Bermudão
Após um dia de trabalho
(todas as escamas
caíram dos dedos)
sobra o sol guardado
no bolso das pálpebras
para que a noite
não gele tanto.
É rotina esse sol ao entardecer
no instante em que a última
andorinha suspira:
"hora de alimentar
os sonhos."
Acredito nas andorinhas
(afinal sou um sonhador)
e mergulho os olhos
ainda mais vermelhos
dentro do copo
até a borda cheio
das lágrimas que lutam
contra todo tipo de lucidez.
Longe do que se chama
saudade ou alma
não penso
em outra coisa
senão pôr de molho
meus pés e amanhecer
com um cigarro entre
os dentes.
Mas não é simples
fumar quando não
se fuma e chorar
quando não se tem
nem lágrima
nem sonho.
Para ser sincero
e falar a verdade,
basta-me agora uma ninfa
com os cabelos molhados
pingando espuma de sabonete
sobre meus chinelões
vindo aos requebros
à minha direção.
Apenas isso.
Não é pedir muito.
Mas os deuses
(ah, os deuses)
nunca foram
meus camaradas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário