Por volta das dezessete horas o céu foi tomado por centenas de zepelins voando baixo. Vinham do pôr do sol rumando para leste. Envolvendo a paisagem das janelas, escondendo o Corcovado, os Dois Irmãos e todo maciço da tijuca.
Da propulsão central sopravam ventos em corredores de arrasto. Vergando ventarolas, derrubando baldes, rodopiando calendários. Um canto ultra natural por onde uma esquina houvesse em possibilidade de corda vocal.
Neste estágio de tensão, a eletricidade cessa imediatamente. É regra aqui no pedaço. De vez em quando uma ilha de obscuridade no meio da cidade. Herança mal resolvida das privatizações que prometiam e não cumpriam.
Quem sabe o ex-presidente da era das concessões não se sinta responsável. Talvez o problema seja apenas nosso mesmo. Mas tem um denominador comum: a Light. A flor do patrimonialismo nacional, desde as maracutaias canadenses, o Estado e o privado.
E voltei aos tempos rurais. Um macarrão por arranjo, entulhos das carnes já prontas, cebola, tomate, alho, ketchup e mostarda. Um prato para apenas um, literalmente, sem qualquer ironia, à luz de vela.
E fui para a janela olhar a noite. Quando os faróis dos carros formam jatos de luz por sobre o calçamento escondido.
De repente algum farol projeta luz num dos quartos. O Cristo Redentor brilha lá no alto da pedra da cor da falta de eletricidade.
Na falta do que fazer, fui para a janela observar o movimento da noite.Mas não retornei ao tempo em que o lampião era a regra. Na verdade estava grávido, esperando a luz para que tivesse esta tela, a televisão, o cinema, orquestra e a claridade das páginas do livro.
O que mais impressiona é o repente. Acostumados que fôramos ao acumular até que o novo acontecesse. E não existem estágios, etapas, um montante a parti do qual tudo acontece. Num piscar de olhos tudo retorna e tudo é.
Mas se um dia não houver mais repentes. A demora até desmilinguir-se em fatos e ocasiões será mínima. Tudo é muito crítico, muito potencial, basta que a eletricidade não retorne e os cabos de comunicação se rompam.
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Um comentário:
Estudei à parca luz
Vi o Corcovado de Copacabana
Comi gelado , e esquentei na cuzcuzeira, antes do microondas.
Congelei sonhos, e esperei o sol , descongelar um por um... Agora não falta nenhum ...
Ou falta ?
A falta está pra chegar, nos poemas, nas prosas poéticas, no amanhecer , quando o galo canta do quintal vizinho , e lebra-me que está na hora de fazer café.
Mas, se eu nem tomo café... ?
A festa está por aqui . A ciranda de Lia alcançou nosso espaço.
Graças a todos estamos felizes !
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