A universalidade mais evidente na individualidade humana é a luminosidade interna estimulada por um sorriso de recepção. Quando se toca a campainha do apartamento de Sofia, no outro lado da porta cantos de uma menina a menos de dois meses de completar dois anos. E, sabemos, a alegria nesta idade tem a energia de transformar o pragmatismo focal da ética dos fins.
Com o tempo, já de algum tempo, venho me tornando uma referência através do bolso da minha camisa. Sempre cheio de canetas, celular, óculos e eventuais crachás. A primeira coisa que ela faz é cascavilhar meu bolso, tirando cada objeto, abrindo óculos, riscando com a caneta.
Sofia ainda não fala português. Tem linguajar próprio e é muito falante. Enquanto vai pelas ruas sai nomeando as coisas uma a uma de forma que só a convivência contínua consegue traduzir. De qualquer modo como todo aprendiz de língua, gosta de repetir as palavras portuguesas que aprendeu: luz, lua, papai, mamãe, bobó, bobô, aúi (para Ruy), roiz (arroz) e káne (carne).
Perto do apartamento de Sofia tem uma pracinha muito simpática. Típico ambiente urbano. Com personalidade do Rio de Janeiro, personagens da boemia algo familiar e classe média, além do samba, chorinho e feirinhas de artesanatos nos finais de semana. Na pracinha uma área com brinquedos de crianças. Ali o primeiro ensaio de socialização da petizada.
Em dia de feirinha de artesanato, andava com Sofia ao colo e algumas mães: Sofia você por aqui? Sofia sem a Regina! A babá da Sofia trabalha de segunda a sexta feira. Eis que ela já tem um universo inicial de conhecidos. E já tem um território por reconhecimento. Quando nele ela corre para o escorregador. Quer o balanço. Entra no meio das crianças sem cerimônia. Sem medo de rejeição.
O traço mais marcante deste tempo de Sofia. A ausência da rejeição. A alegria com que se aproxima do balanço já ocupado por outra criança é a prova maior. Certo que a moderação adulta servirá para o limite entre o ímpeto pela alegria pura do balanço e o prazer de quem nele já se encontra. Se isso ocorrer com sabedoria, Sofia jamais perderá o ímpeto necessário à alegria da vida ao mesmo tempo em que entenderá o conteúdo da ocupação em ambiente humano e urbano.
Sofia tem um tempo só dela. Tem um espaço e nele os que ali já se encontravam antes dela. A solução desta contradição entre o próprio e o coletivo talvez seja o maior desafio dos vários sistemas de pedagogia – familiar, social, escolar etc. – pelo qual o ímpeto de Sofia navega. Parte desta contradição Sofia mesmo resolverá. Pelo modo como for tornando necessária a existência deste ímpeto apesar da pedagogia.
Sofia, como todos nós, se encontra no mundo como nos encontrávamos algum tempo passado. Se encontra para tornar o mundo ao mesmo tempo interno e externo a ela. Sofia, para a luminosidade interna de quem escreve, é parte do mundo.
Como é rico o mundo.
Com o tempo, já de algum tempo, venho me tornando uma referência através do bolso da minha camisa. Sempre cheio de canetas, celular, óculos e eventuais crachás. A primeira coisa que ela faz é cascavilhar meu bolso, tirando cada objeto, abrindo óculos, riscando com a caneta.
Sofia ainda não fala português. Tem linguajar próprio e é muito falante. Enquanto vai pelas ruas sai nomeando as coisas uma a uma de forma que só a convivência contínua consegue traduzir. De qualquer modo como todo aprendiz de língua, gosta de repetir as palavras portuguesas que aprendeu: luz, lua, papai, mamãe, bobó, bobô, aúi (para Ruy), roiz (arroz) e káne (carne).
Perto do apartamento de Sofia tem uma pracinha muito simpática. Típico ambiente urbano. Com personalidade do Rio de Janeiro, personagens da boemia algo familiar e classe média, além do samba, chorinho e feirinhas de artesanatos nos finais de semana. Na pracinha uma área com brinquedos de crianças. Ali o primeiro ensaio de socialização da petizada.
Em dia de feirinha de artesanato, andava com Sofia ao colo e algumas mães: Sofia você por aqui? Sofia sem a Regina! A babá da Sofia trabalha de segunda a sexta feira. Eis que ela já tem um universo inicial de conhecidos. E já tem um território por reconhecimento. Quando nele ela corre para o escorregador. Quer o balanço. Entra no meio das crianças sem cerimônia. Sem medo de rejeição.
O traço mais marcante deste tempo de Sofia. A ausência da rejeição. A alegria com que se aproxima do balanço já ocupado por outra criança é a prova maior. Certo que a moderação adulta servirá para o limite entre o ímpeto pela alegria pura do balanço e o prazer de quem nele já se encontra. Se isso ocorrer com sabedoria, Sofia jamais perderá o ímpeto necessário à alegria da vida ao mesmo tempo em que entenderá o conteúdo da ocupação em ambiente humano e urbano.
Sofia tem um tempo só dela. Tem um espaço e nele os que ali já se encontravam antes dela. A solução desta contradição entre o próprio e o coletivo talvez seja o maior desafio dos vários sistemas de pedagogia – familiar, social, escolar etc. – pelo qual o ímpeto de Sofia navega. Parte desta contradição Sofia mesmo resolverá. Pelo modo como for tornando necessária a existência deste ímpeto apesar da pedagogia.
Sofia, como todos nós, se encontra no mundo como nos encontrávamos algum tempo passado. Se encontra para tornar o mundo ao mesmo tempo interno e externo a ela. Sofia, para a luminosidade interna de quem escreve, é parte do mundo.
Como é rico o mundo.
Um comentário:
Que narração deliciosa do cotidiano de Sofia. Tão lindo linguajar ... do narrador, e da menina Sofia !
Eu tenho duas netas prontas.Bianca e Sofia, mas elas vivem longe de mim.Pego carona hoje, no teu orgulho e alegria.
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