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"Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
"

(Carlos Drummond de Andrade)

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terça-feira, 1 de setembro de 2009

O estouro do Açude de Orós, segundo José Almino (reminiscências)- Por: Maria Amélia Castro

O açude de Orós está localizado no município do mesmo nome no Estado do Ceará. Foi projetado e concluído pelo DNOCS (Departamento Nacional de Obras Contra a Seca), com a finalidade de irrigar a região.

A cidade de Orós fica a 133 Km do nosso Crato. Quando a obra do Açude estava ainda para ser completada, houve uma grande temporada de chuvas e, em consequência, o rio Jaguaribe encheu bastante, transbordando e provocando o arrombamento da parede da barragem, causou um desastre sem precedentes na região: pessoas ficaram desabrigadas, aconteceu o abandono de casas, roças, e rebanhos inteiros foram perdidos. Esse acidente marcou todo o Ceará, de um povo já sofrido com secas e pobreza.

O açude ficou pronto e foi inaugurado com muita festa, mas nos anos seguintes em todo inverno mais forte o medo tomava conta de todos.

Na época, o único veiculo de comunicação era o rádio. Instrumento "mágico", maravilhoso, na nossa casa ele merecia um lugar de destaque: ficava na sala de jantar , perto da tomada, sobre uma mesa coberta com uma toalha de crochê. Ouvíamos violas e violeiros na Rádio Educadora, ao final da tarde. Ouvíamos, ainda, a Rádio Araripe e até a BBC de Londres. Ouvíamos, embevidas, as novelas “O Direito de Nascer”e uma certa novela cubana. Lembro-me que Maria Helena engravidou sem casar, virou mãe solteira e o pai dela, revoltado, não aceitou o neto. Mamãe Dolores, então, fugiu com a criança. Era um grande espetáculo tudo aquilo, a ansiedade para que o outro dia chegasse logo para ouvirmos o desenrolar da trama.

Aldinha, a querida tia, tinha uma coleção de escritos, da novela "O direito de nascer". Mas ninguém podia ler, não era literatura para a nossa idade, mas no rádio podíamos ouvir. Vá entender essas coisas.

O nosso rádio equivale, hoje, a uma TV de plasma de 29 polegadas, era o sonho de consumo de muita gente.

Nesse dia, no Crato, chovia muito e a iminência do Açude de Orós quebrar novamente era grande. As chuvas de inverno estavam fortes no estado inteiro. Era só em que se falava. Zé Almino, meu querido irmão, muito astucioso, brincalhão (só quem conhece a peça sabe de quem estou falando), passou pela cozinha de nossa casa em Crato e falou alto, "o Açude de Orós está pra quebrar, liguem o rádio”. E assim foi feito. Telina, que trabalhava em casa, me pediu pra ligar logo o rádio. A chuva estava grossa e ininterrupta. Havia uma interferência grande no som do rádio, quase nada se podia ouvir. Zé Almino volta, informando que tal zoada era o "barulho do açude quebrando". Rezamos muito, Regina, a outra secretária, chorou com muita pena do povo. Veio vovó , entrou pela porta da cozinha e viu o choro desesperado. Perguntou o que era tudo aquilo e nós respondemos sobre a razão do nosso desespero. Quase que minha vozinha entra no clima também. Quando Zé Almino viu que vovó estava chegando, falou alto: "brincadeira delas, vó, elas estão achando que o chiado do radio é da água em Orós.

Maria Amélia Castro

5 comentários:

socorro moreira disse...

Muito Bom, Mélia !Estávamos mesmo precisando de lembranças leves.
Você falou na novela de rádio , e eu cheguei a ouvir a voz de Walter Foster ( que fazia o Albertinho). Lá em casa as leituras eram bastante censuradas. Eu ouvia a novelade rádio, escondido, na casa de Magali. Acho que ela se lembrará, por exemplo de "Ângela- a moreninha de Anzio". Inesquecível, como o foi "O direito de nascer". Tinha uma outra , cujos personagens chamavam-se Sônia e Vladimir. Ciganos, fascinantes !
Mas, então Zé Almino é desse jeito ? Confidenciou-nos Zé do Vale, que ele também gosta de escrever. Expedimos convite, e estamos aguardando o aceite. Mandamos-lhe o nosso abraço.
Já estou esperando o próximo texto. Esse foi demais!

Abraços.

Cesar Augusto disse...

Ms Amelia, agora vc me fez voltar no tempo, quando toda a familia, I mean TODA, se sentava em volta do radio para escutar o namoro do Alfredo com Maria Helena...rsss....olhando para adiante, acho que nada mudou, as familias continuam com as novelas, so que agora na televisao...

obrigado pela lembranca

Cesar Augusto

Claude Bloc disse...

Maria Amélia,

Que bom poder te ler. A página estava triste por causa dos acontecimentos, e mesmo sentidos/as a gente precisa tocar a vida e dar chance ao sorriso de nascer outra vez.

Obrigada pelo bom humor que trouxe. E vê se o José Almino tem mais o que mostrar, o que contar.

Obrigada e um abraço,

Claude

Nilo Sergio Monteiro disse...

Socorro, o Zé Almino é bom em muitas coisas. Aliásnesse pé de serra tá cheio de contadores de "estórias". Precisamos reunir todos nós (olha eu metido a besta!) num simpósio que podia se titulado: Contadores da Serra....o sei lá...
Mas Maria Amélia nos trouxe Zé Almino. Vou ligar pra ele.

Anônimo disse...

Maria Amélia,
Gostei demais do seu texto. José Almino deve alegrar a vida das pessoas com o seu humor.
Sim Socorro, lembro da novela "
Ângela, a moreninha de Anzio", não perdinha um capítulo. Lembra-se que o rádio lá de casa, ficava na sala e era muito grande?

Abraços