Como descobrimos as coisas!
Certa vez, minha querida tia Aldinha, perguntou-me se queria ir com ela até o Juazeiro (do Norte). Imaginem vocês, ir ao Juazeiro, na época, era uma pequena viagem, um passeio. Acordávamos cedinho, tomávamos o ônibus na esquina da rua Dr João Pessoa com a , passávamos pelas ruas da Cruz, Pau do guarda, São José, e o ônibus seguia, parando a cada minuto para pegar passageiros, que também iam para a cidade de “Meu Padrinho”.
Chegando em Juazeiro, Aldinha fez o que tinha pra fazer por lá, e se lembrou de uma grande amiga que havia se mudado há pouco tempo do Crato para aquela cidade. Era Lírida. Pois fomos à casa dela, que era uma professora querida, irmã de D. Celide. No Crato, elas moravam perto do Tabaja Hotel, e no quintal dessa casa havia um pé de cajarana, com frutas doces parecia mel...Lírida nunca se esquecia de mandar, por nós, uma cesta de frutas para minha avó e, claro, nós comíamos um bocado delas no caminho.
Mas, desta vez, Lírida tinha-se mudado. Chegamos à residência dela e recebemos a recepção calorosa da mãe da professora. Sentamos na sala, e Aldinha, lembro-me, já tinha feito as recomendações de praxe, para que eu ficasse "sentadinha", "comportada", sem pedir nada. Não podia, também, meter-me em conversa de adultos. Obedeci direitinho, sentei numa cadeira, em frente a uma parede que tinha um quadro fixado, medindo aproximadamente 60X40 cm. A foto emoldurada era de um homem de corpo inteiro, vestido com um uniforme verde impecavelmente engomado, com um braço levantado para o alto. Enquanto minha tia conversava, eu olhava aquela figura, achando muito bonito e imponente quela postura. Quando terminou a visita, saímos e foi quando perguntei à Aldinha: quem era aquele homem do quadro e porque ele estava daquele jeito. Ela me respondeu baixinho, e de forma estranhamente cúmplice, que ele era integralista, e o braço levantado era uma saudação em que falava “Anauê”. Essa imagem nunca mais saiu de minha cabeça, e me instigou a ler sobre o que foi o integralismo no Ceará. Soube, mais tarde, que o movimento foi muito forte no Estado, tendo inclusive contado com a participação da igreja, tendo D. Helder Câmara atuado como membro, e ocupado cargo equivalente ao de um Secretário de Educação. Apenas o Ceará levou um Integralista ao poder. Esse movimento tinha como lema Deus, Pátria e Familia.
Maria Amelia Castro
2 comentários:
Mélia, acho que o homem da sua lembrança foi reencontrado !
Sobre o Integralismo tenho poucas informações pessoais( faltou-me vivência). Os assuntos políticos , na nossa infância e adolescência eram mantidos em sigilo.
Quanto ao seu passeio com Aldinha , revi-me com a minha mãe, em tantas oportunidades. Eu chorava, quando ela não me levava. Íamos às compras.
Dona Lírida foi minha professora primária, no Instituto S.Vicente Férrer. Uma grande figura, ternamente lembrada.
Acrescento que, visitávamos no Juazeiro , eu minha mãe e Dona Hilda ( irmã do Pe. Xavier) a casa de Dona Amália Xavier.
Sobre Dona Amália gostaria de ter mais informações ... Mas como você mesma falou , só nos permitiam acompanhá-las se ficássemos literalmente invisíveis. E assim, obedecíamos.
Gosto muitíssimo da tua forma de expressão. Linguagem limpa e personal. É ótimo ler você, menina !
Um abraço carinhoso.
Esta Amélia do texto não é para mim uma só pessoa: é uma corrente da vida. São tantas Amélias em minha vida, apenas por uma, baixinha, carinhosa, nunca ninguém foi mais do Cariri do que ela. Esta primeira Amélia vingou oito filhos como terceira esposa, tinha menos idade que as enteadas e, no entanto, se tornou o centro desta família quando o coronel morreu. Amélias são assim: caladinhas, discreta como um vulcão entre uma erupção e outra. Dando mais norte à imagem:a Amélias são como um vulcão sob o qual corre os magma e pelo sua cratera os discretos vapores do coração do mundo. E por esta Amélia é bom lembrar que quase todo o clero do Crato na metade dos anos 30 e começo dos 40 era integralista. Inclusive o Câmara Cascudo onde a Socorro postou a palavra Anuê.
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