Criadores & Criaturas



"Penetra surdamente no reino das palavras.
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Estão paralisados, mas não há desespero,
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"

(Carlos Drummond de Andrade)

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Colaboração:Claude Bloc


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sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

As companheiras respeitáveis do Aragão – Por Carlos Eduardo Esmeraldo

Meu irmão Aílton tem um cunhado, Antônio Moreira Aragão, mais conhecido por Aragão, há vários anos residente na Bahia, onde parece haver criado juízo. Enquanto morou no Crato e em Fortaleza, Aragão foi uma fonte de preocupações para seus pais. Aprontou muito, tanto lá, quanto cá.
Como animador de festa, Aragão se transformava na própria festa. Sempre era arrodeado por crianças, que acompanhavam atentas às suas brincadeiras. Em certas ocasiões, ele se transformava em mágico, para encantamento de adultos e crianças.

Numa reunião de aniversário na casa de Aílton, Aragão fez sumir, como que por encanto, uma nota de cem cruzeiros amarrada em um lenço, à vista de todos os presentes. Depois desatava o lenço vazio. Como os mágicos profissionais, ele não deixava ninguém perceber como subtraíra a cédula de dentro do lenço antes de dar o nó. E todos procuravam onde estava a nota, principalmente o dono dela, no caso, o meu irmão Aílton, para em seguida encontrá-la repousando no bolso da calça do Aragão.
Certa vez, Aragão, recém-chegado de Fortaleza, saiu sozinho para se divertir no Aquarius, uma casa noturna do centro da cidade do Crato. Lá chegando, sentou-se a uma mesa, onde já se encontravam quatro adolescentes. Então começou a conversar com as meninas, num desembaraço sem igual, imitando um carioca e se dizendo recém-chegado do Rio de Janeiro. Uma delas, que ainda era criança quando Aragão saiu do Crato para Fortaleza, notou que ele não a havia reconhecido, e disse para as companheiras:
– Esse cara é um enrolão. Ele não é carioca coisa nenhuma. É um roedor de pequi aqui mesmo do Crato.
– Pô, você está muito enganada. Esta é a primeira vez que venho aqui nesta cidade. Não sei nem o que é essa coisa que você falou aí sobre roer. Você deve estar me confundindo com outra pessoa. – disfarçou o pseudo-carioca, procurando carregar mais ainda no sotaque.
– Que nada, você não me engana, não. Eu o conheço. Você é Antônio Aragão, filho de dona Ivone, que mora lá perto do Cine Moderno!
– Ai, é mesmo! – respondeu concordando, admirado e surpreendido pelo flagrante, o roedor de pequi.
Numa época em que a nossa sociedade era mais exigente na pureza da elite e na seletividade de seus membros, ter aceso a um clube social somente sendo sócio. Em dias de festa, era exigido traje passeio completo para os homens. O Crato Tênis Clube, réplica perfeita do Maguari em Fortaleza, realizava as mais memoráveis festas. A da Rainha do Algodão, então, era a mais concorrida.
Segundo meu irmão, que tomou conhecimento do fato algum tempo depois, numa dessas festas a rigor, Aragão saiu direto da boite de Glorinha, uma famosa casa de prostituição, onde se encontravam as mulheres de vida livre, porém não tão fácil, como se dizia. Lembrando-se da festa, convidou duas das mulheres daquela casa para o acompanharem até o Crato Tênis Clube. As mulheres, recém-chegadas da Bahia, aceitaram o convite, achando ser prova de muita consideração e uma delicadeza daquele jovem. Era uma dessas festas na qual a fina flor da sociedade cratense acorria. Ao tentar ingressar no clube, Aragão foi barrado pelo porteiro, que polidamente se dirigiu a ele pelo primeiro nome:
– Antônio, você pode entrar aqui a qualquer hora, mas elas duas não podem entrar.
– Por quê? – quis saber o cunhado do meu irmão.
– Porque estas duas donas que estão com você são suspeitas.
– Suspeitas, uma ova! Suspeitas são aquelas que estão aí dentro do clube. Estas duas aqui são mesmo! Não resta a menor dúvida! – falou indignado Aragão.
Após essa resposta, Aragão saiu com suas companheiras para o Restaurante do Ferrer, em Juazeiro, onde acontecia uma festa bem mais liberal.

Extraido de "Histórias que vi, ouvi e contei" de Carlos Eduardo Esmeraldo, Premius Editora, Fortaleza, 2005

5 comentários:

Aloísio disse...

Carlos

Você nos brindando com suas histórias recheadas de humor.

Abraços
Aloísio

Claude Bloc disse...

Eita, Carlos,

Além do humor, você abriu a tampa do baú de memórias, hem?

Adorei passear pelo seu enredo. E a maneira de contar tem a sua cara. (risos)

Abraço a você e Magali.

Claude

P.S.Estou indo ao Crato daqui pro dia 14...

Edilma disse...

Carlos,

Feliz de quem tem um livro seu para se deliciar com suas crônicas, como eu.
Esta então é ótima!

Feliz Ano Novo !

Carlos Eduardo Esmeraldo disse...

Caro Aloísio

Cuidado com o Aragão pois hoje ele é um delegado aí na Bahia. Obrigado por seu comentário.

Claude e Edilma

Grato pela publicidade do meu livrinho. Se a edição não estivesse esgotada (caiu no esgoto do canal do Rio Grangeiro) iria ser vendidos os estoques que por acaso ainda existissem ....rs.rs.rs

Carlos Eduardo Esmeraldo disse...

Só para retificar uma letra que faltou no comentário acima: "iriam ser vendidos os estoques..."