Com quase dois metros de altura, atlético, retilíneo, educado, falante, risonho e de olhos azuis penetrantes, o distinto General, mesmo casado, logo caiu nas graças das mulheres autodenominadas “independentes” (divorciadas, viúvas, desquitadas, balzaquianas e até as casadas mal-amadas) que, tal qual o nosso eterno rei Roberto Carlos, vivem incansavelmente à procura de novas e fortes emoções; de outra parte, também viu-se paparicado por um certo segmento da imprensa fortalezense (a turma da “fofocagem”, da “babação”, do “puxa-saquismo”), responsável pelas colunas sociais dos jornais tupiniquins. O certo é que o imponente General, recém aposentado do exército brasileiro, e que fora rebocado lá do belo, frio e longínquo Rio Grande do Sul para atuar na área de segurança do governo estadual, já chegou causando boa impressão, um “frisson” danado.
E nos dias subseqüentes ao seu desembarque, isso só se confirmaria: é que, convidado quase que diariamente para festas e mais festas da alta sociedade, o esbelto General não só se fazia presente como - e principalmente - se destacava pela disposição irrefreada de rodopiar com desenvoltura pelos salões da vida (com a distinta esposa, evidentemente), fosse qual fosse o ritmo tocado (bolero, samba, pagode, mambo, rock, o escambau), para deleite e admiração dos presentes; aos primeiros acordes de um som qualquer, o distinto casal era o primeiro a adentrar a arena de dança e o último a sair; dizia-se, à boca pequena (para não parecer desrespeito), que era um autêntico “pé-de-valsa”, já que além de gostar realmente de bailar, parecia flutuar, com autoridade, leveza e elegância, acima dos mortais comuns. Um autêntico expert na nobre arte da dança.
Dia seguinte, no caderno do jornal destinado à fofocagem, os colunistas sociais eram pródigos, fartos e magnânimos com o General, ao realçarem sua forma física, sua desenvoltura, seu pique e sua simpatia nos salões, ao mesmo tempo em que recorrentemente teciam loas à tranqüilidade do evento, porquanto a segurança teria sido feita pelos... “soldados do General”. Enquanto isso, a manchete da primeira página do mesmo jornal, no mesmo dia, nos informava de mais um assalto que houvera sido praticado na cidade na mesma noite em que se realizara o evento, de mais um crime que houvera sido perpetrado na madrugada, de mais um acidente com vítimas, sem que o policiamento tivesse conseguido chegar a tempo de obstaculá-los. E o nosso nobre e distinto General, livre, leve e risonho a incansavelmente rodopiar, rodopiar e rodopiar pelos salões da vida; e a segurança dos salões sempre, sempre e sempre entregue aos “...soldados do General”.
Inconformados, redigimos um texto apropriadamente intitulado “Os soldados do General”, onde questionávamos se era correto, se era adequado, se constitucionalmente seria permitido que referidos militares se prestassem a “pastorar” festinhas particulares, enquanto a cidade de Fortaleza literalmente entregue estava não às baratas, mas a marginais de alta periculosidade que, acintosamente, pintavam e bordavam, faziam e desfaziam, casavam e descasavam, impunemente. O momento era tão crítico, no tocante à (in) segurança reinante em Fortaleza, e a argumentação que usamos para abordá-la de uma consistência tal, que a nossa carta foi aprovada e publicada completa, na seção destinada à manifestação dos leitores.
À noite do mesmo dia, aí pelas 23 horas, quando já nos havíamos recolhido, eis que o telefone toca insistentemente: uma, duas, três... até que no quarto “tilintar” o atendemos, ainda um tanto quanto sonolentos; não sabemos se devido ao silencio sepulcral da madrugada ou em razão da absoluta tranqüilidade reinante àquele momento, mas o certo é que “trememos nas bases” quando, do outro lado, ouvimos aquela voz cavernosa, autoritária, soturna e metálica perguntar se o senhor José Nilton Mariano estava; ao indagarmos quem queria falar com ele, a desagradável surpresa: "aqui é o Major Fulano, Chefe de Gabinete do General Beltrano” (do próprio).
