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Estão paralisados, mas não há desespero,
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"

(Carlos Drummond de Andrade)

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Colaboração:Claude Bloc


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terça-feira, 1 de setembro de 2009

A DOR, O INFORTÚNIO E OS RITUAIS DA MORTE





Os antropólogos têm definido os rituais como uma característica de todas as sociedades humanas, grandes ou pequenas. É uma parte importante da sociedade e da maneira como ela celebra, mantém, e renova o mundo em que vive inclusive o infortúnio. Os rituais ocorrem em vários ambientes, adotam formas diversas e desempenham muitas funções tanto sagradas como seculares. Segundo observa Turner, “o ritual é uma afirmação periódica dos termos sob os quais os membros de uma cultura determinada devem interagir para que haja determinado tipo de coesão na vida social”.
Outro dia li aqui no Blog uma manifestação de pesar e reflexão do Dr. João Marni frente a manifestação de familiares sobre o falecimento de uma criança e o paradigma não superado da classe médica com relação ao binômio dos rituais de cura/doença/morte e a confrontação das limitações impostas pelo insucesso da terapêutica e das outras forma de intervenção sejam elas de natureza clínica ou cirúrgica que o caso requer e são adotadas e tudo que implica se o desfecho for a morte do paciente. Ele como psicólogo tem elementos suficientes para o entendimento dessa subjetividade e deste verdadeiro ENIGMA de todas as pessoas variando de grau frente ao tipo de “cultura e sociedade”. Hetrz observou os costumes funerários, ritual de transição social entre a morte e o luto e encontrou aspectos comuns entre eles. Na maior parte das sociedades humanas, as pessoas têm, efetivamente, dois tipos de morte: uma biológica e outra social. Entre os dois, há um “período de tempo variável”, que pode durar dias, meses ou até anos. Enquanto que a morte representa o fim do organismo humano, a “morte social” é o fim da identidade social do indivíduo. A morte social ocorre num processo que compreende uma série de cerimônias, incluindo o funeral, no qual a sociedade oficializa a despedida de um dos seus e reafirma sua continuidade sem ele. Hertz resalta que, na maioria das sociedades não ocidentais, a morte não é vista como um acontecimento isolado no tempo, mas como um processo através do qual o indivíduo recém-falecido é transferido da terra dos vivos para a dos mortos. Simultaneamente, há um período de transição entre as identidades sociais de “pessoa viva” e à “ancestral morto”. Durante esse período intermediário entre a morte biológica e a morte social final, considera-se que a alma do falecido encontra-se num estado de “limbo”. Isto é, ela ainda é considerada como membro (parcial) da sociedade, mas potencialmente perigosa para as outras pessoas, por estar “vagando livremente”. Na fase de transição, a alma ainda tem alguns direitos sociais, especialmente sobre seus familiares e amigos em luto. Estes devem realizar determinadas cerimônias, comportar-se e vestrir-se de modo especial e, geralmente isolar-se da vida em comum. Devo lembrar que em tempos não muito distantes e ainda perdura em sociedade de cidades do interior rural, o simbolismo da traja de pano preto no braço ou na camisa, ou o luto fechado (vestir-se de preto) e outros rituais simbólicos. Assim como a alma do morto, eles também se encontram num estado socialmente ambíguos entre identidade, perigosos tanto a outras pessoas e a si próprios. Em muitas culturas, uma viúva recente é proibida de casar novamente durante um determinado tempo após a morte do marido. A viúva na visão de Hertz também é um estado intermediário, pois a viúva ainda está casada com a alma do marido até o final da morte social.
Na nossa cultura esse valor é posto em discussão pela decisão pessoal da mulher frente aos seus sentimentos e sua liberdade de escolha. Seu livre arbítrio, o que não impede haver censura por parte de da sociedade e seus preconceitos e outros sentimentos inclusive os da própria família.

