Criadores & Criaturas



"Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
"

(Carlos Drummond de Andrade)

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Colaboração:Claude Bloc


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segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Folclore Político do Cariri- Joaquim Pinheiro




Organizando minha estante deparei-me com livros de Sebastião Nery sobre folclore político, comprados em meados dos anos 70, quando morava em Brasília. Reli alguns casos do sul do Ceará e transcrevo para vocês:

a) Alencar era prefeito de Barbalha. O governador, Coronel Felipe Moreira Lima, mandou chamá-lo:
- Seu Alencar, eu não vi sua defesa.
- Que defesa?
- Os jornais estão dizendo que o Sr. gastou dinheiro da prefeitura nas eleições.
- Ora, governador, as eleições deste ano foram caríssimas. Gastei até do meu.

b) Martins Rodrigues, interventor, soube que o prefeito de Assaré estava roubando a prefeitura. Pegou o carro e foi até lá:
- Prefeito, precisamos conversar.
- Está bem, Dr. Martins, mas deixe para amanhã. Desapeie do carro, jante, durma aqui e amanhã eu mostro tudo ao senhor.
- Não posso. Tem que ser hoje.
- Mas, Dr. Martins, hoje aqui tem um boi (bumba-meu-boi) que vai dançar.
- E o que eu tenho com isso?
- É que o boi sou eu.
Foi bovinamente demitido.

c) Coronel Floro Bartolomeu, braço direito do Padre Cícero, lá no Juazeiro, tinha um afilhado muito preguiçoso. Ele sempre dando conselhos.
Um dia, o filho de um vizinho achou um pacote de dinheiro às 5horas da manhã. Coronel chamou o afilhado: menino, você está vendo. O Zeca só achou o dinheiro porque saiu às cinco.
- É padrinho Floro, mas quem perdeu saiu às quatro.

d) Filemon Teles, o Tio Filé, era presidente da Assembléia Legislativa. Virgílio Távora, governador, viajou para a reunião deliberativa da SUDENE e lhe passou o governo. Virgílio viajou ao meio dia, a reunião era à tarde e à noite Virgílio voltava. Mesmo assim, Tio Filé assumiu e ficou feliz da vida como governador meio-expediente.
Á tarde, o jornalista Lustosa da Costa vai ao palácio. Encontra Tio Filé na cadeira de governador, na cabeceira da mesa, olhando para as paredes. Não tinha nada para fazer. Ficam conversando. De repente, Lustosa lembrou-se de que havia um processo para ser despachado naquela tarde. Era licença para o jornalista Rangel Cavalcante, funcionário do Estado, colega e amigo de Lustosa, viajar ao Rio de Janeiro, participar de um congresso.
Tio Filé ficou feliz, mandou buscar o processo, foi folheando, alisando, lambendo aquele único, exclusivo e providencial ato de governo. O tempo passando, Lustosa com pressa, e Tio Filé lendo, lendo, sem assinar. Lustosa olha para o relógio. Faltam 5 minutos para as 18 horas. Pede o processo, abre na última página: assine logo, homem, senão seu governo acaba.
Assinou, o governo acabou.

e) O Deputado Filemon Teles recebeu pedido de um amigo, também deputado, da Paraíba, para amparar um criminoso que fugira de lá e estava chegando ao Ceará. O Filé encaminhou o paraibano para o Coronel Amâncio, poderoso chefe político no Cariri.
Algum tempo depois Tio Filé encontrou o Coronel Amâncio:
- Como é compadre, resolveu o problema do rapaz da Paraíba?
- Sim, está tudo certo. Já está trabalhando e é um homem de confiança, foi uma boa aquisição.
- E os documentos dele? Como é que fez?
- Muito normal. Fiz um atestado de óbito dele no cartório do Crato e mandei a certidão para a Paraíba. Aí, aquele homem acabou. Depois, fiz um registro novo para ele, no mesmo cartório, com outro nome. Aí ele virou um homem novo.
- E a mulher?
- Que mulher?
- A mulher dele.
- Ora, compadre, a viúva casou com o novo.
E o sertão do Cariri ganhou mais um homem d confiança para serviços de responsabilidade.

f) Virgílio Távora, governador, recebeu telegrama do prefeito do Crato:
“Sr. Governador, solicito V. Exa. recursos enfrentar seca município. Cordiais saudações”.
Virgílio responde: Senhor Prefeito, aguarde, 19 de março, passagem Equinócio. Cordiais saudações”.
Dia 20de março, o prefeito telegrafou de novo:
“Senhor Governador, apesar banquete e homenagem preparamos receber condignamente enviado V. Exa, até agora o Dr. Equinócio não apareceu. Cordiais Saudações”.

Um comentário:

Glória Pinheiro disse...

Joaquim,

Houve uma época que eu era assídua leitora das tiradinhas políticas de Sebastião Neri no Jornal Folha de São Paulo.

Qual não foi minha surpresa quando fui à Fortaleza levando minha filha em sua primeira viagem com aproximadamente 8 meses de vida. Estando na primeira fila do avião, improvisaram um berço e diante de muita turbulência, vendo minha aflição e preocupação, lá vem Sebastião Neri me ajudar a segurar o berço. Fiquei surpresa e agradecida.

Quando retornei à São Paulo, comentei com um amigo nosso, este, baiano, ex-presidente do INPq e ex-assessor técnico do governo Mário Covas, pois bem, comentei que ele se parecia com Sebastião Neri (fisicamente quis dizer). Fiz a comparação e ele me disse:
- Glória, aquele lá é o maior fofoqueiro político!

Desde então deixei para lá o "fofoqueiro político". (risos)

Feliz 2010 extensivo a seus familiares.

Um abraço

Glória