Após a confirmação de sermos quem ele procurava, o “pedido” um tanto quanto inusitado (ou seria uma ameaça, não tão velada assim?): o “General Beltrano” MANDA LHE AVISAR que leu sua carta, publicada hoje no jornal tal; ele pede, no entanto, que o senhor procure ver o que vem sendo feito na área de segurança, que procure entender que se trata de uma área muito problemática, muito difícil, muito delicada, muito critica; que, enfim, tenha mais paciência e procure divulgar coisas boas e favoráveis, a respeito. Sensibilizados, agradecemos a deferência da insistente ligação àquela hora e aproveitamos para pedir ao distinto Major que, por favor, comunicasse ao nobre General que não se preocupasse, que quando houvesse necessidade, quando se fizesse preciso, quando ele merecesse, assim como havíamos tecido críticas, também estaríamos aptos a fazer elogios. Votos de boa noite, lado a lado. Estranhamente, dormimos sonhando com o General.
Meses depois, interstício durante o qual ainda conseguimos fazer publicar duas cartas (com teor similar), ironicamente o “pé-de-valsa” dançou solenemente, ao ser recambiado às pressas às suas origens (o Rio Grande do Sul), antes da data prevista; para manter as aparências (lembremo-nos que o homem era General do Exército aposentado) e não pintar sujeira no pedaço (na verdade, para esconder a inoperância ou inaptidão do dito-cujo para a função), convencionou-se, parte a parte, pela divulgação de uma nota oficial do governo onde, ao tempo em que lhe agradecia pelos “relevantes serviços prestados ao Estado do Ceará”, informava que o General partira de volta às origens por “...motivos particulares, de força maior” .
Em particular, ao tempo em que lamentamos profundamente, fomos tomados de uma grande frustração, certo constrangimento e decepção, uma preocupante tristeza, por não termos tido a oportunidade de cobrir o General de elogios, de mimos, de lantejoulas, de agrados mil, como ele, através do Major, tal expressara na fase crepuscular daquela noite.
Mas, a partir de então, quando dos badalados e recorrentes eventos sociais realizados em Fortaleza (e como os há em profusão), uma dúvida atroz teima em nos azucrinar a cachola: foi-se o distinto “pé-de-valsa”, é certo, mas será que os truculentos “soldados do General” (que permaneceram), continuam a se prestar ao “pastoreio” de eventos particulares ???
Será ??? A troco de quê ???
E nos dias subseqüentes ao seu desembarque, isso só se confirmaria: é que, convidado quase que diariamente para festas e mais festas da alta sociedade, o esbelto General não só se fazia presente como - e principalmente - se destacava pela disposição irrefreada de rodopiar com desenvoltura pelos salões da vida (com a distinta esposa, evidentemente), fosse qual fosse o ritmo tocado (bolero, samba, pagode, mambo, rock, o escambau), para deleite e admiração dos presentes; aos primeiros acordes de um som qualquer, o distinto casal era o primeiro a adentrar a arena de dança e o último a sair; dizia-se, à boca pequena (para não parecer desrespeito), que era um autêntico “pé-de-valsa”, já que além de gostar realmente de bailar, parecia flutuar, com autoridade, leveza e elegância, acima dos mortais comuns. Um autêntico expert na nobre arte da dança.
Dia seguinte, no caderno do jornal destinado à fofocagem, os colunistas sociais eram pródigos, fartos e magnânimos com o General, ao realçarem sua forma física, sua desenvoltura, seu pique e sua simpatia nos salões, ao mesmo tempo em que recorrentemente teciam loas à tranqüilidade do evento, porquanto a segurança teria sido feita pelos... “soldados do General”. Enquanto isso, a manchete da primeira página do mesmo jornal, no mesmo dia, nos informava de mais um assalto que houvera sido praticado na cidade na mesma noite em que se realizara o evento, de mais um crime que houvera sido perpetrado na madrugada, de mais um acidente com vítimas, sem que o policiamento tivesse conseguido chegar a tempo de obstaculá-los. E o nosso nobre e distinto General, livre, leve e risonho a incansavelmente rodopiar, rodopiar e rodopiar pelos salões da vida; e a segurança dos salões sempre, sempre e sempre entregue aos “...soldados do General”.
