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domingo, 2 de maio de 2010

DAS DORES E DAS RUAS - Por Carlos Eduardo Esmeraldo Filho

Pesquisa de dissertação de mestrado, realizada nos meses de agosto e novembro de 2009, intitulada “Necessidades de saúde dos moradores de rua: os desafios para as políticas sociais do município de Fortaleza-CE”, revela as condições de vida dessas pessoas e as implicações para a sua saúde.

Partindo dessas condições de vida, dos relatos das pessoas em situação de rua, das entrevistas realizadas e das experiências proporcionadas pela observação participante, foi possível perceber que as necessidades de saúde desse segmento vão muito além das mínimas necessidades básicas, como alimentação, higiene e tratamento de saúde, envolvendo, dentre outras, a necessidade de segurança física e psicossocial, a necessidade de ser visto como um ser humano digno de respeito, a necessidade de autonomia e a necessidade de acesso efetivo aos serviços públicos.

Uma dos importantes determinantes da saúde e da doença é a violência sofrida pelos moradores de rua, que afeta significativamente a qualidade de vida dessas pessoas e contribui para a manifestação de ansiedade, medo, nervosismo e insegurança diante dos perigos e das incertezas existentes na rua. Juntamente com o uso abusivo de drogas, a violência aparece como um problema vivenciado por boa parte os moradores de rua, expressando-se de várias formas, incluindo a violência da polícia e de vigilantes particulares sofrida pelos moradores de rua, preconceito e discriminação, a violência entre os moradores de rua (furtos, roubos, agressões e assassinatos) e a violência sexual sofrida pelas mulheres. Ser visto como um marginal, como sem valor na sociedade, é percebido como uma das piores formas de violência.

Dois relatos ilustram essa questão. Em uma das visitas à rua, chamaram atenção as implicações emocionais da agressão sofrida por um morador de rua, quando se encontrava à noite na “Praça do Banco do Nordeste”. Ele levantava a camisa e mostrava as marcas das agressões na costela. Mostrava, também, o Boletim de Ocorrência que tinha feito. Vigilantes de empresas particulares o haviam abordado na praça, por meio de violência física sem nenhum direito a defesa. Estava visivelmente transtornado, sua fala emocionada mostrava que o sofrimento decorrente da experiência vivenciada transcendia a dor física. Ele estava na rua em Fortaleza há apenas um mês. Era, portanto, a primeira vez que sofria uma agressão desse porte. Tentava superar o sentimento de impotência por meio da vontade de lutar contra seus agressores, de denunciá-los, de não aceitar facilmente a agressão. Repetia, constantemente, que a praça é pública, que qualquer pessoa pode sentar num banco e tomar uma dose de conhaque. Dizia-se trabalhador, repetia que não era um “vagabundo”.

Uma outra questão diz respeito à dificuldade de acesso aos estabelecimentos de saúde do município. De uma forma geral, os participantes da pesquisa apresentam-se insatisfeitos com o acesso, relatando que são mal atendidos e discriminados, especialmente pelo fato de serem moradores de rua, mal vestidos, não possuírem documentos nem endereço fixo e por chegarem desacompanhados. Um dos participantes entrevistados conta que certo dia, após ter sido agredido com um pedaço de pau na cabeça, dirigiu-se, todo ensangüentado, à delegacia de polícia para registrar a ocorrência, antes de procurar o serviço de saúde. Segundo ele, chegar ao hospital com um Boletim de Ocorrência era um recurso para não ser vítima de preconceito, mais especificamente, evitar não ser confundido com um criminoso. Não podemos negar que existem alguns serviços e profissionais de saúde que são mais preparados para lidar com essa população. No entanto, de uma forma geral, ainda há muitas barreiras de acesso para as pessoas em situação de rua.

Por Carlos Eduardo Esmeraldo Filho

Transcrito do jornal "O Povo" caderno "Vida e Arte": p. 7; Edição de 02 de maio de 2010
Carlos Eduardo Esmeraldo Filho é psicólogo e Mestre em Saúde Pública, autor da dissertação de mestrado intitulada: "Necessidade de Saúde dos moradores de rua:desafios para as políticas sociais do municipio de Fortaleza

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