Criadores & Criaturas



"Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
"

(Carlos Drummond de Andrade)

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... Por do Sol em Serra Verde ...
Colaboração:Claude Bloc


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terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

Uma Reparação - por Glória Pinheiro

Um familiar próximo certa vez descobriu a oitava maravilha do mundo ao submeter-se a terapia de regressão à vidas passadas. Desde então, insistia para que eu fosse pois o tratamento nos levaria a um auto-conhecimento. Confesso que fiquei curiosa mas não dei importância na ocasião. Num belo dia resolvi submeter-me ao maravilhoso mundo novo da descoberta do meu eu interior. Pude constatar que não eram charlatãs as duas psicólogas que trabalhavam em conjunto, formadas, com curso de especialização para tal. Até hoje temos contato de amizade com a terapeuta titular. Nas oito das dez seções previstas, fui um médico londrino, dedicado, introspectivo e solitário; uma freira puritana que viveu na Idade Média; e um menino indiano pertencente a uma determinada casta que precisava ser doutrinado com alguns dogmas, porém, o menino não aceitava tais imposições e ensinamentos dos pais no que resultou sua fuga da casa paterna... Não sei explicar mas me identifiquei com algumas características dos três personagens.

Volto ao Crato, me vejo criança, na sala de estar, num ambiente aquecido e aconchegante, quando escuto: "Vão brincar em outro local, a conversa é só para adultos". Retruco em meu pensamento: "Estava tão bom esse aconchego familiar", - sempre havia alguém da família que não morava em nossa casa, - "Para que nos privar daquele convívio caloroso?", "O que vão conversar que não podemos escutar?", e, ainda, "Por certo estão querendo nos proteger". No final das contas ficava tudo muito mal esclarecido, o que me fazia sentir de "short curto", incomodada por ter que ceder aquela exclusão.
Bem diferente do que aconteceu anos depois...
Um casal de amigos, ele português, ela brasileira. Dois filhos. Todos os anos costumavam viajar à Portugal. Numa dessas viagens o casal resolveu viajar à Suiça. Foram explicar aos filhos que eles não iam viajar, ficariam na casa dos avós. Quando estavam esclarecendo que a viagem era para adultos um dos filhos retrucou: Já sei porque não podemos ir, é porque vocês vão fazer "cenas obscenas".

Retornando ao Crato, sinto-me uma criança extremamente infeliz. Quanta infelicidade por terem me dado o nome Glória e ainda por cima ser afilhada de batismo de um padre. Oh! Quanta infelicidade! Já adolescente, vindo do Colégio, quando passava ali em torno do Crato Tenis Clube quando percebo dois garotos que moravam na região cochicharem baixinho e deixarem escapar de propósito o nome Glorinha. Cheguei em casa me debrucei na cama e me pus a chorar. Fui envolvida de um sentimento da mais infeliz das criaturas. Podia admitir que minha tia paterna e madrinha, carinhosamente me chamasse Glorinha bem como meus familiares que moravam em Recife, mas, de algum menino inconsequente era muita ofensa para mim.

Quanto a ser afilhada do inesquecível Padre Gomes, passei minha infância e parte da adolescência sem conseguir aceitá-lo como padrinho de batismo. Entendia que a função de um padre era de batizar e não de apadrinhar. Sentia medo dele. Todas as vezes que estava em companhia dos meus pais tinha por obrigação pedir-lhe a benção e beijar-lhe a mão o que para mim era uma tortura apesar de sempre ele ser cordial e simpático. Quando, entre 1960 a 1962 o bondoso Padre Gomes foi hospitalizado devido a uma cirurgia, "a ordem do dia", era a indispensável visita ao padrinho. Não lembro os argumentos utilizados, mas, um deles foi o medo que tinha de hospital, então, meus pais acabaram cedendo e a visita não aconteceu. Depois de adulta fiquei agradecida em tê-lo como padrinho por isso, na tentativa de fazer uma reparação, em uma das últimas viagens ao Crato, adquiri através de uma de suas sobrinhas e herdeira algumas relíquias que pertenceram ao Padre Gomes, como também alguns de seus livros.

Dedico este à Claude Bloc e Socorro Moreira



Por: Glória Pinheiro

8 comentários:

socorro moreira disse...

Muito interessante o seu relato. Muito feliz , a sua presença no Cariricaturas.

Você sabe o quanto é querida por nós !


Abraços.

Claude Bloc disse...

Glória,

Antes de tudo, quero lhe agradecer pela dedicatória do seu texto.

Depois, quero lhe dizer que no seu texto você foi fiel à imagem da Glória que eu conheci no Pimenta. Havia, sim, em você esse misto de características frisadas na sua história: arredia (algumas vezes), puritana (em outras) e ficava vermelhinha de vergonha em tantas outras situações...

Quanto ao seu nome, Glória, devia gostar dele, pelo que ele significa e pela homenagem e N. S. da Glória, assim como Gracinha seria a N. S. das Graças...

Eu também não gostava de meu segundo nome - Berthe - mas hoje sei que foi uma homenagem a minha bisavó paterna de mesmo nome e até gosto disso e de muita coisa que eu bestamente repudiava.

A gente é assim,né? Complica o que é tão simples...

Abração e obrigada por estar por aqui...

Claude

Glória Pinheiro disse...

Obrigada querida Socorro.

Claude, há muito tempo me acertei com meu nome. Você esquece que antes existia uma "senhorita" no Crato que não era nenhum bom exemplo para uma matutinha tímida como eu? (risos).

Um abraço nas duas poetas queridas.

Glória

Glória Pinheiro disse...

Matuta, tímida, encucada e puritana demais da conta! rsrsrs

Claude Bloc disse...

Glória,

Eu sei a quem se refere... e sei como isso pesa na cabecinha de uma criança... Mas veja, seu nome sempre se manteve sem nenhum diminutivo... e nunca ninguém ousou lhe ofender, né?

Eita... Tá ouvindo as palmas? Tão lhe chamando... rss

Abraço,

Claude

Emerson Monteiro disse...

Glória,

Boas as suas revelações a propósito de seu conhecimento da "terapia de vidas passadas", que refuto ser um dos avanços da ciência psicológica.

Saúde e Paz.

Heladio disse...

Prezada Glória
Meus parabéns, pela sua evolução espiritual. Como médico, confesso, que anteriormente eu era totalmente incrédulo. Mas tudo tem o seu tempo. Hoje sou mais do que convicto, quanto a esta realidade.
Um grande abraço fraterno
Heládio

Glória Pinheiro disse...

É, Claude, nunca ninguém querido ousou me ofender.
Não para voltar ao tempo, gostaria de ouvir as palmas para ainda tê-la presente entre nós.

Emerson e Heládio: Obrigada pelos comentários. A experiência foi válida. Afinal estamos aqui para aprender.

Um abraço fraterno

Glória