A alma de Chico Mendes
O livro Chico Mendes - Crime e castigo é um livro reportagem, que sem nenhuma isenção, revela ao leitor uma luta dentro de um ambiente bárbaro e injusto, tendo um final que apesar de trágico terminou vitorioso.
O território acreano foi palco de disputas e de muitas injustiças. Mas também foi cenário de um mártir, que chamou a atenção para a gravidade dos problemas relacionados à floresta Amazônica, seu nome era Chico Mendes. O assassinato deste sindicalista foi o ponto de partida de muitas das mudanças ocorridas no país, e Zuenir nos apresenta em seu livro essa história de uma maneira muito pessoal.
Um líder seringueiro cuja morte estava anunciada, e que com bravura suportou no campo de batalha até seu assassinato. Um visionário que aprendeu a ler aos 20 anos, e que defendia o fim do desmatamento da Amazônia, soluções para o extrativismo e a produção auto-sustentável para as famílias da região. E ninguém melhor para biografar a sua causa que Zuenir Ventura, um não tão jovem jornalista de renome, com mais de trinta anos de carreira e que, conseguiu revelar em seu livro a verdadeira alma de Chico Mendes.
Apesar da chegada do jornalista ao Acre ter sido póstuma, o resgate ao passado do líder relatado em seu livro foi tão preciso que se percebia sua personalidade, sem nem ao menos conhecer o seringueiro pessoalmente. E Zuenir nunca havia estado com ele.
A obra foi dividida em três partes, sendo a primeira a chegada de Ventura a Xapurí, no Acre, em 1988, logo após a morte de Chico Mendes, num clima de conflito e de ameaças, a segunda, em 1999, a volta para o tão esperado julgamento dos acusados e a terceira, em 2003, o reencontro e a surpresa de ver um Acre mais calmo e com fazendeiros dispostos ao diálogo. A evolução do Acre relatada pelo escritor, expõe o marco da mudança ocorrida após a morte do líder.
Num clima de conflito, Zuenir Ventura relata no seu livro não só a história de Chico Mendes, mas sua própria história, contada sobre o ponto de vista humano e não de um profissional que almeja um grande furo, mas como um ser comum que deseja a justiça aos culpados.
Ao se integrar àquela realidade, longe do badalado eixo Rio - São Paulo, o autor mergulha num universo de sobrevivência, onde expõe a causa amazônica como não se vê comumente em outras regiões do país. Num determinado momento da sua viagem, finge ser um turista para obter informações sobre o caso. Uma atitude como essa, frisa que todo jornalismo é investigativo e que, não há como prever certas atitudes quando estamos bastante envolvidos na trama. Outro momento de solidariedade foi quando levou o menino Genésio que estava sendo ameaçado para o Rio de Janeiro, para sua própria casa. Ele vê na sua frente um apelo, como o de Chico Mendes, mas ali ele tinha a chance de ajudá-lo. Com esse gesto, Zuenir torna-se coadjuvante da história. Em momento algum esconde indignação com os envolvidos que estavam livres e políticos que queriam apenas notoriedade, nem tampouco sua admiração pelos poucos competentes que ajudaram na apuração do caso. Explicitava sua consciência e crítica a todos os seus personagens.
Ser jornalista foi primordial nesse momento, mas o coração foi além. Zuenir se misturou ao povo, foi sensível e curioso, e mais que isso, se apaixonou pela causa, e é exatamente essa a alma do repórter, desenvolver um papel social, de propriedade da humanidade e não só de interesses particulares. Um exemplo de coragem, faro aguçado e um espírito de aventura, amor e respeito à natureza.
Esse livro nos revela que não existe imparcialidade jornalística onde há sentimento.
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