Se observarmos algumas culturas, por exemplo: a Malásia, o cadáver é inicialmente enterrado em caráter temporário durante sua decomposição, para então ser sepultado definitivamente – meses ou anos depois- numa cerimônia fianal. O interessante é que ele é considerado pertencente exclusivamente ao mundo em que deixou. Cabe aos vivos a tarefa de prover o alimento do morto até a cerimônia final. O funeral final define o fim da sua existência quando ele renasce para o mundo dos “seus ancestrais”.

Eisenbruck descreve algumas cerimônias de despedida padronizadas culturalmente em diversos grupos sociais e culturais dos Estados Unidos – incluindo negros urbanos, chineses, italianos, gregos, haitianos latinos refugiados e do sudeste asiático. Nela estão presentes as variações de crenças e costumes relacionados ao luto. No nosso sertão há uma prática de se preparar verdadeiros “banquetes” para o velório, dependendo das posses da família traço comum na sociedade Irlandesa e outras. Para os Judeus Ortodoxos, o shib ah possui uma estrutura bem definida de luto que duram sete dias posteriores ao funeral. Os indivíduos da família permanecem em suas casas recebendo visitas de pêsames, vestem luto por trinta dias, e durante um ano priva-se de diversões. Um ano mais tarde com a inscrição na lápide encerra-se esse ciclo de luto. Nós ocidentais cristãos de tradição judaica pelo hífen da ligação de Jesus Cristo e a Bíblia Sagrada, incorporamos alguns desses rituais.. Embora haja determinadas constantes no modo como os seres humanos sofrem pela morte, não se pode afirmar que os estados de sofrimento ocorram na mesma proporção em culturas diferentes, ou que obedeçam à mesma seqüência. Portanto, há grandes variações entre as práticas de luto dos diferentes grupos sócias, crenças, valores e cultura. Um traço comum a todos é a DOR e o SENTIMENTO DE PERDA, que com o passar do tempo tende a transformar-se em uma doce saudade.




Leitura recomendada: Hertz, R. Death and the Right Hand. Londres: Cohen & West. p.27-86

Turner,V.W. The Ritual Process.Londres: Harmoddsworth Penquin, 1974.



3 comentários:

Liduina Belchior disse...

Nilo,
A morte em si culmina com o final de uma história, de uma vida, de muitas vidas e até de uma populaçaõ.Para nós,estudiosos da mente humana,ainda existe mais um tipo de morte: a fenomenológica.Que passa por uma simples mudança de cidade, a ida para um asilo ou ainda o desinteresse total pela vida terrena.Voltando para a morte social,nós temos o caso de um cantor nosso;que por delatar algumas pessoas durante o Regime militar,provocou em vida sua morte socialmente falando, e por que não fenomenológicamente também???? Você sabe de quem estou falando.
Sua morte biológica foi apenas o complemento da primeira.

Quanto aos rituais existem muitos e muitos em diferentes culturas.Eu,particularmente, acredito no grande encontro Divino nos finais dos tempos.

Gostei imensamente do seu texto e das informações transmitidas por ele.Grande abbraço: Liduina.

Liduina Belchior disse...

Nilo,
Eu de novo.Quanto aos rituais,esqueci de dizer o seguinte: cada região tem sua maneira CATÁRTICA de se despedir de seus entes queridos,de expressar seu luto.
De esgotar sua dor.
Pode ser dançando,bebendo,acendendo
fogueiras e tantas outras.Na minha opinião ,o importante é botar prá fora todo o amargor.
Bjos...

Nilo Sergio Monteiro disse...

Sim...Liduina conheço bem a fenomenologia. E a referência à pessoa da "morte social".
Os rituais também proporcionam um meio de expresar e aliviar emoções desagradáveis - isto é, têm um efeito catartico. Os rituais preenchem muitas funções tanto para o indivíduo quanto para a sociedade. E segundo as perspectivas de cada um nós podemos falar em: rituais psicoógicos, sociais e protetores não concorda?