.

Edilma disse...

Um texto para refletir !
Parabens escritor poeta.
O meu abraço !