Inconformados, redigimos um texto apropriadamente intitulado “Os soldados do General”, onde questionávamos se era correto, se era adequado, se constitucionalmente seria permitido que referidos militares se prestassem a “pastorar” festinhas particulares, enquanto a cidade de Fortaleza literalmente entregue estava não às baratas, mas a marginais de alta periculosidade que, acintosamente, pintavam e bordavam, faziam e desfaziam, casavam e descasavam, impunemente. O momento era tão crítico, no tocante à (in) segurança reinante em Fortaleza, e a argumentação que usamos para abordá-la de uma consistência tal, que a nossa carta foi aprovada e publicada completa, na seção destinada à manifestação dos leitores.
À noite do mesmo dia, aí pelas 23 horas, quando já nos havíamos recolhido, eis que o telefone toca insistentemente: uma, duas, três... até que no quarto “tilintar” o atendemos, ainda um tanto quanto sonolentos; não sabemos se devido ao silencio sepulcral da madrugada ou em razão da absoluta tranqüilidade reinante àquele momento, mas o certo é que “trememos nas bases” quando, do outro lado, ouvimos aquela voz cavernosa, autoritária, soturna e metálica perguntar se o senhor José Nilton Mariano estava; ao indagarmos quem queria falar com ele, a desagradável surpresa: "aqui é o Major Fulano, Chefe de Gabinete do General Beltrano” (do próprio).
Após a confirmação de sermos quem ele procurava, o “pedido” um tanto quanto inusitado (ou seria uma ameaça, não tão velada assim?): o “General Beltrano” MANDA LHE AVISAR que leu sua carta, publicada hoje no jornal tal; ele pede, no entanto, que o senhor procure ver o que vem sendo feito na área de segurança, que procure entender que se trata de uma área muito problemática, muito difícil, muito delicada, muito critica; que, enfim, tenha mais paciência e procure divulgar coisas boas e favoráveis, a respeito. Sensibilizados, agradecemos a deferência da insistente ligação àquela hora e aproveitamos para pedir ao distinto Major que, por favor, comunicasse ao nobre General que não se preocupasse, que quando houvesse necessidade, quando se fizesse preciso, quando ele merecesse, assim como havíamos tecido críticas, também estaríamos aptos a fazer elogios. Votos de boa noite, lado a lado. Estranhamente, dormimos sonhando com o General.
Meses depois, interstício durante o qual ainda conseguimos fazer publicar duas cartas (com teor similar), ironicamente o “pé-de-valsa” dançou solenemente, ao ser recambiado às pressas às suas origens (o Rio Grande do Sul), antes da data prevista; para manter as aparências (lembremo-nos que o homem era General do Exército aposentado) e não pintar sujeira no pedaço (na verdade, para esconder a inoperância ou inaptidão do dito-cujo para a função), convencionou-se, parte a parte, pela divulgação de uma nota oficial do governo onde, ao tempo em que lhe agradecia pelos “relevantes serviços prestados ao Estado do Ceará”, informava que o General partira de volta às origens por “...motivos particulares, de força maior” .
Em particular, ao tempo em que lamentamos profundamente, fomos tomados de uma grande frustração, certo constrangimento e decepção, uma preocupante tristeza, por não termos tido a oportunidade de cobrir o General de elogios, de mimos, de lantejoulas, de agrados mil, como ele, através do Major, tal expressara na fase crepuscular daquela noite.
Mas, a partir de então, quando dos badalados e recorrentes eventos sociais realizados em Fortaleza (e como os há em profusão), uma dúvida atroz teima em nos azucrinar a cachola: foi-se o distinto “pé-de-valsa”, é certo, mas será que os truculentos “soldados do General” (que permaneceram), continuam a se prestar ao “pastoreio” de eventos particulares ???
Será ??? A troco de quê ???
2 comentários:
Nilton, a coisa está como aquele português em cujo bigode fora pincelada algumas gramas de excrementos pútridos. Após cheirar tantos compartimentos e com a cabeça para fora de uma janela grita: é o mundo todo. Então, estes mesmos "pés-de-valsa" sambam atrás de grades, vigiado por milhares de câmaras de segurança, rodeado de homens privados armados, dentro de cabines blindadas e vidros fumê. A polícia até anda em lindas camionetes, com o salário vulnerável, fazendo ocorrência da segurança de pós fato.
Engraçada essa visão do Zé Nilton , que me faz repensar minha visão romântica ! Claro, que preciuso disso !
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