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Estão paralisados, mas não há desespero,
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(Carlos Drummond de Andrade)

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quinta-feira, 24 de junho de 2010

Branquinha foi encantada - por José do Vale Pinheiro Feitosa

Branquinha foi encantada pela enxurrada. Era uma cidade entre os morros surrupiados de sua Mata Atlântica. Até ficou com aquela paisagem de jardim, com algumas ilhas da vegetação original e a modelagem verde clara do canavial sobre os morros. Como um jardim programado, no qual no meio da mesmice canavial a lembrar um gramado, surgem surpresas como um Ipê Amarelo e mais belo quando fazem um grupo de cinco ou seis.

Procure pela sua geografia e verás que Branquinha está a caminho da Serra da Barriga, onde se fez o Quilombo dos Palmares. Ali pelas redondezas ficam duas cidades com a referência dos Palmares. E não sei por que tanto palmeiral se tudo era vegetação da velha Mata Atlântica. Pensando bem, eu sei: tudo se ampliou por causa de Zumbi.

Branquinha é a juntada de muitos sítios que se criaram desde o século XIX às margens do Rio Mundau. Isso foi ocorrendo dentro do município de Murici, mas a partir de 1955, Branquinha queria ser ela mesma, começou a luta de emancipação e a conquistou em 1962. Quando foi encantada, a cidade já andava pelos seus 12 mil habitantes.

Branquinha de vez em quando freqüenta o noticiário dos jornais de Alagoas. Mas isso não a torna diferente de outras cidades do mesmo tamanho que igualmente rompem o anonimato no noticioso. Normalmente são fatos de violência humana que parecem ser uma grande novidade para vender jornal, quando todo mundo sabe o quanto é monótona a repetição destes fatos.

Branquinha se tornou uma referência na Saúde Pública. Não foi por que ali tivesse sido feita uma grande descoberta (assim como Piumhi em Minas Gerais que aparece por que ali Carlos Chagas fez os estudos da doença que leva o seu nome). Nem por que lá tivesse nascido um grande sanitarista. O motivo foi mais prosaico.

Durante a fase de intensificação da campanha de erradicação da varíola Branquinha entrou para história, involuntariamente, por comportamentos humanos condenáveis. Por volta de 1966 chegou à cidade uma equipe de vacinadores com o objetivo de fazer uma vacinação em massa contra a varíola. Ao final das atividades os relatórios vitoriosos mostravam que mais de 100% da população tinha sido vacinada.

Nem bem deu dois meses e a cidade teve um grande surto de varíola. Ninguém entendeu nada e a hipótese é que a qualidade da vacina era ruim. Mas se comprovou ao contrário, era uma excelente vacina. Foram pesquisar se havia cicatriz vacinal (a vacina evoluía e deixava uma pequena cicatriz no local da aplicação) e não havia, menos ainda naquelas proporções do relatório. Aquela falsidade fez o país reestrutura suas ações, incluindo um monitoramente pós vacinação.

Passei neste último dezembro por ela e até a fotografei vista desde a sua entrada na BR 104. Hoje pode ser que ainda tenha a mesma imagem. Só até aí, pois para dentro para os lados do Rio Mundau não poderia mais. Tudo se encantou. E por um tsunami.

Foi o aquecimento global? Foi desmatamento, foi redução do leito de drenagem das águas foi tudo isso. Mas o que parece ter sido mesmo é que as chuvas, apesar de fortes, não justificariam tudo aquilo. O que parece ter acontecido foi uma cadeia de barragens estouradas, uma atrás da outra ao longo dos afluentes e do próprio rio Mundau. Uma catástrofe de engenharia privada, por certo com recursos públicos. A vida precisa mesmo de democracia e cuidados.

Mas poderia ser outra a causa: tanta gente morando às margens dos rios, tantas alterações nos terrenos que formam a bacia de escoamento das águas. Uma cadeia de diversos eventos que um dia explode.

Como se viu em Branquinha e nos demais municípios, até pequenas barragens no fluxo das águas, mesmo que segurem as enchentes, podem ter seu dia Chernobyl.

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