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"Penetra surdamente no reino das palavras.
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Estão paralisados, mas não há desespero,
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"

(Carlos Drummond de Andrade)

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quinta-feira, 10 de junho de 2010

Futebol, TV, Patrocinador - Por: José Nilton Mariano Saraiva

Confeccionados em edições limitadas, virgens, intocados e inocentes, eram assim os uniformes dos nossos principais clubes de futebol, até bem pouco tempo. E tais predicados serviam para realçar a beleza, o esplendor e magia de cada um deles. Havia, até, certa timidez, certo receio, um excessivo respeito que nos impedia de maculá-lo, acessá-lo, tocá-lo sequer. O símbolo do clube - e só ele - soberano e galhardo, pontificava e realçava, à altura do peito, sobreposto às cores respectivas. A camisa de um Vasco da Gama, um São Paulo, um Fluminense ou um Palmeiras se nos apresentava sóbria, elegante, indevassável, imaculadamente soberana em sua pureza. Nada capaz de nodoá-las. Além do símbolo-emblema à frente, apenas a numeração às costas. Era, pois, motivo de orgulho pra todos nós, torcedores. Pode-se inferir que foi ali, via imaginário popular, que se materializou seu batismo como “manto sagrado”.
Mas, aí, adentrou no campo de futebol a televisão, trazendo, a reboque, um avassalador e temível rolo-compressor: os patrocinadores. Extremamente profissionais, poderosos, fortes, exigentes e cheios da grana, comendo pelas “beiradas” começaram o processo de demolição progressiva do romantismo imiscuído numa atividade até então praticamente amadora: assim é que, num primeiro momento, as bordas do campo de futebol, outrora vazias, solitárias, desprezadas e sem qualquer valor mercantil, repentinamente se viram povoadas ou “premiadas” com dezenas de placas, anúncios, propagandas diversas: estáticas, em formatos variáveis e multicoloridos, tais instrumentos anunciavam desde bebidas alcoólicas a peças íntimas femininas, do másculo aparelho de barbear ao suave desodorante direcionado à mulher. Tudo isso veiculado pela televisão, para milhões de telespectadores, tornou muita gente milionária (o Kleber Leite, à época repórter de campo da Rádio Globo e hoje poderoso empresário e dirigente do Flamengo, começou a “se fazer”, ficar milionário, via negociação das respectivas placas).
Estava dado o primeiro passo para a profissionalização definitiva das nossas principais equipes. E então, mais que rapidamente, o passo seguinte foi dado: “vapt-vupt”, sem que sequer nos déssemos conta, das bordas do campo o insaciável e esperto “patrocinador” resolveu pular adiante, alçar vôo rumo a um espaço mais visível, generoso, abrangente e em permanente exposição: e foi dessa forma, agindo sem quaisquer concessões ou escrúpulos, que os “mantos sagrados” das nossas principais agremiações foram fria e calculadamente desvirginados, violentados, estuprados. Inteligentemente, até, porquanto, a partir de então, os jogadores de futebol foram literalmente obrigados e passaram a funcionar como prosaicas “tabuletas- ambulantes”, a anunciar um produto qualquer. Não satisfeitos, os novos “donos do futebol” trataram de instruir e cataquetizar os próprios jogadores a trocarem as camisas entre si, ao final de cada pugna, ou mesmo a as arremessaram para a torcida, objetivando, evidentemente, difundir a “marca”, fazê-la circular, se tornar conhecida além do campo de jogo ou do próprio estádio.
E tem mais: se antes os nossos craques se notabilizavam pelo belo sentimento-amadorístico do “amor à camisa” (pela qual só faltavam se matar em campo), pela siderúrgica fidelidade ao clube de origem (a ponto de dificilmente se transferirem para um outro), chegando mesmo a serem confundidos com a própria instituição (o Pelé, no Santos, é um exemplo emblemático), pois bem, como se não bastasse isso, repentinamente o patrocínio se individualiza na figura do próprio craque, avança sobre o esportista, peita e corrompe o homem. E haja “direito de imagem pra cá, direito de imagem pra lá” que implica em usar um boné de uma determinada marca, uma chuteira de uma cor tal, uma prosaica “fitinha” (com a marca estampada) a prender o cabelo e por aí vai, em troca de montanhas de dinheiro (você já notou que certos jogadores, antes do início da partida, se agacham para amarrar as chuteiras, quando poderiam ter tomado tal providência no vestuário ??? pois é, saiba que trata-se de uma ação previamente ensaiada, na perspectiva da TV o está focalizando).
Resumo desse capitalismo selvagem ??? A TV transformou o futebol num rendoso, inesgotável e próspero negócio. Nem que para isso o torcedor seja dia-a-dia desrespeitado, ignorado, relegado a ser um mero objeto de consumo, simplório coadjuvante, sem nenhum poder de escolha; os jogos tanto podem começar ao meio-dia como avançar pela madrugada; o calendário vai de segunda a domingo e quem não achar correto, que se exploda).
Quanto ao nosso querido “manto sagrado”, foi pro beléleu, voou pro espaço, escafedeu-se, sumiu; é mais fácil encontrar uma agulha no palheiro que localizar, mesmo com uma possante lupa, o “símbolo” do clube em camisas repletas de propagandas às mais diversas e normalmente de um tremendo mau gosto. Até a seleção nacional se rendeu ao mercantilismo do patrocínio e a “amarelinha” já ostenta as tais “marcas”.
O torcedor não gosta do que está vendo ???
Que vá reclamar ao papa. E estamos conversados.
PT saudações: o patrocinador.

2 comentários:

Edilma disse...

Primo,

Parabéns pelo texto!
Como sempre muito bem escrito, cheio de compações corretas e até uma pitada de humor para nos prender na leitura.
As vezes passamos um tempo escrevendo algo com cuidado para ser postado no blog e ao dar uma espiada no dia seguinte não encontramos uma palavra sequer nos comentários...
Fica uma pontinha de decepção...
quando coisinhas até muito simples chegam a 5 ou 6 comentários...
Vá entender...
Por isso, vá se acostumando e continue escrevando para o seu próprio prazer...
Coisas do blog!

Abraço!

jose nilton mariano saraiva disse...

Edilma,
O ato de escrever (e ler) nos faz um bem danado; nos complementa. Somos viciados, desde a mais tenra idade.